por Alexandre Victor Abreu
Se você atua no agronegócio, em indústrias de laticínios ou na produção ou fabricação de produtos de origem animal (carnes, leite, ovos, mel, etc), e possui o selo do Serviço De Inspeção Federal (SIF), provavelmente já se deparou com uma fiscalização do Ministério da Agricultura e Pecuária (MAPA).
O Serviço de Inspeção Federal, vinculado ao Departamento de Inspeção de Produtos de Origem Animal – DIPOA, é o órgão responsável por assegurar a qualidade de produtos de origem animal comestíveis e não comestíveis destinados ao mercado interno e externo, bem como de produtos importados.
Ainda que sua empresa atue em conformidade com as exigências legais, em especial ao RIISPOA – Regulamento de Inspeção Industrial e Sanitária de Produtos de Origem Animal – Decreto n° 9.013, de 2017, é possível que já tenha sido autuada, especialmente diante do crescente rigor do órgão quanto às condições das estruturas físicas e ao cumprimento dos regulamentos específicos de cada produto, como exemplo análises físico-químicas e microbiológicas e rotulagem.
Infelizmente, a relação entre os empreendedores e a administração pública nem sempre é equilibrada, o que muitas vezes gerar um sentimento de injustiça diante das autuações recebidas em razão das ações fiscalizatórias. Soma-se a isso o fato de que diversas decisões do MAPA têm se baseado no Ofício Circular nº 40/2023/DIPOA, recentemente revogado e substituído pelo Ofício Circular nº 4/2025.
Esses documentos vêm sendo utilizados como fundamento para aplicar multas no valor máximo previsto, com acréscimo de 10% por reincidência, nos casos em que a empresa já tenha sido autuada pelo mesmo motivo. Essa prática tem gerado impactos financeiros relevantes, sobretudo em empresas de pequeno e médio porte, e, pior, são aplicadas sem a devida fundamentação individualizada sobre as circunstâncias concretas ou análise do grau de reprovabilidade da conduta.
O Ofício Circular nº 40/2023/DIPOA/MAPA, assim como o nº 4/2025, são atos administrativos internos, de natureza meramente instrumental e orientativa. Ou seja, servem para padronizar interpretações e diretrizes entre unidades do MAPA, sem força normativa e sem criar obrigações para os administrados.
De acordo com o entendimento consolidado do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Superior Tribunal de Justiça (STJ), atos administrativos sem previsão legal expressa e sem força normativa não podem impor obrigações ou penalidades aos particulares, sob pena de violação aos princípios da legalidade, da reserva legal e da segurança jurídica.
Portanto, a utilização dos referidos ofícios como único ou principal fundamento para a majoração automática de penalidades representa ato administrativo nulo, por vício de competência normativa e por desvio de finalidade, conforme disposto na Lei nº 9.784/1999.
Ressalte-se que, ao impor a cobrança da multa no valor máximo, acrescidas de 10% para cada reincidência específica constatada, sem previsão legal ou regulamentar expressa, o MAPA ultrapassa os limites da legalidade, convertendo indevidamente os ofícios circulares em atos normativos disfarçados, desprovidos de legitimidade e validade jurídica.
Logo, infere-se que as sanções pecuniárias fixadas sob este fundamento ferem, diretamente, os princípios jurídicos norteadores da Administração Pública, pois não guardam observância obrigatória das disposições legais que vinculam a aplicação de penalidades, segundo o próprio regulamento definido pelo MAPA. Há vício de ilegalidade, portanto, por ausência de correta aplicação das disposições da Lei nº 14.515/2022.
Desse modo, entendo que não dispondo a Lei acerca dessa situação (possibilidade de aplicação de multa no valor máximo em caso de reincidência), não poderia o MAPA criar regra que a própria Lei não impôs, sendo possível questionar essas decisões e termos de julgamento administrativo pela via judicial, visando o reconhecimento da ilegalidade da aplicação do Ofício-Circular nº 40/2023/DIPOA/SDA/MAPA e/ou Ofício-Circular nº 4/2025, que são instrumentos inadequados para estipular mecanismos de gradação e majoração de penalidades administrativas e buscando até mesmo a restituição de multas cobradas e já quitadas, mas que foram aplicadas no patamar mais alto sob este fundamento.
No mesmo sentido, importante ressaltar que a apresentação de defesas e recursos administrativos bem fundamentados pode evitar a configuração de reincidência, protegendo sua empresa contra multas ainda maiores em eventuais futuras fiscalizações.
Conhecer a infinidade de normas que regem a relação entre a fiscalização do Ministério da Agricultura – MAPA (e outros órgãos reguladores da indústria de alimentos) e o fiscalizado só é possível a partir da experiência e especialização, sobretudo diante da complexidade e especificidade das normas aplicáveis aos Laticínios, granjas, frigoríficos, dentre outros.
Diante da complexidade da legislação que rege a atuação do Ministério da Agricultura e seus desdobramentos sobre empresas fiscalizadas, especialmente no setor de produtos de origem animal, é essencial compreender os limites legais das penalidades impostas e os meios adequados de impugnação. A apresentação de defesas e recursos administrativos bem estruturados pode não apenas evitar autuações indevidas, como também preservar a regularidade e sustentabilidade da atividade empresarial, especialmente frente ao risco de reincidência e de aplicação de multas exacerbadas sem base legal adequada.
