“A Celg Distribuidora S/A foi condenada a pagar o prejuízo, estimado em R$ 75 mil, de um criador de aves, da cidade de Buenolândia. Por causa de uma queda de energia elétrica superior a cinco horas, quase de 11 mil animais morreram sem a refrigeração adequada no criadouro. A decisão é da 6ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJGO), nos termos do voto da relatora, desembargadora Sandra Regina Teodoro Reis.
Consta dos autos que a interrupção do fornecimento de eletricidade ocorreu de madrugada do dia 7 de dezembro de 2013, causando a paralisação de ventiladores e nebulizadores que controlavam a temperatura do aviário, de propriedade de João Ferreira Sobrinho. Para o valor dos danos materiais, a magistrada considerou o custo das aves e, ainda, as despesas que o proprietário da fazenda teve ao ter de transportar os animais sobreviventes a outro local seguro.
Em primeiro grau, a sentença já havia sido favorável ao autor, proferida pelo juiz Gustavo Braga Carvalho, da 1ª Vara Cível da comarca de Itaberaí – que abrange Buenolândia. A Celg recorreu, para contestar a responsabilidade da empresa no evento, mas o colegiado manteve a decisão, sem reformas.
No voto, a desembargadora Sandra Regina Teodoro Reis considerou que a relação estabelecida entre a concessionária e o fazendeiro se enquadra no Código de Defesa do Consumidor. Dessa forma, a responsabilidade pelos danos, causada pela empresa, deve ser analisada com base na teoria do risco administrativo, na qual a fornecedora responde independentemente da configuração de culpa, somente pela comprovação do dano (morte dos animais) e nexo de causalidade (queda de energia).
Como a Celg não comprovou ocorrência de chuvas ou raios que atrapalhassem o fornecimento de eletricidade, a magistrada considerou que não há como isentar a concessionária da obrigação de reparar o prejuízo. ‘Sendo a apelante responsável pelo fornecimento de energia elétrica, e sendo este um serviço que exige eficiência, continuidade e segurança, não é plausível que um defeito na rede de distribuição e/ou geração não seja previsível pela empresa e que o restabelecimento de energia se estenda por inúmeras horas‘”.
Fonte: TJGO, 24/08/2016.
Leia também:
– Concessionária de energia elétrica é condenada a indenizar piscicultor pelos prejuízos sofridos pela interrupção no fornecimento de energia necessária ao exercício da atividade agrária (Portal DireitoAgrário.com, 29/03/2016 – com comentário de Wiliam Mecca Martinelli, Advogado especialista em Direito Agrário e Ambiental pelo I-UMA/UNIP.)
Veja a íntegra da decisão:
APELAÇÃO CÍVEL Nº 240137-83.2014.8.09.0079 (201492401374)
COMARCA ITABERAÍ APELANTE CELG DISTRIBUIDORA S/A CELG D
APELADO JOÃO FERREIRA DA SILVA SOBRINHO
RELATORA Desembargadora Sandra Regina Teodoro Reis
VOTO
Presentes os pressupostos recursais, conheço da Apelação Cível.
Consoante visto no relatório, trata-se de Apelação Cível1 interposta por CELG DISTRIBUIDORA S/A CELG D, contra sentença2 proferida pelo MM. Juiz de Direito da Família e Sucessões, Infância e Juventude e 1° Cível da Comarca de Itaberaí, Dr. GUSTAVO BRAGA CARVALHO, nos autos da ação de indenização, movida por JOÃO FERREIRA DA SILVA SOBRINHO, ambos devidamente qualificados.
Consta da petição inicial, que o autor JOÃO FERREIRA DA SILVA SOBRINHO possui 04(dois) galpões de criações de aves situados na Fazenda Carcereiro, Bom Sucesso e Paixão, localizada na zona rural, Distrito de Buenolândia-GO.
Aduz que o fornecimento de energia elétrica na referida propriedade foi interrompido, no período da madrugada, do dia 07/12/2013, restabelecendo inúmeras horas depois, ocasião em que morreram o total 10.914 (dez mil, novecentos e quatorze) aves, por conta do não funcionamento dos equipamentos de refrigeração, gerando um prejuízo à época do ajuizamento da ação, no valor de R$ 74.218,04 (setenta e quatro mil, duzentos e dezoito reais e quatro centavos), inclusas, neste montante, as despesas no importe R$ 1.970,00 (um mil, novecentos e setenta) com a retirada das aves do local, razão pela qual pugnou pela condenação da Concessionária Ré ao ressarcimento do dano material sofrido.
A sentença recursada foi proferida nos seguintes termos:
“[…] Ante o exposto, nos termos do art. 269, inciso I do CPC, JULGO PROCEDENTE os pedidos formulados na inicial, para condenar a requerida no pagamento de indenização por danos materiais no valor de R$ 74.218,04 (setenta e quatro mil, duzentos e dezoito reais e quatro centavos), com correção monetária pelo INPC, a partir do evento danoso e juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, a partir da citação. Condeno a requerida no pagamento das custas processuais e pagamento de honorários advocatícios que arbitro em 10% sobre o valor da condenação, nos termos do art. 20, § 3º, do Código de Processo Civil. Após o trânsito em julgado, certifique-se e intimem-se para adimplirem a obrigação no prazo de 15 (quinze) dias, sob pena de incidência da multa do art. 475-J do CPC. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Oportunamente, arquivem-se os autos, observada as baixas devidas.”
