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Direito Agrário

Fábrica de rações é condenada a cumprir com a obrigação de entrega de ração de peixes a piscicultor

“O Juizado Especial Cível da Comarca de Bujari deferiu parcialmente o pedido de antecipação dos efeitos da tutela do Processo n° 0700324-56.2016.8.01.0010, determinando a Peixes Da Amazônia S.A. o cumprimento da obrigação de entregar a ração de peixes ao reclamante E. D. R. Também foi estabelecido prazo de cinco dias, sob pena de multa diária no valor de R$ 300. A decisão foi publicada na edição n° 5.817 do Diário da Justiça Eletrônico.

O juiz de Direito Luiz Camolez, que estava respondendo pela unidade judiciária, esclareceu que o reclamante apresentou documentação mínima para demonstrar a veracidade dos fatos e de sua vulnerabilidade, sendo assim, o andamento a inversão do ônus da prova é a medida mais justa que se impõe.

 Entenda o caso

O autor informou ter realizado uma compra de rações para peixes no valor de R$ 26.424,20 mil no ano de 2016, ficando acordado que a empresa ré forneceria mensalmente seu produto. Contudo, até o momento, foi entregue uma quantidade referente ao valor de R$ 4.344,20 e, apesar de tentativas de acordo via mensagens telefônicas, a situação não evoluiu.

Em sua inicial, o demandante alegou que o descumprimento das encomendas tem lhe causado lesão financeira e, sua criação, ficado sem os devidos cuidados para o desenvolvimento necessário destinado ao comércio durante a Semana Santa deste ano de 2017.

 Decisão

O juiz de Direito evidenciou que a referida relação de comercial será apreciada com base no Código de Defesa do Consumidor, uma vez que a parte reclamada amolda-se ao conceito de fornecedor, à luz do artigo 3º da Lei n° 8.078/90, haja vista que é pessoa jurídica que comercializa produtos de ração, desenvolvendo atividade final.

Da mesma forma, o cliente que adquire a ração também se encaixa no conceito de consumidor, pois é o destinatário final. Assim, não há dúvidas de que a parte reclamante e a reclamada possuem relação jurídica de consumo e assim deve ser analisada a parcial contraprestação, conforme a documentação anexada nos autos.

Acerca da tutela de urgência, o magistrado assinalou o estabelecido pelo artigo 300 do Código de Processo Civil que ‘a tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo’.

No entendimento do magistrado, os requisitos quanto ao fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação estão preenchidos, pois o consumidor não pode ser ainda mais lesado, considerando-se o alto valor já pago e necessidade urgente em alimentar os peixes, objetivando a sua engorda e crescimento adequado para futura venda.

Por fim, o Juízo apontou que a reclamada poderia ainda ter adquirido ração de outra empresa para atender o reclamante, uma vez que recebeu uma quantia considerável em dinheiro e deixou de cumprir com sua obrigação, assumindo o risco de causar um prejuízo de difícil dimensão”.

Fonte: TJAC, 

Direito Agrário

Confira a decisão:

Processo 0700324-56.2016.8.01.0010

Procedimento do Juizado Especial Cível – DIREITO DO CONSUMIDOR-

RECLAMANTE: Edson Dias Ramos – RECLAMADO: Peixes da Amazônia S.a. (Peixes da Amazônia)

 Autos n.º 0700324- 56.2016.8.01.0010

Classe Procedimento do Juizado Especial Cível

Reclamante Edson Dias Ramos Reclamado Peixes da Amazônia S.a. (Peixes da Amazônia)

Decisão

EDSON DIAS RAMOS promoveu ação de obrigação de fazer c/c reparação de danos morais e materiais, com pedido liminar contra a empresa PEIXES DA AMAZÔNIA S.A., uma vez que informa ter realizado uma compra de rações para peixes no valor de R$ 26.424,20 em 29/06/2016, ficando a empresa ré obrigada a entregar mensalmente a quantia necessária ára alimentar os peixes.

Informa que a empresa reclamada até o momento entregou uma quantidade de ração no valor de R$ 4.344,20 no dia 05/08/2016 e, a partir de setembro do presente exercício a reclamada passou a descumprir com as entregas de ração, causando lesão financeira ao reclamante, pois os peixes encontram-se sem alimentação adequada e, como consequência, não ganharão peso, nem crescerão para serem futuramente vendidos na Semana Santa de 2017, conforme previamente planejado pelo reclamante.

Além disso, tentou realizar acordo pelo telefone via Whatsapp.

Para justificar o pedido de tutela de urgência, o autor reclamante afirma ser verossímil suas alegações, pois demonstra que já pagou o valor de R$ 26.424,20 e que a parte ré reclamada não cumpriu com a obrigação a ração encomendada.

Além disso, haveria o perigo da demora, pois os peixes deixarão de crescer, tampouco ganharão peso adequado para venda na Semana Santa de 2017, o que acarretará prejuízo financeiro e danos que pode se prolongar no tempo.

