por Wellington Gabriel Barros.
Em tempos de estiagem em muitos municípios do Brasil, fato que prejudica o desempenho do agronegócio, muito se questiona sobre os impactos nos contratos agrários, sobretudo nas questões que envolvem partilha dos resultados, no caso da parceria, e pagamento do aluguel da terra, no caso do arrendamento.
Acerca do contrato de parceria rural, se houver perda dos frutos ou queda de produção estimada, ambos os contratantes suportam o ônus (ou o bônus, em caso de superávit), já que o elemento caracterizador desse contrato é o risco. Isso quer dizer que, seja nos ganhos ou nas perdas, parceiros-outorgante e outorgado participam dos resultados, proporcionalmente (o art. 96, inc. VI, do Estatuto da Terra traz os percentuais a serem partilhados).
No caso do arrendamento, em que o preço é pago na forma de um aluguel fixo, sem qualquer tipo de risco para o proprietário da gleba (em que pese estipulação de pagamento variável, muitas das vezes, o que contraria a lei agrária) os reflexos da estiagem são agressivos à apenas uma das partes: o arrendatário.
Nesse tipo de hipótese climática, poderá o arrendatário alegar impossibilidade de pagamento, escudando-se no inciso IV do art. 26. do Decreto nº 59.566/1966 (causa de extinção por motivo de força maior) e na Teoria da Imprevisão lastreada no art. 478 do Código Civil ( Nos contratos de execução continuada ou diferida, se a prestação de uma das partes se tornar excessivamente onerosa, com extrema vantagem para a outra, em virtude de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, poderá o devedor pedir a resolução do contrato)?
Via de regra, a resposta é negativa.
Não há compartilhamento de risco da produção no caso do arrendamento rural.
A resolução daquela questão pode não ser simples aos contratantes, sempre se recomendando o diálogo, já que se precisa identificar qual a intenção das partes: se pretendem manter ou extinguir o contrato.
No caso de extinção, tanto pode ser requerida pelo dono da terra (porque não recebeu o valor do aluguel), quanto pelo arrendatário, que não irá conseguir cumprir o restante do contrato.
Com relação à figura do preço, permanece a obrigação de pagá-lo, já que os riscos inerentes à atividade de quem produz não podem ser repassados ao arrendador, sob pena de se desvirtuar essa modalidade contratual. Esta é a posição sedimentada pela jurisprudência, que geralmente tem afastado a aplicação da defasada teoria da imprevisão nos contratos agrários. Afinal de contas, de modo inverso, o arrendador também não pode ingressar em juízo para rever o preço do arrendamento em caso de superprodução do arrendatário.
No caso do pedido de extinção do contrato, lastreado pelo inciso IV do art. 26 do Decreto nº 59.566/1966, deverá ser apurada se esta estiagem foi ou não considerada “força maior”, aferível pelos órgãos oficiais, que decretarão esse estado crítico. Caso positivo, representando alguma chance de minimizar as perdas contratuais do arrendatário, o art. 29 do Decreto nº 59.566/1966 isenta os contratantes do pagamento por perdas e danos.
Em caso da omissão dos órgãos de controle, ainda que a terra tenha sido agredida violentamente pelo clima, responde o arrendatário pelo encerramento antecipado do contrato, já que sobre seus ombros recai o RISCO DA ATIVIDADE PRODUTIVA.
Melhor cenário se apresenta quando a intenção das partes converge, facilitada pelo diálogo e bom relacionamento. Essa situação permite a continuidade do contrato para que atinja o seu desiderato: o pagamento do preço ao arrendador e a geração de alimento e riqueza por parte do arrendatário.
Neste caso, em que a conversa e a visão de negócios se mostra salutar, é possível que as partes façam um aditivo contratual para readequar as condições da avença. É possível que se prorrogue o prazo; se modifique a área de produção; se revise a cláusula do preço; dentre diversas outras possibilidades, sempre respeitada a legislação agrária para que o contrato traga segurança jurídica aos contratantes.
Tais medidas permitem a retomada na produção por parte do arrendatário, gerando o fôlego necessário, e a devida reparação financeira ao arrendador (compensação pela frustração da expectativa do recebimento do preço), que também tinha a expectativa de recebimento desses valores.
Ao final, não se pode esquecer da relação da estiagem com o financiamento agrícola, outro tema em ebulição. Mas por se tratar de crédito rural, instituto que tem regramento específico, será abordado em outra oportunidade.
Leia também:
– Estiagem no RS: providências administrativas e judiciais por parte do produtor rural
– “Direito Agrário Levado a Sério” – episódio 3: A atividade agrária como objeto do Direito Agrário