Inicialmente impõe-se observar que a interrupção de energia elétrica é questão incontroversa nos autos. O que se discute é o grau de responsabilidade da apelante pela ocorrência do evento danoso e se ocorreu alguma das excludentes do seu dever de indenizar.
Consabido que os serviços prestados pela concessionária de energia elétrica é de caráter consumerista, consoante os termos dos artigos 2° e 3°, do Código de Defesa do Consumidor, in verbis:
“Art. 2º Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final. Parágrafo único. Equipara-se a consumidor a coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis, que haja intervindo nas relações de consumo. Art. 3º Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços. § 1º Produto é qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial. § 2º Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista.”
Não se descura, também, que a responsabilidade civil da concessionária de energia elétrica pelos danos que vier a causar aos seus consumidores deve ser analisada com base na teoria do risco administrativo.
Assim, responde a concessionária independentemente da configuração de culpa, sendo necessário, tão somente, a comprovação do dano e do nexo de causalidade. A responsabilidade do Estado e de suas concessionárias caracterizar-se como objetiva, nos termos do artigo 37, § 6°, da Constituição Federal.
O CDC, por sua vez, estabelece:
Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos. § 1º O serviço é defeituoso quando não fornece a segurança que o consumidor dele pode esperar, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais: I – o modo de seu fornecimento; II – o resultado e os riscos que razoavelmente dele se esperam; III – a época em que foi fornecido. § 2º O serviço não é considerado defeituoso pela adoção de novas técnicas. § 3º O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar: I – que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste; II – a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro. § 4º A responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será apurada mediante a verificação de culpa. (Negritei)
Não prospera, por outro lado, a alegação de que o defeito possa ter ocorrido na rede de geração e distribuição fora de seu controle, e que talvez possa ter dado ensejo à queda de energia elétrica, configurando caso fortuito ou força maior, sendo causa de exclusão de responsabilidade. Ou ainda chuvas ou raios.
Isto porque, sendo a apelante responsável pelo fornecimento de energia elétrica, e sendo este um serviço que exige eficiência, continuidade e segurança, não é plausível que um defeito na rede de distribuição e/ou geração não seja previsível pela empresa e que o restabelecimento da energia se estenda por inúmeras horas.
De mais a mais, a testemunha de fl. 118 afirma não ter chovido ter tido incidência de raios na ocasião.
Outro não é a exegese do artigo 22 da Lei n°8.078/90:
“Art. 22. Os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos. Parágrafo único. Nos casos de descumprimento, total ou parcial, das obrigações referidas neste artigo, serão as pessoas jurídicas compelidas a cumpri-las e a reparar os danos causados, na forma prevista neste código.”
Outrossim, a apelante não logrou êxito em comprovar a incidência de raios, chuvas ou qualquer outro fator decorrente de força maior ou caso fortuito, ônus que lhe incumbia, de forma a fazer jus à excludente de responsabilidade.
In casu, o testemunho de fl. 118, as fotografias de fls. 30/32 e a própria declaração da empresa São Salvador Alimentos S.A (fl. 33/35) que atua em parceria com o recorrido, são robustas no sentido de que a morte dos frangos ocorreu devido à interrupção de energia elétrica na propriedade do apelado, com a paralisação dos ventiladores e nebulizadores que controlavam a temperatura no aviário. Sendo demonstrado também o nexo causal entre a comprovada interrupção do fornecido de energia e o dano.
A alegação de que cumpriu os índices estipulados pela ANEEL também não é suficiente para afastar a responsabilidade da concessionária, pois tais metas estabelecidas pela agência reguladora visam alcançar a excelência nos serviços prestados, mormente pelo fato de a energia elétrica ser um bem essencial e indispensável à sociedade moderna.
Estando ausente qualquer das excludentes de responsabilidade e comprovada a presença do dano e do nexo causal, únicos requisitos necessários para a caracterização da responsabilidade de indenizar por parte da concessionária, a sentença não merece reparo.
Cumpre ressaltar, ainda, que não existe lei a impor a compra de fontes alternativas de energia elétrica aos consumidores da recorrente (art. 5º, II, CF), mesmo porque, ante a violação do princípio da continuidade na prestação do serviço público e da eficiência (art. 37 da CF) por parte da apelante, como já dito cabível é a indenização pleiteada. Ademais, tal fato não é causa excludente da responsabilidade civil da companhia energética, tampouco, impõe-se ao consumidor possuir gerador em seu estabelecimento.
