“A iniciativa do vereador Elias Vaz (PSB) visa proibir a comercialização de produtos resultantes de superalimentação animal como por exemplo, o foie gras.
A Câmara Municipal aprovou em segunda e última votação na sessão de hoje (13/04/2016), projeto do vereador Elias Vaz (PSB) que proíbe a comercialização de produtos derivados de processo de alimentação forçada de animais. A matéria segue agora para sanção ou veto do prefeito Paulo Garcia.
‘A proposta é impedir em Goiânia a produção ou venda de produtos a partir do uso de mecanismo automático ou manual de engorda que despeje o alimento diretamente no estômago do animal como funil, tubo metálico, de plástico e PVC.
O projeto estabelece uma série de penalidades aos estabelecimentos que descumprirem as determinações, como multa, apreensão, incineração da mercadoria e até o cancelamento da licença de funcionamento. O nosso objetivo é impedir a venda de produtos obtidos a partir de métodos cruéis. Não podemos aceitar a comercialização de alimentos oriundos de crime ambiental’, destaca Elias Vaz.
MULTAS
Os responsáveis pelos estabelecimentos que descumprirem a lei estarão sujeitos a multa de 5.000 (cinco mil) UVFG – Unidade de Valor Fiscal de Goiânia e interdição do local e o descumprimento da interdição acarretará multa diária, a partir da data da apuração do fato, no valor de 1.000 (Hum mil) UVFG.
O parlamentar exemplifica o caso com o prato baseado na alimentação forçada de animais, típico da culinária francesa, o ‘foie gras‘, o fígado gordo de ganso ou pato. ‘Para deixar o órgão maior e mais gorduroso, produtores impõem uma dolorosa alimentação forçada por canos que vão direto ao estômago das aves várias vezes ao dia.
O fígado dos animais, em alguns casos, chega a 10 vezes o tamanho normal e muitos deles sofrem lesões na garganta e esôfago causadas pelo tubo que leva a ração diretamente para o estômago. A superalimentação desenvolve a ‘Esteatose Hepática’, doença caracterizada pelo acúmulo de gordura nas células do fígado.
‘É um prato caro e elitizado e obtido a partir de muito sacrifício animal’, explica o vereador. ‘Em pleno século XXI, é inadmissível que tal prática seja tolerada. A nossa iniciativa não visa inetrvir no comércio da Cidade, mas sim, inibir esse cruel crime ambiental’, justifica Elias”.
Fonte: Câmara de Vereadores de Goiania, 13/04/2016 (Silvana Brito).
Clique aqui e veja a íntegra do projeto de lei aprovado.
Análise de DireitoAgrário.com:
Questões Jurídicas do Bem-Estar Animal e suas Implicações para o Direito Agrário
Por Cláudio Grande Júnior
Mestre em Direito Agrário pela Universidade Federal de Goiás (UFG). Procurador do Estado de Goiás.
A Câmara Municipal de Goiânia aprovou projeto de lei, ainda pendente de sanção do Prefeito, que proíbe a comercialização de produtos derivados de processos de alimentação forçada de animais (http://www.camaragyn.go.gov.
Alguns tentam alegar que não há sofrimento nem crueldade no método acima descrito, empregado para produção em maior escala de foie gras. Porém, imagine-se o leitor numa churrascaria, já completamente empanturrado com o rodízio, ser fisicamente coagido a comer mais e, algumas horas depois, ainda saciado, ser novamente constrangido a tanto e assim sucessivamente? Não há dúvida de que a prática configuraria o crime de constrangimento ilegal (Código Penal, art. 146) e, dependendo dos propósitos da conduta, até mesmo crime de tortura, tipificado na Lei Federal n.º 9.455, de 1997. Os sujeitos passivos desses crimes são seres humanos, porém tais condutas com animais também são criminosas, por força do art. 32 da Lei de Crimes Ambientais de 1998 (Lei Federal n.º 9.605), que, neste ponto, não se refere apenas a animais silvestres, mas também a domésticos ou domesticados. Isso decorre do dever imposto ao Poder Público pela Constituição Federal de vedar práticas que “submetam os animais a crueldade” (art. 225, § 1º, VII).
No entanto, o projeto de lei causou polêmica em Goiânia. Há a questão constitucional da competência legislativa dos municípios para legislar sobre o assunto, problema sofrido por uma anterior lei paulistana e que o legislador goianiense tentou contornar redigindo a proibição em outros termos, como de uma complementação normativa de ordem ambiental. Se for sancionada a lei, provavelmente algum legitimado ingressará com uma ação direta de inconstitucionalidade e o impasse só se resolverá no Judiciário. Por outra perspectiva, a polêmica é alimentada também pela alegação de irrelevância do tema para a população de Goiânia, onde a comercialização e consumo de foie grass são aparentemente ínfimos, de modo que a proibição se assemelharia a uma lei municipal vedando a prática de touradas ou a caça de baleias na Capital de Goiás. Obviamente o último exemplo comparativo materializaria uma inutilidade, dada a impossibilidade geográfica da conduta, e o primeiro exemplo algo desnecessário, pois o sistema jurídico brasileiro já está perfeitamente apto, com os diplomas normativos vigentes, à coibição de touradas em todo território nacional. O mesmo não se pode dizer da comercialização, em Goiânia, de foie gras, porque, mesmo que ínfima, ela existe e ainda não se concretizou no sistema jurídico pátrio nenhuma solução definitiva para a questão. Diga-se de passagem, a controvérsia em torno da produção e/ou consumo de foie gras é mundial. Vislumbrando um aparente vácuo legislativo, a Câmara Municipal de Goiânia resolveu proibir a comercialização de produtos decorrentes do tipo específico de conduta, acima descrita, que causa sofrimento aos animais.
