“A 21ª Câmara Cível do TJRS condenou o proprietário de uma área onde foi construída uma rampa de acesso ao Rio Uruguai. A obra foi realizada em área de preservação permanente para que o gado pudesse ter acesso ao rio, sem as licenças ambientais necessárias.
Caso
O Ministério Público, a partir de relatório de ocorrência do 3º Batalhão Ambiental da Brigada Militar, instaurou inquérito civil em razão da existência de um porto, em área de preservação permanente, em direção ao leito do Rio Uruguai, na Comarca de Três Passos. Segundo a BM, houve destruição da vegetação nativa de pequeno porte típica do local, sem licença do órgão ambiental competente.
O denunciado afirmou que a construção existe há 40 anos e tinha por finalidade proporcionar o acesso do gado ao leito do rio e que inexiste o dano ambiental apontado. Disse que a construção da rampa de lançamento de barcos e pequeno ancoradouro se tratam de atividades eventuais e de baixo impacto ambiental, sem qualquer necessidade de prévia autorização do poder público.
Sentença
No Juízo do 1º grau, o proprietário da área foi condenado a atender uma série de exigências, entre elas, a regularização da situação com apresentação das licenças ambientais necessárias, projeto de reposição florestal, entre outros, e pagamento de multa no valor de R$5 mil em favor do Fundo Municipal do Meio Ambiente, a título de indenização dos danos difusos. Ele recorreu da sentença ao TJRS.
Recurso
No TJ, o relator do processo foi o Desembargador Marco Aurélio Heinz, que afirmou que o Código Florestal permite a intervenção ou supressão de vegetação nativa em área de preservação permanente nos casos de baixo impacto ambiental, previstos na lei. Também admite o acesso de pessoas e animais às áreas de preservação permanente para a obtenção de água e para a realização de atividade de baixo impacto ambiental.
No caso em questão, afirma o magistrado, o autor construiu uma rampa de lançamento de embarcações em área de preservação permanente, com 40 metros de comprimento e dois de largura, com destruição de vegetação nativa, não podendo se considerar a obra de baixo impacto ambiental.
‘Evidente, portanto, que mesmo sendo necessária tal rampa para permitir o acesso de gado ao Rio Uruguai, é indispensável licença da autoridade de proteção ambiental, como previsto na legislação de regência, sendo também pertinente a implantação de projeto aprovado pela mesma autoridade, visando recuperar eventual degradação em área de preservação permanente (margem de rio), devendo o proprietário do imóvel se abster de intervenções no local, sem licença da autoridade, como determinado na respeitável sentença recorrida’, afirmou o relator.
Com relação à multa aplicada pela sentença, o Desembargador Heinz afirmou que se mostra desproporcional, já que o réu cumpriu determinações estabelecidas em liminar, não havendo intenção de degradar a área de preservação permanente, mas permitir acesso ao rio de animais, porém, em proporções não consideradas de baixo impacto ambiental.
Assim, o apelo do réu foi provido apenas com relação à aplicação da multa, restando confirmadas as demais exigências determinadas na sentença.
Também participaram do julgamento e acompanharam o voto do relator os Desembargadores Arminio José Abreu Lima da Rosa e Iris Helena Medeiros Nogueira”.
Fonte: TJRS.
Confira a íntegra da decisão:
Apelação Cível
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Vigésima Primeira Câmara Cível |
Nº 70076658285 (Nº CNJ: 0031040-63.2018.8.21.7000)
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Comarca de Três Passos |
ANDRE LUIZ SCHIER LICHKE
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APELANTE |
MINISTERIO PUBLICO
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APELADO |
RELATÓRIO
Des. Marco Aurélio Heinz (RELATOR)
ANDRÉ LUIZ SCHIER LICHKI apela da sentença de procedência da ação civil pública movida pelo MINISTÉRIO PÚBLICO.
Em apertada síntese, alega que a supressão de vegetação já foi realizada há várias décadas, sendo o único acesso entre a propriedade do apelante e o Rio Uruguai, dando passagem para o gado beber água, conforme a prova testemunhal recolhida na instrução.
