quinta-feira , 25 abril 2024
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Direito Agrário

Análise Jurídica da Modificação na legislação da Aviação Agrícola

por Luana Santos Lopes.

 

O Ministério da Agricultura e Pecuária (MAPA), responsável pela regulação da aviação agrícola, por intermédio da Secretaria de Defesa Agropecuária divulgou em 24 de março de 2023 a Portaria SDA nº 766 (publicada na Edição 58 do D.O.U, Seção 1, Página 13), que designou a abertura do prazo para consulta pública sobre a proposta de alteração da legislação preambular daquela atividade: o Decreto nº 86.765/1981, regulamentador do Decreto-lei nº 917, de 07 de outubro de 1969, com a finalidade de ampla divulgação, para que a sociedade, parceiros institucionais e entidades interessadas participem efetivamente do processo de produção normativa, atribuindo-o transparência, envolvimento e controle social.

A alteração de uma norma jurídica surge da necessidade de substituir, acrescentar ou suprimir dispositivos, desde que haja uma justificativa consistente para a sua proposição.

No caso, o lapso temporal entre a criação e vigência do Decreto 86.765/1981, mais de 41 anos, é um indicativo relevante para a sua revisão, seja para acompanhar as diversas inovações tecnológicas implementadas contemporaneamente, ou para adequação às atualizações da legislação ambiental do país.

Os serviços aeroagrícolas se tornaram essenciais ao agronegócio brasileiro, pois fomentam o desenvolvimento da agricultura e alavancam os rendimentos do setor produtivo pela sua eficiência em larga escala, abarcando as atividades de semeadura, aplicação de fertilizantes, aplicação de defensivos para proteção das lavouras, povoamento de rios e lagos com peixes e combate a incêndios florestais (regulamentação incluída pela Lei nº 14.406/2022).

De um ponto de vista prático, a aviação agrícola atravessou céus de transições, haja vista que foi iniciada no Brasil há mais de 70 anos. Dados anunciados pelo MAPA dão conta de que o país possui atualmente cerca de 2,4 mil aeronaves tripuladas, dessa espécie, atingindo o posto de 2ª maior frota do mundo, ficando atrás somente dos Estados Unidos, com cerca de 3,5 mil.

Além disso, pelo advento de equipamentos portadores de inteligência artificial de última geração, o que se resumia a aeronaves tripuladas passou a englobar drones (aeronaves pilotadas remotamente).

A produção e demanda de aeronaves nessa seara é crescente, assim como os desafios enfrentados pelos seus proprietários e prestadores de serviço, especialmente no que tange ao rigor no cumprimento das normas técnicas e de segurança e à conformidade com as diretrizes ambientais nacionais.

outro prisma, analisando os aspectos jurídicos da proposta de alteração apresentada, extrai-se a interpretação de que houve alteração de nomenclaturas (ex. art. 2º: de “defensivo” para “agrotóxico” – o que, de certa forma, pode soar mal), além de deixar margem para futuramente disciplinar novas normas e procedimentos específicos ao dispor que outras “situações poderão ser regulamentadas”.

Quanto à competência do MAPA nessa matéria, houve atualização. Afinal, o que se restringia ao art. 4º do decreto vigente foi desmembrado em capítulos, conforme cada designação das atribuições. Ainda assim, o novo texto “enxugou” as atividades exercidas pelo Ministério, acrescentando, entretanto, que elas serão disciplinadas em legislação complementar.

O art. 4º do novo texto proposto cria relevantes definições dos termos utilizados na área, dentre eles, assistente de pista, corpo técnico, DGPS, entidade de ensino, fiscalização, operador aeroagrícola, técnico coordenador de aviação agrícola e zonas sensíveis, o que facilita o entendimento e distinção das atividades contidas no decreto.

No Capítulo II, Seção I, II e II, do novo texto, foi acrescentada a figura do Auditor Fiscal Federal Agropecuário, que poderá, inclusive, lavrar auto de infração. Ainda, dispõe sobre os sujeitos passíveis de fiscalização e as obrigações do Corpo Técnico de Aviação Agrícola, incluindo o contratante e entidades de ensino credenciadas, cenário inovador em relação ao decreto vigente.

O Capítulo III do novo texto estipula que o registro de operadores aeroagrícolas e o credenciamento de entidades de ensino são obrigatórios e deverão ser realizados em sistema apropriado, seguindo critérios definidos pelo MAPA, ambos possuindo validade de 7 anos, devendo ser solicitada a renovação 90 dias antes do término da validade. Em comparação ao decreto vigente houve a revogação do prazo de 5 anos, por força do Decreto nº 99.427/1990.

Quanto às infrações e penalidades, encontram-se no art. 9º do decreto vigente e consistem em sanções de multa, suspensão do registro e cancelamento do registro, cuja aplicação poderá ser feita de forma isolada ou cumulativamente. Já no novo texto, além das sanções anteriores, sobrevieram a advertência, cassação do credenciamento e cassação da habilitação de profissional para prestar serviços relacionados à atividade de aviação agrícola. Elas poderão ser graduadas de acordo com o risco para a atividade, com sua natureza classificada em grau leve, moderado, grave e gravíssimo e, ainda, consideradas circunstâncias agravantes e atenuantes.

Ademais, no novo texto também foram acrescidas medidas cautelares de apreensão de equipamentos ou aeronaves e a suspensão temporária da atividade.

Quanto à lavratura do Auto de Infração, que ganha na nova leitura um capítulo inteiro para si, há uma discriminação mais criteriosa, bem como inclusão do prazo de 20 dias para apresentação de defesa e prazo de 20 dias para interposição de recurso, ambos contados da data de recebimento ou do conhecimento da autuação ou a partir da data de transmissão eletrônica. No decreto vigente, há apenas a disposição no art. 32 de um prazo de 15 dias para interposição de recurso.

As disposições de procedimento, efeitos e tramitação do processo administrativo, em 1ª e 2ª instância, também estão incluídas no capítulo relativo ao Auto de Infração.

Quanto aos documentos de fiscalização e comunicação, o novo texto estabelece que serão aceitos meios eletrônicos que permitam a ciência do fiscalizado e do órgão fiscalizador, e autoriza o último a fazer imagens, fotografar, filmar ou usar de outros meios tecnológicos, para registrar os fatos e produzir provas processuais nos locais onde esteja executando a apuração, o levantamento de informações, a vistoria, a auditoria e a fiscalização, incluindo as aeronaves, drones, máquinas agrícolas, veículos, bens, produtos, instalações, equipamentos, pessoas envolvidas e o objeto ou a causa da irregularidade.

Em conclusão, a proposta de alteração do texto legal oferece inovação em muitos pontos. Em outros, há apenas uma reorganização sistemática, para melhor compreensão dos termos e disposições. Daí a importância das entidades de classe, parceiros institucionais e demais interessados realizarem a sua leitura e, encontrando abusividades, contrariedades ou ausência de regulamentação, apontá-las imediatamente para apreciação.

Segue abaixo o link de acesso a minuta do decreto, para eventual sugestão de alteração, supressão ou inclusão de textos (alíneas, incisos, parágrafos, artigos ou capítulos), com a devida justificativa, bem como apontamento de incorreções (gramática, concordância, pontuação, numeração, data, ementa) no texto do documento:

https://docs.google.com/forms/d/e/1FAIpQLSc8WQ701WrHj7tVr3qvg4oosVoZVnfvydrlKWjO34j-p0xTlw/viewform

Luana Santos Lopes, advogada especialista em direito ambiental e agronegócio.

 

Veja também:

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