Sobre a matéria em debate, veja-se o entendimento do Superior Tribunal de Justiça e desta Corte de Justiça:
“PROCESSO CIVIL. RECURSO ESPECIAL.(…) 4. O risco da atividade de fornecimento de energia elétrica é altíssimo sendo necessária a manutenção e fiscalização rotineira das instalações. Reconhecida, portanto, a responsabilidade objetiva e o dever de indenizar.(…)”.(STJ, REsp 1095575/SP, Relatora Ministra NANCY ANDRIGHI, DJe 26/03/2013)
“1. Responsabilidade objetiva do fornecedor pelos danos causados aos consumidores por defeito na prestação de serviço de energia elétrica. Acórdão estadual pugnando que a concessionária de serviço público não se desincumbiu do ônus de comprovar a ausência de defeito ou a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro, nos termos do artigo 14, § 3º, do Código de Defesa do Consumidor. Incidência da Súmula 7/STJ. 2. Agravo regimental desprovido.” (STJ, AgRg no AREsp 318307/PE, Relator Ministro MARCO BUZZI, DJe 05/03/2014)
“A prestação de serviço de fornecimento de energia elétrica caracteriza relação de consumo, capaz de gerar a responsabilização da concessionária, consoante preconizam os artigos 14 e 20 ‘caput’ e inciso II, do Código de Defesa do consumidor (Lei nº 8.078/90).” (TJGO, 6ª CC, AC nº 224052- 34.2011.8.09.0109, Rel. Des. NORIVAL SANTOMÉ, DJ 1193 de 28/11/2012).
“AGRAVO INTERNO EM EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. DANOS MATERIAIS. INTERRUPÇÃO DO FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. GRANJA. MORTE DE AVES. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DA EMPRESA CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇO PÚBLICO. AUSÊNCIA DE FATO OU FUNDAMENTO NOVO. DECISÃO UNIPESSOAL MANTIDA I- A concessionária de serviço público tem o dever de ressarcir os danos a que deu causa ou deveria evitar, uma vez evidenciada a existência do nexo causal entre os danos sofridos pela vítima e o ato perpetrado. Nesse caso, a responsabilidade é objetiva, a teor do contido no § 6º do art. 37 da CF/88, e somente pode ser excluída ou atenuada mediante culpa exclusiva da vítima, caso fortuito, força maior e fato exclusivo de terceiros, excludentes não configuradas no caso concreto. Precedentes do STJ. II- Inexistindo lei a impor a compra de fontes alternativas de energia elétrica aos consumidores, e ante a violação dos princípios da continuidade na prestação do serviço público, e da eficiência (art. 37, CF/88), mostra-se cabível a indenização pleiteada. (…).” (TJGO, 2ª CC, AC 93187-58.2015.8.09.0148, Relator Desembargador NEY TELES DE PAULA, DJ 2073 de 21/07/2016)
DISPOSITIVO
EX POSITIS, conheço da apelação cível e nego-lhe provimento, para manter a sentença recursada por seus e pelos fundamento aqui esposados.
É o voto
Goiânia, 23 de agosto de 2016.
Desembargadora Sandra Regina Teodoro Reis
Relatora
APELAÇÃO CÍVEL Nº 240137-83.2014.8.09.0079 (201492401374)
COMARCA ITABERAÍ
APELANTE CELG DISTRIBUIDORA S/A CELG D
APELADO JOÃO FERREIRA DA SILVA SOBRINHO
RELATORA Desembargadora Sandra Regina Teodoro Reis
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. DANOS MATERIAIS. INTERRUPÇÃO DO FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. GRANJA. MORTE DE AVES. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DA EMPRESA CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇO PÚBLICO. 1. A prestação de serviço de fornecimento de energia elétrica caracteriza relação de consumo, capaz de gerar a responsabilização da concessionária, consoante preconizam os artigos 14, 20 caput e inciso II e 22 do Código de Defesa do consumidor (Lei nº 8.078/90). 2. A concessionária de serviço público tem o dever de ressarcir os danos a que deu causa ou deveria evitar, uma vez evidenciada a existência do nexo causal entre os danos sofridos pela vítima e o ato perpetrado. Nesse caso, a responsabilidade é objetiva, a teor do contido no § 6º do art. 37 da CF/88, e somente pode ser excluída ou atenuada mediante culpa exclusiva da vítima, caso fortuito, força maior e fato exclusivo de terceiros, excludentes não configuradas no caso concreto. Precedente do STJ. APELAÇÃO CÍVEL CONHECIDA E DESPROVIDA.
A C Ó R D Ã O
Vistos, relatados e discutidos os presentes autos de APELAÇÃO CÍVEL Nº 240137-83.2014.8.09.0079 (201492401374) da Comarca de Itaberaí, em que figura como apelante CELG DISTRIBUIDORA S/A CELG D e como apelado JOÃO FERREIRA DA SILVA SOBRINHO.
ACORDAM os integrantes da Quarta Turma Julgadora da 6ª Câmara Cível, à unanimidade de votos, em conhecer e desprover a Apelação Cível, nos termos do voto da Relatora.
A sessão foi presidida pela Desembargadora Sandra Regina Teodoro Reis.
Votaram com a Relatora, o Desembargador Jeová Sardinha de Moraes e o Desembargador Fausto Moreira Diniz.
Presente a ilustre Procuradora de Justiça Doutora Ana Cristina Ribeiro Peternella França.
Goiânia, 23 de agosto de 2016.
Desembargadora Sandra Regina Teodoro Reis
Relatora