Sustenta, ainda, que, tratando-se de atividade de baixo impacto, é permitido o acesso de pessoas e animais às áreas de preservação permanente para obtenção de água e para a realização de atividades, de conformidade com o Novo Código Florestal.
Requer, assim, a reforma da sentença.
O apelado apresenta resposta, batendo-se pela correção do julgado, uma vez que a prova dos autos revela o dano ambiental pela ocupação, sem licença da autoridade, em área de preservação permanente, no entorno do Rio Uruguai, conforme previsão na Resolução Conama n. 369, de 28 de março de 2006.
O Ministério Público, nesta instância, manifesta-se no sentido do desprovimento do recurso, forte na prova dos autos.
É o relatório.
VOTOS
Des. Marco Aurélio Heinz (RELATOR)
Prospera, em parte, a pretensão.
O meio ambiente ecologicamente equilibrado é direito de todos, protegido pela própria Constituição Federal, cujo art. 225 o considera bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida.
O parágrafo 3º do referido artigo trata da responsabilidade penal, administrativa e civil dos causadores de dano ao meio ambiente, independente da obrigação de reparar os danos causados. Por sua vez, o art. 14 da Lei Federal n. 6.938/81 prevê as penalidades a serem aplicadas, sem prejuízo daquelas previstas na legislação estadual e municipal.
“A ratio do dispositivo está em que a ofensa ao meio ambiente pode ser bifronte atingindo as diversas unidades da federação. O poluidor (responsável direto ou indireto), por seu turno, com base na mesma legislação, sem obstar a aplicação das penalidades administrativas é obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade.” (REsp 467.212-0 – RJ, Rel. Min. Luiz Fux, 1ª Turma).
A responsabilidade pelo dano ambiental é objetiva, bastando, para a apuração do ilícito, a prova do fato e o nexo de causalidade entre este e o autor.
No caso dos autos, a Comunicação de Ocorrência realizada pela Brigada Militar na propriedade do apelante constatou: “a construção de um porto, medindo 40 m de comprimento por 2 m de largura em direção do leito do Rio Uruguai, tendo sido destruída vegetação nativa de pequeno porte típicas do local, sem licença do órgão ambiental” (fl. 11).
O Parecer emitido pela Unidade de Assessoramento do Ministério Público confirma a existência do denominado porto, consistindo numa ‘rampa de lançamento de embarcações’ na margem do Rio Uruguai, nas dimensões descritas na ocorrência antes referida (fls. 37/38).
Declarações de seis pessoas, moradoras na vizinhança do local onde ocorreu o dano ambiental, dão conta que a tal rampa ou caminho que liga a propriedade do réu ao Rio Uruguai foi construída há muito tempo e tem como finalidade permitir o acesso humano às margens do rio, bem como serve de caminho para os animais matarem a sede.
O Código Florestal (Lei n. 12.651/12) no seu art. 3º, inciso X, descreve como atividades de baixo impacto, a abertura de pequenas vias de acesso interno e suas pontes e pontilhões, quando necessárias à travessia de um curso d’água, ao acesso de pessoas e animais para a obtenção de água… (letra ‘a’; construção de rampa de lançamento de barcos e pequeno ancoradouro (letra ‘d’)).
Por sua vez, o art. 8º do Código Florestal permite a intervenção ou supressão de vegetação nativa em área de preservação permanente, nos casos de baixo impacto ambiental, previstos na lei.
A final, o art. 9º do Código Florestal permite o acesso de pessoas e animais às áreas de preservação permanente para obtenção de água e para a realização de atividade de baixo impacto ambiental.
Nesse contexto, tem-se que a construção de uma rampa de lançamento de embarcações em área de preservação permanente, com 40 metros de comprimento, com 2 metros de largura no interior daquela área, com destruição de vegetação nativa, não pode ser considerada de baixo impacto ambiental.