Todavia, o inicialmente mencionado art. 32 da Lei de Crimes Ambientais proíbe “praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais”. Desse modo, pode-se indagar: estaria mesmo permitida no Brasil a produção de foie gras, mediante a alimentação forçada das aves? A resposta parece ser não e, consequentemente, a comercialização seria de um produto de crime ambiental. A conduta de “engordar aves mecanicamente” era até arrolada pelo art. 3º do Decreto n.º 24.645, de 1934, como uma das de maus tratos aos animais. Este era um importante diploma normativo sobre o assunto e que tem uma interessante história. Foi editado com força de lei, amparado pelo revolucionário Decreto n.º 19.398, de 1930, que, no contexto da Revolução em curso, atribuíra ao Governo Provisório de Getúlio Vargas o exercício discricionário de todas as funções dos Poderes Executivo e Legislativo, até que uma Assembleia Constituinte eleita reorganizasse constitucionalmente o país, o que só veio a acontecer em 1934 (GRANDE JÚNIOR, 2012, p. 82). Tendo força de lei, como os posteriores decretos-lei da Constituição de 1937, só poderia ser revogado, na vigência da Constituição Federal de 1988, por uma lei. Todavia, não foi o que aconteceu, uma vez que foi revogado, pelo menos formalmente, pelo Decreto n.º 11, de 1991. Desconhece-se, no entanto, resultados da discussão a respeito desse problema no Judiciário (VIANA, 2009). De qualquer modo, a crueldade com animais está atualmente proibida pela Constituição Federal e criminalmente tipificada pela Lei de Crimes Ambientais.
Só que, vingando tal interpretação sistemática do ordenamento jurídico brasileiro, ela terá repercussão muito além da produção de foie gras e de outros produtos derivados da alimentação forçada de animais, como o magret (peito de pato gordo). A produção de boa parte da grande oferta de carne de frango no Brasil pode ser posta juridicamente em xeque, tendo em vista o confinamento claustrofóbico, o estresse e a overdose de antibióticos a que estão submetidas as aves. Mesmo parte da pecuária bovina pode ser considerada ilegal, em razão de problemas como o do emprego de formas ineficientes de abate, que causam sofrimento prolongado, e o dos casos em que o gado vive em meio às próprias fezes, por má execução de técnicas de criação intensiva. Estes são apenas alguns exemplos, dentre vários outros conhecidos, de maus tratos a animais na execução de atividades agrárias. Obviamente, eles devem ser coibidos na mesma proporção em que se procura impedir a alimentação forçada de aves para a produção foie gras. Desse modo, inevitavelmente o bem-estar animal se insere como um dos tópicos do direito agrário, que, em contato com o direito ambiental e sanitário, deve normatizar a segurança, saúde e conforto dos animais utilizados no exercício de atividades agrárias. Esta vertente do direito agrário tende a ganhar cada vez mais importância, à medida que deixa de ser utopia e se concretiza graças à conscientização e cobrança da sociedade.
Referências Bibliográficas
GRANDE JÚNIOR, Cláudio. Usucapião quarentenária sobre terras do Estado: fundamentos jurídicos, atualidade e repercussão na questão agrária brasileira. Dissertação de Mestrado. Goiânia: Universidade Federal de Goiás, 2012. Disponível em: <http://mestrado.direito.ufg.
VIANA, Jones Tadeu. Repristinação, Revogação e o Decreto nº 24.645/34. JurisWay. Belo Horizonte, 2009. Disponível em: <http://www.jurisway.org.br/
* NOTA DE ATUALIZAÇÃO
O respectivo projeto foi sancionado pelo Prefeito de Goiânia, dando origem à Lei Municipal nº 9.818, de 13 de maio de 2016, a qual foi publicada no Diário Oficial do Município – Eletrônico edição nº 6325, de 16 de maio de 2016, pp. 9-10.
Abaixo, transcrevemos a íntegra da referida lei:
LEI Nº 9.818, DE 13 DE MAIO DE 2016
Proíbe a produção de produtos alimentícios que derivem do processo de alimentação forçada de animais.
