por Cláudio Grande Júnior.
Qualquer pessoa que conheça um pouco sobre Goiás não tem dúvidas da enorme importância do setor agrário para o Estado e, consequentemente, da necessidade de se avançar cada vez mais com os estudos em direito agrário.
Isso é objetivamente perceptível nos dados definitivos de 2013, nos quais o Estado de Goiás consta como o maior produtor nacional de tomate e sorgo; o 2º de melancia; 3º de bovinos, girassol, cana-de-açúcar, algodão, feijão e milho; 4º de leite e soja; 5º de suínos; 6º de aves, trigo e batata inglesa; 7º de ovos; 8º de arroz; e 10º de amendoim.[1] O impacto na balança comercial é inegável, com saldos positivos anuais superiores a dois bilhões de dólares, entre 2012 e 2014,[2] graças principalmente às exportações dos complexos de soja e de carne, que, juntos, representaram mais da metade das exportações goianas.[3]
Interessante que, superficialmente, os números do Produto Interno Bruto (PIB) goiano não traduzem o sentimento geral da importância do setor agrário para Goiás. Os dados do PIB de Goiás mostram, à primeira vista, um setor agrário menor do que ele realmente é. Entre 2010 e 2013, a representação do setor agropecuário no PIB de Goiás oscilou de 11,1% a 12,3%, enquanto a indústria teve participação de 28,3% a 25,8% e o setor de serviços de 60,5% a 61,8%.[4] Os percentuais apontados quanto ao setor agropecuário abrangem atividades florestais e pesqueiras, de apoio à agricultura e à pecuária e de pós-colheita, esta no que se refere à armazenagem e conservação.[5] Só que, na verdade, o setor agrário é maior do que isso, porque compreende também outras atividades nas quais ela se mescla com os setores industrial e/ou de serviços, mas mantendo sua preponderância, como em parte da agroindústria, que é uma área já grande e consolidada, bem como em outras ainda incipientes, mas em franca expansão, como o turismo agrário. E, mesmo quando não mantem sua preponderância, as atividades agrárias continuam importantes, porque abastecem boa parte das atividades industriais e de serviços de Goiás, destacando-se as indústrias extrativas e de transformação e os serviços de alimentação. Na mão oposta, boa parte dos serviços de transporte, armazenagem, intermediação financeira e de seguros são voltados para o setor agrário.
Evidentemente que as relações entre as pessoas aí envolvidas são reguladas pelo direito. Contudo, os ramos civil e empresarial do direito não conseguem disciplinar satisfatoriamente as dinâmicas questões ligadas às atividades agrárias. Nem o direito econômico, porque as atividades agrárias guardam particularidades, principalmente em razão de dependerem de ciclos biológicos e se sujeitarem a riscos climáticos. Ademais, a normatização das atividades agrárias compreende também questões muito peculiares sobre problemas sociais ligados à (in)acessibilidade à terra e devido aproveitamento desta, bem como sobre o sistema agroalimentar, abrangendo a segurança alimentar e a soberania alimentar, inclusive no que tange à proteção, principalmente em face do mercado, de valores humanos, culturais, históricos, arqueológicos, paisagísticos e ambientais. Sendo assim, são nas pesquisas em direito agrário que se formulam as soluções jurídicas mais apropriadas para questões como as de: (i) destinação de terras públicas e devolutas e de proteção dos direitos de índios e quilombolas sobre terras que estes tradicionalmente ocupam; (ii) eventual necessidade de reformulação da estrutura fundiária, com a redistribuição de terras que não cumprem sua função social; e (iii) desenvolvimento agrário, abrangendo o social e econômico, de todos os agroprodutores, sejam camponeses, familiares, pessoas jurídicas empresárias, pequenos, médios ou grandes, sem sacrifício do bem estar dos trabalhadores rurais e sem destruição ambiental, pois procurando sempre a redução das desigualdades regionais e sociais e a sustentabilidade das atividades agrárias.
Os conflitos que dizem respeito ao direito agrário têm sempre algum impacto, maior ou menor, sobre toda a população, porém esta não se dá conta perfeitamente disso, porque a grande maioria das pessoas não figura formalmente como parte em processos judiciais sobre litígios agrários, ao contrário do que acontece normalmente no direito civil e no direito do consumidor, por exemplo. Consequentemente, muitos profissionais e estudiosos da área jurídica desdenham o estudo e pesquisa do direito agrário. Mas, como lembra o Prof. Darcy Walmor Zibetti, estudar direito agrário no Brasil é preciso[6] e, conforme demonstrado acima, em Goiás é inevitável.
—–
Notas:
[1] INSTITUTO MAURO BORGES. PIB Goiás 2010-2013, p. 24. Disponível em:
<http://www.imb.go.gov.br/pub/pib/pib2013/pibgo2013.pdf>. Acesso em: 21 mai. 2016.
[2] http://www.imb.go.gov.br/pub/Godados/2014/6.8_tabela01.htm
[3] http://www.imb.go.gov.br/pub/Godados/2014/6.8_tabela04.htm
[4] INSTITUTO MAURO BORGES. PIB Goiás 2010-2013, p. 19. Disponível em:
<http://www.imb.go.gov.br/pub/pib/pib2013/pibgo2013.pdf>. Acesso em: 21 mai. 2016.
[5] Idem, p. 20.
[6] No Brasil: estudar direito agrário é preciso. UBAU, 2015. Disponível em: <http://www.ubau.org.br/site/no-brasil-estudar-direito-agrario-e-preciso/>. Acesso em: 21 mai. 2016.
Série “Brasil dos Agraristas”:
– ROMARIZ, Cristiano. Rondônia no cenário nacional do agronegócio e o estudo do Direito Agrário. Portal DireitoAgrário.com, 06 mai. 2017.
– HUMBERT, Georges. A Bahia agrária e a importância do estudo do Direito Agrário. Portal DireitoAgrário.com, 10 jan. 2017.
– PUTTINI MENDES, Pedro. A importância do agronegócio e do estudo do Direito Agrário para o Estado do Mato Grosso do Sul. Portal DireitoAgrário.com, 09 nov. 2016.
– GRANDE JÚNIOR, Cláudio. A importância do setor agrário e do estudo do Direito Agrário em Goiás. Portal DireitoAgrário.com, 08 nov. 2016.
– DUARTE, Cássio Carneiro. O setor agrário no Estado do Pará e sua relação com o Direito Agrário. Portal DireitoAgrário.com, 07 nov. 2016.
Veja também:
– Uso de tecnologias é o principal fator de geração de riqueza no meio rural (Portal DireitoAgrário.com, 22/11/2016)
– Estudo indica que a concentração de renda também ocorre com pequenas fazendas (Portal DireitoAgrário.com, 22/11/2016)
– ZIBETTI, Darcy Walmor; QUERUBINI, Albenir. O Direito Agrário brasileiro e sua relação com o agronegócio. In: Direito e Democracia – Revista de Divulgação Científica e Cultural do Isulpar. Vol. 1 – n. 1, jun./2016, disponível em: <http://www.isulpar.edu.br/