Evidente, portanto, que mesmo sendo necessária tal rampa para permitir o acesso de gado ao Rio Uruguai, é indispensável licença da autoridade de proteção ambiental, como previsto na legislação de regência, sendo também pertinente a implantação de projeto aprovado pela mesma autoridade, visando recuperar eventual degradação em área de preservação permanente (margem de rio), devendo o proprietário do imóvel se abster de intervenções no local, sem licença da autoridade, como determinado na respeitável sentença recorrida.
Entretanto, relativamente à multa imposta, tenho que a penalização se mostra desproporcional e desarrazoada, já que o réu cumpriu integralmente a liminar concedida (documentos de fls. 112/114), não havendo intenção de degradar área de preservação permanente, mas permitir acesso ao rio de animais, porém, em proporções não consideradas de baixo impacto ambiental.
Sendo assim, dou parcial provimento ao apelo para excluir da condenação apenas a imputação de multa.
Des.ª Iris Helena Medeiros Nogueira – De acordo com o(a) Relator(a).
Des. Arminio José Abreu Lima da Rosa (PRESIDENTE) – De acordo com o(a) Relator(a).
DES. ARMINIO JOSÉ ABREU LIMA DA ROSA – Presidente – Apelação Cível nº 70076658285, Comarca de Três Passos: “À UNANIMIDADE, DERAM PARCIAL PROVIMENTO AO APELO.”
Julgador(a) de 1º Grau: VIVIAN FELICIANO
EMENTA
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PROTEÇÃO AO MEIO AMBIENTE. CONSTRUÇÃO DE PORTO OU VIA DE ACESSO AO RIO URUGUAI.
A responsabilidade pelo dano ambiental é objetiva, bastando, para a apuração do ilícito, a prova do fato e o nexo de causalidade entre este e o autor.
O Código Florestal (Lei n. 12.651/2012), no seu art. 3º, inciso X, descreve como atividades de baixo impacto, a abertura de pequenas vias de acesso interno e suas pontes e pontilhões, quando necessárias à travessia de um curso d’água, ao acesso de pessoas e animais para a obtenção de água… (letra ‘a’; construção de rampa de lançamento de barcos e pequeno ancoradouro (letra ‘d’).
O Código Florestal permite a intervenção ou supressão de vegetação nativa em área de preservação permanente nos casos de baixo impacto ambiental, previstos na lei, bem como, admite o acesso de pessoas e animais às áreas de preservação permanente para obtenção de água e para a realização de atividade de baixo impacto ambiental (artigos 8º e 9º).
Nesse contexto, tem-se que a construção de uma ‘rampa de lançamento de embarcações’ em área de preservação permanente, com 40 metros de comprimento, com 2 metros de largura no interior daquela área, com destruição de vegetação nativa, não pode ser considerada de baixo impacto ambiental.
Evidente, portanto, que mesmo sendo necessária tal rampa para permitir o acesso de gado ao Rio Uruguai, é indispensável licença da autoridade de proteção ambiental, como previsto na legislação de regência, sendo também pertinente a implantação de projeto aprovado pela mesma autoridade, visando recuperar eventual degradação em área de preservação permanente (margem de rio), devendo o proprietário do imóvel se abster de intervenções no local, sem licença da autoridade, como determinado na respeitável sentença recorrida.
Multa que se mostra desproporcional, considerando a conduta do proprietário da área, que prontamente atendeu determinação judicial, visando à proteção da área de preservação permanente.
Apelação provida parcialmente.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos.
Acordam os Desembargadores integrantes da Vigésima Primeira Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em dar parcial provimento ao apelo.
Custas na forma da lei.
Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores Des. Arminio José Abreu Lima da Rosa (Presidente), Des. Arminio José Abreu Lima da Rosa (Presidente), Des.ª Iris Helena Medeiros Nogueira e Des.ª Iris Helena Medeiros Nogueira.
Porto Alegre, 18 de abril de 2018.
DES. MARCO AURÉLIO HEINZ,
Relator.