quinta-feira , 25 abril 2024
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Direito Agrário - Foto: Maurício Fernandes

Lições Preliminares de Direito Agrário: Discriminação de terras devolutas públicas

por Darcy Walmor Zibetti.

 

Tendo em vista a discussão do projeto de lei sobre regularização fundiária no Congresso Nacional, vou tratar neste artigo sobre discriminação de terras devolutas (públicas).

 

Antecedentes

 

Sabemos que originariamente todas as terras do Brasil pertenciam à Coroa portuguesa. Com a proclamação da República passaram ao domínio público nacional.

A Lei nº 601/1.850 (Lei de Terras) definiu o que fosse terra devoluta: “toda a terra que não havia sido destinada a algum uso público e aquela que não havia sido legalmente transferida ao domínio privado”.

Pela Constituição republicana de 1891 as terras devolutas foram transferidas para os Estados federados. A União se reservou a Faixa de Fronteira inicialmente de 66 km, passando, após, para 100 km e, hoje, é de 150 km.

Da discriminação de terras devolutas

Do histórico do legislativo:

  1. Houve leis estaduais;
  2. Houve o Decreto-Lei nº 9.760/1946 que previa a instância administrativa e a instância judicial;
  3. Foi expedida a Lei nº 3.081, de 22 de dezembro de 1956, que eliminou o processo administrativo, limitando-se ao procedimento judicial;
  4. Finalmente o Estatuto da Terra – Lei nº 4.504/1964, restabeleceu em seu art. 11 a instância administrativa;
  5. Finalmente foi aprovada a Lei nº 6.383/1976, que revogou expressamente a Lei nº 3.081/1956 e estabeleceu toda a normatividade de procedimentos administrativos e judiciais.

Cabe frisar que por discriminar se entende “separar o público do privado”.

O Estatuto da Terra – Lei nº 4.504/1964 criou o IBRA, transformado em INCRA em 1970. Este diploma legal previu no art. 10 que toda a terra pública deveria ser privatizada, reservando-se o Poder Público, somente terras destinadas à pesquisa, educação, experimentação e fomento.

Por longo tempo o INCRA tornou-se mais importante que o próprio Ministério da Agricultura.

Foi criada a Comissão Coordenadora das Comissões Estaduais discriminatórias. O INCRA atuava diretamente e através de convênio com os Estados. Tive a oportunidade de ser Presidente de uma Comissão discriminatória no Rio Grande do Sul e seguidamente havia reuniões em Brasília convocadas pelo Dr. Altir de Souza Maia, Coordenador Geral.

Cabe lembrar o Dr. Marcos Afonso Borges (que escreveu o livro “Ação discriminatória”, Ed. Universidade de Direito de São Paulo, 1972) explícita que a discriminatória consta de três fases:

  1. Fase preliminar, de chamamento dos interessados ao processo afim de exibirem seus títulos;
  2. Contenciosa, em que se discute complementarmente o domínio dos litigantes;
  3. Demarcatória, na qual se materializam os lindes dos imóveis públicos e privados ou particulares.

Esse emérito escritor goiano também explícita a natureza jurídica da ação discriminatória. E, pondera: “tomando-se por base unicamente a pretensão, ação discriminatória é:

  1. real , pois se discute amplamente o domínio. A declaração domínio, quer do autor, quer do réu, com o consequente deslinde constitui um dos principais princípios do pedido;
  2. imobiliária, porque se cinge a bens imóveis;
  3. reipersecutória, uma vez que por meio dela visa o poder público à individualização de suas terras devolutas, bem como a persecução das que assim foram consideradas e se encontram sob posse injusta de outrem, integrando-se, definitivamente em seu patrimônio;
  4. principal, já que independe de qualquer outra ação;
  5. pública, visto que é privativa da União, dos Estados e Municípios e DF, isto é, somente o poder público tem legitimação para propô-la;
  6. especial, por ter procedimento próprio, constituído de três fases.”

E acrescenta: “ser procedente o pedido sem o reconhecimento de área privada os participantes passam à situação de meros possuidores, em contraposição à do Estado, titular do domínio”.

O mesmo efeito se dá ou acontece, se o ato decisório separar uma parte de terras por ser efetivamente de domínio privado, ou julgar o pedido improcedente.

Em tal caso, consolidasse a propriedade privada e o Estado torna-se realmente não proprietário.

Darcy Walmor Zibetti – Presidente da União Brasileira dos Agraristas Universitários – UBAU.

 

Veja também:

Lições Preliminares de Direito Agrário: A política Agrícola ou de Desenvolvimento Rural do Estatuto da Terra e a Constituição de 1988

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