O reclamante anexou com a inicial o comprovante de transferência bancária do valor de R$ 26.424,20 em favor da parte reclamada (p.07), a Notas Fiscais n.os 5537 – Sé- rie 001 e 5997 – Série 001 (pp. 08/09), conversas ocorridas no Whatsapp (pp.10/12), comprovação da compra de peixes (p. 15).

Decido.

Aprecio o pedido de concessão de tutela de urgência.

Da aplicação do Código de Defesa do Consumidor.

No presente caso concreto, registra-se de início que é possível a aplicação do Código de Defesa do Consumidor nas relações de comercialização de produtos parte reclamada amolda-se perfeitamente ao conceito de fornecedor, à luz do artigo 3o da Lei n° 8.078/90, haja vista que é pessoa jurídica que comercializa produtos de ração desenvolvendo atividade final.

Ao passo que os clientes que necessitam dos produtos de ração também se encaixam no conceito de consumidor, pois são eles que adquiriram produtos como destinatário final. Assim, não há dúvidas de que a parte reclamante e a reclamada possuem relação jurídica de consumo.

A primeira, na qualidade de consumidora, previsto no caput do art. 2º, da Lei n. 8.078/90, eis que destinatária final dos produtos vendidos pela parte reclamada que, por sua vez, ocupa a condição de fornecedora, consoante artigo 3º, § 2º, do mesmo diploma legal nos seguintes termos da Lei:

Art. 2º Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.

Art. 3º Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividades de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestações de serviços.

(…)

§ 2º Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista.

Portanto, as regras de consumo se aplicam para a solução do presente caso concreto, visto que ocorreu aquisição dos produtos fornecidos pela parte reclamada, sem haver a integral contraprestação, referente a entrega, conforme havia sido combinado, conforme a documentação anexada com a inicial (pp. 07/12).Da inversão do ônus da provaE, estando caracterizada a relação de consumo, os princípios protetivos da Lei n. 8.078/90 devem ser aplicados em sua integralidade. Inicialmente, destaca-se, então, o artigo 6º, incisos III, IV, V, VI e VIII :

Art. 6º São direitos básicos do consumidor:

(…)

III – a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem;

IV – a proteção contra a publicidade enganosa e abusiva, métodos comerciais coercitivos ou desleais, bem como contra práticas e cláusulas abusivas ou impostas no fornecimento de produtos e serviços.

V a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas;

VI efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos;

(…)

VIII a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiência;

Cláudia Lima Marques esclarece alguns aspectos da extensão da norma protetiva:

“Nestes mais de dez anos de prática do CDC, discute-se se esta lei protetiva pode ser usada ‘contra’ os interesses do consumidor, assim, por exemplo, aplicando o juiz o prazo mais exíguo de prescrição ou decadência, se é maior o da lei geral ou direito civil comum. Relembre-se aqui que o art. 7º, do próprio CDC considera este código um conjunto aberto de normas, incluindo aquelas outras normas ‘que assegurem direitos aos consumidores’, presentes em leis especiais, gerais ou em Tratados ratificados pelo Brasil, como incluídas no CDC. O espírito da lei seria tutelar, aplicando o magistrado a norma mais favorável ao consumidor (favor debilis), no caso concreto, por expressa autorização da lei especial tutelar, o CDC. Assim ensina o Min. Ari Pargendler: ‘…não se pode esquecer, que essa legislação [o CDC] veio em benefício do consumidor e deve, sempre que possível, ser interpretada de forma a beneficiar-lhe. Não me parece lógico, nem jurídico que casos como o dos autos, que envolvem a integridade física e moral da pessoa, possam, sem norma expressa nesse sentido, revogar o Código Civil, muito mais elástico em relação aos prazos do que a nova legislação…violação ao artigo 177 do Código Civil. Em relação ao art. 7º do Código do Consumidor, ausente o prequestionamento…’”.

De mais a mais, afigura-se plenamente possível a aplicação também dos princípios gerais do direito, tais como o princípio da boa-fé, da transparência, proteção ao hipossuficiente, “favoris debitoris”, bem como cabível a incidência da teoria da imprevisão e da onerosidade excessiva.

Justifica esse entendimento a vulnerabilidade característica dos clientes frente à superioridade financeira e técnica das empresas em condições de impor situações absolutamente desiguais aos seus contratantes, o que recomenda a intervenção estatal que se faz através da legislação consumerista.

A inversão do ônus da prova é a medida mais adequada ao caso concreto, assim, defiro o requerimento de inversão do ônus da prova formulado pelo reclamante no item ‘f’, da petição inicial, eis que a parte reclamante apresentou documentação mínima para demonstrar a veracidade dos fatos e de sua vulnerabilidade.