A CÂMARA MUNICIPAL DE GOIÂNIA, Estado de Goiás, aprova e eu, PREFEITO MUNICIPAL, sanciono a seguinte Lei:
Art. 1º Fica proibida, no Município de Goiânia, a produção de todo e qualquer produto alimentício que derive do método de alimentação forçada de animais.
§1º A proibição que trata o caput deste artigo, refere-se à engorda forçada mecanicamente a partir da utilização de:
I – Uso automático ou manual de engorda que despeje o alimento diretamente no estômago do animal;
II – Uso de petrechos como funil, tubo metálico, tubo de plástico, tubo de PVC e outros;
III – Método que consista em forçar a superalimentação, ou fornecimento de alimento acima de limite de satisfação natural do animal.
Art. 2º Fica proibida, também, a comercialização de produtos que derivem total ou parcialmente da prática descrita no artigo anterior.
§1º Para aplicação da proibição descrita no caput, não importa o local onde produto foi produzido, basta o emprego da prática descrita no artigo 1º.
§2º A proibição engloba todos os estabelecimentos da Capital.
Art. 3º Os responsáveis pelos estabelecimentos que descumprirem a presente Lei estarão sujeitos as seguintes penalidades cumulativamente, sem prejuízo da aplicação da Lei Federal n° 9.605/98 por parte do órgão ambiental local:
I – Cancelamento da licença, se houver, e imediata interdição do local que comercializa ou possuir em estoque;
II – Multa de 5.000 (cinco mil) UVFG – Unidade de Valor Fiscal de Goiânia;
III – Apreensão e incineração da mercadoria.
Art. 4º Havendo descumprimento da interdição, será cobrada multa diária, a partir da data da apuração do fato, no valor de 1.000 (um mil) UVFG.
Art. 5º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
GABINETE DO PREFEITO DE GOIÂNIA, aos 13 dias do mês de maio de 2016.
PAULO GARCIA
Prefeito de Goiânia
Osmar de Lima Magalhães
Veja também:
– Vereadores aprovam projeto que proíbe foie gras em Goiânia (Jornal Opção, or Marcelo Gouveia, Edição 2119)
– Câmara aprova Lei que proíbe venda de foie gras em Goiânia (Jornal O Popular, 13/04/2016)
– Lei que proíbe foie gras em São Paulo é publicada no Diário Oficial (G1 São Paulo. 26/06/2015)
– Justiça suspende lei que proíbe venda de foie gras em São Paulo (G1 São Paulo, 14/07/2015)
Abaixo, disponibilizamos vídeos extraídos do Youtube, que demonstram a produção do foie gras com utilização da questionada prática cruel, que ofende o bem-estar animal:
A questão no Município de São Paulo – Conheça o texto da Lei nº 16.222/2015:
LEI Nº 16.222, DE 25 DE JUNHO DE 2015
(Projeto de Lei nº 537/13, do Vereador Laércio Benko – PHS)
Proíbe a produção e a comercialização de foie gras e artigos de vestuário feitos com pele animal no âmbito da Cidade de São Paulo, e dá outras providências.
FERNANDO HADDAD, Prefeito do Município de São Paulo, no uso das atribuições que lhe são conferidas por lei, faz saber que a Câmara Municipal, em sessão de 21 de maio de 2015, decretou e eu promulgo a seguinte lei:
Art. 1º Esta lei dispõe sobre a proteção dos animais no âmbito do Município de São Paulo.
Art. 2º Fica proibida a produção e comercialização de foie gras, in natura ou enlatado, nos estabelecimentos comerciais situados no âmbito do Município de São Paulo.
Art. 3º Fica proibida a comercialização de artigos de vestuário, ainda que importados, confeccionados com couro animal criados exclusivamente para a extração e utilização de pele, no âmbito do Município de São Paulo.
Parágrafo único. Não serão alcançados pelo disposto nesta lei os produtos confeccionados com peles oriundos da produção pecuária em geral.
Art. 4º A infração ao disposto nesta lei acarretará multa no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) e será aplicada em dobro em caso de reincidência, sem prejuízo da apreensão do produto. Parágrafo único. O valor da multa de que trata o “caput” deste artigo será atualizado anualmente pela variação do Índice de Preços ao Consumidor Amplo – IPCA, apurado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, acumulada no exercício anterior, sendo que no caso de extinção desse índice será adotado outro, criado por lei federal, que reflita e recomponha o poder aquisitivo da moeda.
Art. 5º O Poder Executivo regulamentará a presente lei, no que couber, no prazo máximo de 90 (noventa) dias, contados da data de sua publicação.
Art. 6º As despesas decorrentes da execução desta lei correrão por conta das dotações orçamentárias próprias, suplementadas, se necessário.
Art. 7º (VETADO)
PREFEITURA DO MUNICÍPIO DE SÃO PAULO, aos 25 de junho de 2015, 462º da fundação de São Paulo.
FERNANDO HADDAD, PREFEITO
FRANCISCO MACENA DA SILVA, Secretário do Governo Municipal P
ublicada na Secretaria do Governo Municipal, em 25 de junho de 2015.