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Direito Agrário

TRF4 valida ato do INCRA que retirou imóvel de família por prática de violência contra menor em assentamento

“O Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) confirmou, na última semana, a legalidade de ato do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) que retirou imóvel concedido pelo Programa Nacional de Reforma Agrária à uma família de Jacarezinho (PR) devido a um ato de violência contra uma criança, praticado pelo filho do casal. A decisão da 3ª Turma negou o recurso dos assentados, que queriam permanecer no local.

O casal alega ter feito, em maio de 2011, um contrato com o Incra, no qual obteve a concessão de uso de uma área de 20,939 hectares no assentamento de Companheiro Keno. Eles contam que não puderam ocupar o imóvel e que foram expulsos da comunidade.

Segundo o Incra, a família chegou a se instalar na área rural. Entretanto, em 4 de novembro de 2011, o filho adolescente , que supostamente sofre de uma deficiência cognitiva, teria abusado de uma criança de 4 anos que mora na comunidade. O Instituto tomou conhecimento e cancelou o contrato de arrendamento.

A família ajuizou ação contra o Incra, na 5ª Vara Federal de Curitiba, requerendo os direitos do imóvel rural, os benefícios do Programa, e pedindo indenização por danos morais e materiais. Os autores alegam que ainda vivem em acampamento de sem-terras, salientando que têm direito à área. A ação foi julgada improcedente e o casal recorreu ao TRF4.

Para o desembargador federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, relator do caso, ‘há indícios relevantes de que o filho dos autores envolveu-se em situação que causou revolta em toda a comunidade de assentados, o que tornou inviável a convivência da família no assentamento Companheiro Keno’.

Pereira frisou que o Incra é entidade pública dotada de poder de polícia, responsável pela execução da política fundiária e da reforma agrária, tendo o dever de zelar pela regularidade dos assentamentos e atender à função social do programa fundiário”.

Fonte: TRF4, 05/04/2016.


 

Confira a íntegra da decisão:

APELAÇÃO CÍVEL Nº 5080547-51.2014.4.04.7000/PR
RELATOR
:
Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA
APELANTE
:
LEOCADIA MULLER
:
WALTER SIEBERT
ADVOGADO
:
FABRÍCIO ROGÉRIO BECEGATO
APELADO
:
INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRÁRIA – INCRA
EMENTA
 
ADMINISTRATIVO. CONTRATO DE ASSENTAMENTO (CONCESSÃO DE USO). REFORMA AGRÁRIA. REGULARIDADE DO DISTRATO LEVADO A EFEITO PELO INCRA.
– Todo e qualquer assentado detém posse precária e condicionada às determinações da Lei 4.504/64 e dos decretos que a regulamentaram, bem como da Lei 8.629/93. Para o caso de violação das cláusulas previstas no Contrato de Assentamento Provisório, é efetuada a rescisão do mesmo, não possuindo o assentado qualquer direito de permanência no lote. Ao assinar o Termo de Contrato, o beneficiário obriga-se a cumprir as determinações nele contidas, ficando ciente de que se não as obedecer, estará sujeito à rescisão do pactuado.
– O INCRA é entidade pública dotada de poder de polícia, responsável pela execução da política fundiária e da reforma agrária, tendo o dever de zelar pela regularidade dos assentamentos e atender a função social do programa fundiário, tema de suma importância para toda a sociedade brasileira. No cumprimento de tão relevante missão, a autarquia deve fazer valer o interesse público, consagrado em atributos dos atos administrativos, tais como presunção de legitimidade e auto-executoriedade.
– Hipótese na qual há indícios relevantes de que o filho dos autores envolveu-se em situação que causou revolta em toda a comunidade de assentados, tornando inviável a convivência da família na comunidade do assentamento “Companheiro Keno”.
– Apelação improvida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 26 de abril de 2016.
Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA
Relator

 


Documento eletrônico assinado por Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8232867v8 e, se solicitado, do código CRC C00F7FB4.
Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): Ricardo Teixeira do Valle Pereira
Data e Hora: 27/04/2016 17:42

 