Entretanto, a inversão do ônus da prova é relativa e não absoluta, o que significa dizer que nem todos os fatos ou situações narradas será imposto a parte contrária o encargo pleno da prova, devendo a parte reclamada apresentar as provas pertinentes para a sua defesa.

Da Tutela de Urgência

No tocante ao pedido de antecipação, estabelece o artigo 300 do Código de Processo Civil que “a tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo”.

Isso equivale dizer que se tem, na fase inicial da ação, a possibilidade da parte reclamante obter decisão de mérito provisoriamente exequível, mesmo antes de cumpridos todos os trâmites do procedimento que a ensejaria em condições normais, ao final do processo.

Assim, no que diz respeito ao requisito da verossimilhan- ça da alegação, observo que há nos autos a prova inequívoca de que ocorreu o pagamento no valor de R$ 26.424,20 (p.20), assim como a prova de que ocorreu o cumprimento parcial da obrigação como dito pelo reclamante no valor de R$ 4.344,20 (p.09).

Com efeito, o autor reclamante traz aos autos o mínimo de verossimilhança exigível para comprovar suas alegações.

Quanto ao fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação, penso que também estão preenchidos os requisitos, pois, o consumidor não pode ser ainda mais lesado, considerando-se o alto valor já pago e necessidade urgente para alimentar os peixes, objetivando o seu engorde e crescimento adequado para futura venda.

Desse modo, em juízo de cognição sumária, vislumbro presentes os requisitos que autorizam a concessão da medida liminarmente pleiteada, pois há prova inequívoca que conduz à verossimilhança das alegações.

Gize-se que a empresa reclamada poderia ter adquirido ração de outra empresa para cumprir com a sua obrigação junto ao reclamante.

Recebeu uma quantia considerável em dinheiro e deixou de cumprir com sua obrigação, assumindo o risco de causar um prejuízo de difícil dimensão.

Posto isso, com fundamento no artigo 300 do Código de Processo Civil, defiro parcialmente o pedido de antecipação dos efeitos da tutela, para determinar à empresa reclamada PEIXES DA AMAZÔNIA S.A. a obrigação de fazer a entrega dos produtos de ração de peixes ao reclamante no prazo de 05 (cinco) dias.

Tratando-se de obrigação de fazer, arbitro multa diária no valor de R$ 300,00 (trezentos reais), que incidirá a contar do quinto dia após a intimação, somente no caso em que ocorra o descumprimento, ficando limitada sua incidência por até 30 dias, tudo nos termos 537 do CPC/2015.

Caso a parte reclamada desobedeça à determina- ção, mesmo com a incidência da multa fixada, após transcorridos os 30 dias de multa, os autos deverão vir conclusos para deliberação, ficando a parte reclamada advertida que poderá ocorrer a majoração, bem como incidir em outras penalidades processuais.

Defiro o requerimento do item ‘f’ formulado na petição inicial acerca da inversão do ônus da prova, devendo a parte reclamada trazer aos autos documentação pertinentes para sua defesa.

Além disso, o reclamante apresentou documentação mínima para demonstrar a veracidade dos fatos e de sua vulnerabilidade, sendo assim, a inversão do ônus da prova é a medida mais justa que se impõe.

Por fim, determino à Secretaria que proceda, no mesmo ato de intimação para cumprimento da ordem, a citação da parte reclamada, designando a audiência única de conciliação, instrução e julgamento, advertindo-se as partes acerca das consequências do não comparecimento na audiência, apresentação de documentos e comparecimento de até 03 (três) testemunhas independentemente de intimação.

Cite-se.

Cumpra-se o necessário.

Intimem-se.

Bujari-(AC), 24 de janeiro de 2017.

Luis Vitório Camolez

Juiz de Direito

Direito Agrário

Veja também:

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– ZIBETTI, Darcy; QUERUBINI, Albenir. A pesca e a aquicultura como atividade agrária segundo o direito agrário brasileiro. UMAU. 14 Congreso Mundial de Derecho Agrário: Fuentes, Política Agrária y desarrollo rural, Justicia Agrária y paz social. Enrique Napoleón Ulate Chacón (comp.). San José, Costa Rica: Editorial Jurídica Continental, 2016, pp. 385-394.

Direito Agrário

–  Aquicultura: tilápia é o peixe mais criado pela piscicultura no Brasil (Portal DireitoAgrário, 02/10/2016)

– Pesca e Aquicultura: aumenta o mercado de peixes nativos do Brasil (Portal DireitoAgrário, 27/09/2016)

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– ZIBETTI, Darcy Walmor; QUERUBINI, Albenir. O Direito Agrário brasileiro e sua relação com o agronegócio. In: Direito e Democracia – Revista de Divulgação Científica e Cultural do Isulpar. Vol. 1 – n. 1, jun./2016, disponível em: <http://www.isulpar.edu.br/revista/file/130-o-direito-agrario-brasileiro-e-a-sua-relacao-com-o-agronegocio.html>.

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