Em decisão inédita, a Desembargadora Rosana Broglio Garbin, da 17ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, acolheu pedido de produtora rural para limitar a caução judicial para sustação de protesto ao valor da multa prevista em contrato de compra e venda de grãos.
No processo principal, a agricultora gaúcha ingressou com cautelar antecedente para sustar o protesto feito por cooperativa com a qual havia entabulado contrato de compra e venda a termo de trigo.
A cooperativa, que se encontra em processo de liquidação, passava por dificuldades financeiras e não estava cumprindo suas obrigações com os seus associados e demais produtores da região. Neste contexto, a agricultora notificou previamente a cooperativa de que não iria cumprir o contrato, em razão da provável inadimplência por parte da compradora .
Os grãos não foram entregues pela agricultora, nem a cooperativa pagou por eles. Posteriormente, a cooperativa protestou o contrato, o que levou a agricultora a buscar a sustação deste protesto no Judiciário.
Ofereceu em caução, para sustação do protesto, o depósito do valor equivalente à multa contratual, de 30% do valor do contrato.
O juízo de primeiro grau acolheu o pedido de sustação do protesto ante os fatos demonstrados no processo, mas condicionou a tutela ao depósito integral do valor do contrato.
Em agravo de instrumento, a agricultora aduziu ao Tribunal que, se a tese de nulidade do contrato não prosperar, o máximo que a cooperativa poderá lhe cobrar é justamente o valor da multa, já que as obrigações principais de entrega e pagamento não foram cumpridas por nenhuma das partes. Por esta razão, o caucionamento do valor equivalente à multa é suficiente para a sustação do título.
Em decisão monocrática, a Desembargadora Relatora Rosana Broglio Garbin acolheu a tese da agricultora e determinou a redução do valor a ser depositado em caução para o equivalente à multa contratual.
Aduziu ainda a Desembargadora que é relevante a sustação do protesto justamente porque a agricultora depende do acesso ao crédito rural para a manutenção da sua atividade agrária, o que seria dificultado com a manutenção do protesto.
Atua na defesa da agricultora o advogado agrarista Francisco Torma.
Fonte: Portal DireitoAgrário.com, com informações elaboradas a partir de consulta pública aos autos do processo nº 5084478-11.2021.8.21.7000/RS junto ao site do TJRS.
* A título de curiosidade, a situação de risco de insolvência pela cooperativa é similar ao caso narrado em notícia de decisão publicada pelo Jornalista Felipe Vieira acerca de decisão de Juíza da Cidade de Acréuna (GO) suspendeu liminarmente que um contrato milionário de entrega de soja firmado entre um produtor rural e empresa credora por alegação de quebra de regras de compliance, sob pena de risco de insolvência (leia aqui).
Confira a íntegra da decisão do TJRS:
AGRAVO DE INSTRUMENTO No 5084478-11.2021.8.21.7000/RS
DESPACHO/DECISÃO
Trata-se de agravo de instrumento interposto da decisão que, nos autos autos da ação de sustação de protesto, deferiu a liminar pleietada para sustação do protesto realizado, entretanto condicionado ao depósito integral do valor protestado, nos seguintes termos (Evento 11 – Despacho/Decisão 1, autos de origem):
“Vistos.
Recebo os embargos declaratórios, pois tempestivos.
Entretanto, não obstante a notificação extrajudicial tenha efetivamente incluído o contrato objeto do presente feito (18140), isso, por si só, não altera o teor da decisão do evento 5 para deferir a tutela de urgência.
No que diz respeito ao depósito requerido pela parte autora (30% do valor do contrato), tenho que somente com o depósito do valor integral protestado pode-se conceder a sustação ou suspensão do protesto.
O Superior Tribunal de Justiça ao apreciar o Tema 902, firmou a seguinte tese: “A legislação de regência estabelece que o documento hábil a protesto extrajudicial é aquele que caracteriza prova escrita de obrigação pecuniária líquida, certa e exigível. Portanto, a sustação de protesto de título, por representar restrição a direito do credor, exige prévio oferecimento de contracautela, a ser fixada conforme o prudente arbítrio do magistrado.”
Deste modo, considerando que a sustação dos efeitos do protesto consiste em restrição ao direito do credor, necessário se mostra o oferecimento de contracautela no valor do título protestado.