APELAÇÃO CÍVEL Nº 5080547-51.2014.4.04.7000/PR
RELATOR
:
Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA
APELANTE
:
LEOCADIA MULLER
:
WALTER SIEBERT
ADVOGADO
:
FABRÍCIO ROGÉRIO BECEGATO
APELADO
:
INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRÁRIA – INCRA
RELATÓRIO
WALTER SIEBERT e LEOCADIA MULLER ajuizaram ação ordinária contra o INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRÁRIA – INCRA em 01/12/2014, “direito ao acesso a área do imóvel e aos demais benefícios do Programa Nacional de Reforma Agrária” e indenização por danos morais, invocando ainda a teoria da perda da chance. Narraram que em 02 de maio de 2011, as partes firmaram contrato de concessão de uso pelo qual a ré cedeu aos autores área de 20,939 hectares no assentamento denominado “Companheiro Keno” pelo prazo de cinco anos. No entanto, relataram que até a data da petição inicial não foram assentados, pelo que não tiveram acesso à área do imóvel. Por fim, afirmam que ainda vivem em “acapamento sem terra”, mesmo havendo o direito de utilizarem a área em questão.
Sobreveio sentença em 10/02/2016, julgando improcedentes os pedidos. Condenou os autores ao pagamento de custas e honorários advocatícios, fixados em R$ 5.000,00, ressaltando, contudo, que os Autores são beneficiários da AJG.
Apelam os autores, requerendo o direito de acesso ao imóvel, mesmo que anterior ou posterior à assinatura do contrato de assentamento, e/ou ainda a indenização por danos morais, no quantum a ser arbitrado pelo Tribunal, sem prejuízo da indenização pela “perda de uma chance”.
Com as contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.
É o relatório.
Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA
Relator

 


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Data e Hora: 27/04/2016 17:42

 

APELAÇÃO CÍVEL Nº 5080547-51.2014.4.04.7000/PR
RELATOR
:
Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA
APELANTE
:
LEOCADIA MULLER
:
WALTER SIEBERT
ADVOGADO
:
FABRÍCIO ROGÉRIO BECEGATO
APELADO
:
INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRÁRIA – INCRA
VOTO
Sabe-se que todo e qualquer assentado detém posse precária e condicionada às determinações da Lei 4.504/64 e dos decretos que a regulamentaram, bem como da Lei 8.629/93. Para o caso de violação das cláusulas previstas no Contrato de Assentamento Provisório, é efetuada a rescisão do mesmo, não possuindo o assentado qualquer direito de permanência no lote. Ao assinar o Termo de Contrato, o beneficiário obriga-se a cumprir as determinações nele contidas, ficando ciente de que se não as obedecer, estará sujeito à rescisão do pactuado.
Examinados os autos e as alegações das partes, fico convencido do acerto da sentença de improcedência proferida pela Juíza Federal Giovanna Mayer, transcrevendo-a e utilizando-a como razão de decidir, nestes termos:
 
2. A lide é delimitada pelo pedido e pela causa de pedir trazidos no pedido inicial. No presente caso, a história narrada na exordial é  a seguinte: uma família foi beneficiária do contrato de concessão de uso de imóvel objeto de reforma agrária e não pôde adentrar o imóvel.
Os documentos trazidos com a contestação dão versão diferente da veiculada pela petição inicial: a família chegou a integrar o assentamento rural, fazendo uso da área que lhe foi destinada (ev. 12, out3, fl. 8). No entanto, em virtude da conduta de seu filho – menor de idade  – foram ‘expulsos’ da comunidade (ev. 12, out3, fl. 9).
Após a contestação, os autores afirmam não ter havido processo administrativo que tenha resguardado a ampla defesa e o contraditório antes de ter havido o cancelamento do contrato de concessão de uso (ev. 15).
Ora, percebe-se ter havido modificação na causa de pedir após a contestação, o que é vedado pelo art. 264 do Código de Processo Civil. Não se mencionou o processo administrativo na petição inicial, tampouco os problemas de convivência ocorridos na comunidade. Nota-se, ademais, que na impugnação (ev. 15), a parte autora limitou-se a afirmar ter havido ausência de processo administrativo, postulando que “os pedidos formulados na exordial devem ser julgado totalmente procedentes nos moldes formulados na exordial” (fl. 3).
Assim, não houve pedido para modificação da causa de pedir, pois os autores insistiram na higidez na petição inicial.
Apenas para que não paire nenhuma dúvida, a petição inicial traz o seguinte enredo: “Verifica-se que não só o Contrato de Concessão de Uso – CCU, mas também a própria legislação interna no Instituto ora Requerido, OBRIGA-O a cumprir o que foi firmado, porém, hoje, passados MAIS de 03 (três) anos da assinatura do referido Contrato de Concessão de Uso, os Requerentes não foram ainda assentados, ou seja, o Instituto ora Requerido não cumpriu sua obrigação contratual de ‘garantir o uso, o direito de acesso à área do imóvel e demais benefícios do programa’.” (ev1, inic1, fl. 2).
Portanto, nos termos do art. 264 do CPC, a lide possui a seguinte delimitação: os Autores  do contrato de concessão de uso de imóvel objeto de reforma agrária e não puderam adentrar o imóvel, razão pela qual fazem jus não apenas à obrigação de fazer, mas também aos danos morais e materiais.
3. Apesar de não haver documento que ateste que a família realmente ocupou a área objeto do contrato de concessão de uso, verifica-se que há “contrato de concessão de uso sob condição resolutiva”, firmado sob n. PR 03200000021, em 02/05/2011 (ev. 29, procadm, fl. 19), assinado pelos Autores e pelo Superintendente Regional do INCRA. 
Em 04 de novembro de 2011, menor sob a responsabilidade dos Autores teria entrado em uma mata perto do acampamento com outra criança de apenas 04 anos e ao sair da mata, estava “chorando, dizendo que estava machucado e sujo de sangue em sua cueca” (ev. 38, fl. 3).
Em 07 de novembro de 2011, foi lavrada ata da comunidade “Companheiro Keno” no qual há o relato do problema, bem como a concessão de prazo para que a família desocupe o local (ev. 29, fl. 22). Em 23 de novembro, o INCRA foi comunicado (ev. 29, fl. 33), o que ensejou o cancelamento do contrato de concessão de uso em 2012.
Conclui-se que a família assinou o contrato de concessão de uso e, diferente do que foi narrado na petição inicial, pôde utilizar a área que lhe foi concedida (do contrário, por óbvio, não teria havido a ‘expulsão’ do assentamento).
Por fim, há menção no PAD n. 54200.001259/2011-10 que o Sr. Walter Siebert teria desistido da área antes da assinatura do contrato de assentamento (fl. 36. ev. 29), o que causa estranheza, mas foge dos limites da lide.
Na petição inicial, não houve questionamento sobre o modo como foi efetuado o cancelamento do contrato de concessão, tampouco sobre a legitimidade da ‘expulsão’ ou da retidão da conduta do INCRA no processo administrativo, ou ainda qualquer discussão sobre a responsabilidade sob os atos de adolescente com suposta deficiência cognitiva e a repercussão desses atos sobre o acesso à terra. Limitou-se a petição inicial a dizer que o INCRA não executou o contrato de concessão de uso e que a família nunca pôde utilizar a área que lhe fora destinada, o que não é verdade.
Assim, tendo que vista que o INCRA comprovou que os Autores foram assentados e, portanto, houve a execução inicial do contrato, não há obrigação de fazer, tampouco danos morais ou materiais a serem discutidos nestes autos.
De fato, o INCRA é entidade pública dotada de poder de polícia, responsável pela execução da política fundiária e da reforma agrária, tendo o dever de zelar pela regularidade dos assentamentos e atender a função social do programa fundiário, tema de suma importância para toda a sociedade brasileira. No cumprimento de tão relevante missão, a autarquia deve fazer valer o interesse público, consagrado nos atributos dos atos administrativos, tais presunção de legitimidade e auto-executoriedade.
No caso dos autos, há indícios relevantes (inclusive objeto de apuração de ato infracional pela Polícia Civil do Paraná, conforme processo originário, evento 38) de que o filho dos autores envolveu-se em situação que causou revolta em toda a comunidade de assentados, tornando dificultosa a convivência de Walter, Leocádia e demais componentes da família na comunidade do assentamento “Companheiro Keno”. Assim, a retomada do imóvel pelos autores representaria significativo risco à estabilidade da ordem dentro do assentamento, devendo ser privilegiada as providências estabelecidadas pela autoridade pública representada no INCRA.
O que foi trazido nas razões do recurso não me parece suficiente para alterar o que foi decidido, mantendo-se o resultado do processo e não vendo motivos para reforma da sentença, inclusive com relação aos ônus sucumbenciais.
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação.
Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA
Relator

 


Documento eletrônico assinado por Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8232866v8 e, se solicitado, do código CRC E7C79AB9.
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Signatário (a): Ricardo Teixeira do Valle Pereira
Data e Hora: 27/04/2016 17:42

 

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