Assim, acolho em parte os embargos declaratórios para deferir a liminar pleiteada e determinar a a sustação do protesto n° 28193, referente ao débito aqui discutido, até decisão final, condicionada, entretanto, ao depósito do valor integral protestado (R$ 17.679,51).
Efetuado o depósito, oficie-se ao Tabelionato de Protestos Emilio Juarez de Ávila Falcão,do Município de Humaitá/RS, comunicando-se a decisão.
A presente decisão assinada digitalmene vale como ofício ao destinatário.
Dil. legais.”
Em suas razões, alega que foi protestada injustamente relativamente a um título oriundo de contrato de compra e venda de grãos que não foi cumprido por nenhuma das partes. Informa que notificou a agravada de que não iria cumprir o contrato, pois em contratos anteriores a cooperativa não vinha cumprindo suas obrigações. Afirma que merece reforma a decisão proferida pelo magistrado de origem, tendo em vista que não há motivo para se vincular o depósito integral do valor protestado com a sustação de injusto protesto. Aduz que não houve a entrega do produto, nem pagamento da parte compradora, de forma que não há como cobrar o valor principal contratado. Menciona, ainda, que caso não logre êxito em demonstrar a nulidade do contrato, o que caberia à cooperativa cobrar, a multa pelo inadimplemento, pois também não cumpriu sua parte do contrato. Afirma estarem presentes os requisitos para concessão da tutela recursal, uma vez que, como produtora rural depende de acesso aos instrumentos de crédito rural para formação de suas lavouras e produção agrícola. Postula a concessão de tutela recursal para que o valor da caução seja limitado ao valor da multa contratual (R$ 7.650,58) e não sobre o valor total do contrato. Ao final, requer seja dado provimento ao agravo de instrumento.
É o relatório.
Recebo o agravo de instrumento, porquanto presentes os requisitos de admissibilidade (art. 1.015 do CPC).
Insurge-se a parte agravante contra decisão que deferiu a sustação do protesto no 28193, mediante a caução do valor integral protestado.
Inicialmente, destaco se mostra possível a suspensão dos efeitos do protesto, ainda que regularmente registrado, desde que presentes os pressupostos para a concessão de medida de tutela de urgência se presentes os requisitos do artigo 300 do Novo Código de Processo Civil, quais sejam: probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.
No caso dos autos, a autora, ora agravante, ajuizou ação sustação/cancelamento de protesto em caráter antecedente, na qual sustenta que o titulo levado a protesto era oriundo de contrato de compra e venda de trigo. Refere, ainda, que em razão do inadimplemento pela cooperativa em relação a outros contratos entabulados entre as partes, notificou a agravada informando o não cumprimento do contrato, em setembro de 2020, conforme documento constante do Evento 1 – OUTROS4, dos autos de origem.
Analisando os documentos juntados, verifica-se a verossimilhança nas alegações a justificar a concessão da liminar pretendida no presente agravo de instrumento, tendo em vista que restou demonstrada a intenção da agravante em rescindir seu contrato com a cooperativa agravada, que não estaria cumprindo as abirgações acordadas em contratos anteriores.
Ademais, verifica-se a presença do o perigo de dano, em razão da demora no trâmite, porque a agravante terá dificuldade de obter crédito rural, o que poderá prejudicar a sua atividade.
Dessa forma, não se justifica a manutenção da caução no valor total do contrato, uma vez que nenhuma das partes cumpriu sua obrigação, isto é, não houve a entrega da mecadoria, nem o pagamento do preço acordado, sendo razovale sua minoração para o valor equivalente a multa pelo descumprimento do contrato.
Assim, DEFIRO a tutela recursal pleietada para autorizar que o valor da caução seja o equivalente a multa por descumprimento do contrato, no valor de R$ 7.650,58. (sete mil seiscentos e cinquenta reais e cinquenta e oito centavos).
Intime-se o agravante dessa decisão, bem como a parte agravada para, querendo, apresentar contrarrazões.
Após, remetam-se os autos conclusos para julgamento.
Documento assinado eletronicamente por ROSANA BROGLIO GARBIN, Desembargadora Relatora, em 15/6/2021, às 14:59:33, conforme art. 1o, III, “b”, da Lei 11.419/2006. A autenticidade do documento pode ser conferida no site https://eproc2g.tjrs.jus.br/eproc/externo_controlador.php?acao=consulta_autenticidade_documentos, informando o código verificador 20000873331v14 e o código CRC 4044df4d.
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