A União Brasileira de Agraristas (UBAU), por meio da sua Comissão de Crédito Rural e Financiamento do Agronegócio, realizou no dia 06 de dezembro de 2022, o Webinário Casos Práticos de Seguro Rural, contando com exposição dos advogados agraristas Frederico Buss, Guilherme Medeiros, Tobias Luz e Francisco Torma, que contou com transmissão on-line pela TV Agrarista da UBAU.
Abaixo, confira o vídeo do Webinário Casos Práticos de Seguro Rural e os apontamentos elaborados pela advogada Natália Reginatto (@reginattonatalia).
Na equipe técnica atuou a advogada Bianca Thais Nascimento.
Resumo do WEBINÁRIO: Casos práticos de Seguro Rural – por Natália Reginatto
No dia 06 de Dezembro de 2022 a Comissão Nacional de Crédito Rural e Financiamento do Agronegócio da União Brasileira dos Agraristas Universitários promoveu a transmissão de um webinar para tratar de casos práticos de seguro rural, o evento online contou com a participação especial do Dr. Francisco Torma e dos convidados Dr. Frederico Buss, Dr. Guilherme Medeiros e Dr. Tobias Luz.
Uma oportunidade para continuarmos aprendendo e discutindo os impactos da estiagem 2021/2022 e as possíveis soluções para as inúmeras demandas geradas em decorrência deste evento.
Nos últimos 5 anos, o estado do Rio Grande do Sul sofre e vem sofrendo com inúmeras intempéries climáticas.
Iniciando a conversa o Dr. Guilherme Medeiros refere que o produtor rural precisa entender que as ocorrências climáticas no em nosso estado são cíclicas. Elas podem falhar uma safra ou até duas, mas elas estão sempre presentes em nossa região e por isso o seguro rural precisa fazer parte também dos custos de produção.
Hoje a maioria dos produtores só formaliza a contratação de seguros rurais para garantir a cobertura de seus custeios agrícolas, tendo em vista que os bancos condicionam a liberação destes somente após a contratação do seguro.
Ou seja, somente para fins de pagamento, para cobrir os custos do custeio e não para além disto.
Dr. Guilherme relata ainda que os principais problemas enfrentados em seu escritório nos últimos anos dizem respeito ao tipo de solo e também ao indeferimento do seguro por conta de falha de preenchimento do famoso anexo 33 (falta de comprovação de origem da semente na cultura).
Além de casos de venda casada, onde o banco na hora de liberar o valor contratado para custeio, condiciona a liberação deste valor à contratação de um seguro de garantia em casos de intempéries climáticas.
O anexo 33 nada mais que um adendo a apólice de seguro, uma declaração de inscrição de área para produção de semente para uso próprio em determinada safra.
Nele o produtor rural deve preencher com suas informações pessoais (nome, CPF ou CNPJ, coordenadas da área, inscrição estadual – se tiver, espécie de cultura, data de plantio, quantidade de semente a ser reservada naquela safra) e declaração desde informando que está reservando a semente para utilização em determinada safra.
Nesse sentido, tanto o TJRS quanto o TJSP entendem que quando a origem do problema é climática, ou é seca, ou é enchente é irrelevante a origem da semente.
De acordo com decisões recentes, a origem da semente poderia ser levantada como hipótese para não pagamento do seguro em casos em que a seguradora faz perícia prévia, acompanhamento com técnicos, antes da contratação.
Após a contratação, na vigência do seguro, ocorrendo o problema climático, é irrelevante sua origem.
APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR
Dr. Guilherme também chama a atenção para a boa fé do produtor nestes casos pois em sua grande maioria, os produtores rurais não têm conhecimento sobre a questão da obrigatoriedade do preenchimento do anexo 33, em geral não são informados pelas seguradoras e bancos no momento da contratação.
Portanto, quando se é possível comprovar que houve a venda casada (quando o banco traz a seguradora para dentro do negócio obrigando o produtor a contratar o seguro para liberar o seu custeio), os tribunais entendem se tratar de uma relação de “consumo”.
Sendo assim, aplicável, o CDC, o qual deixa claro que a relação de seguro e segurado é uma relação de consumo, onde o produtor rural é o consumidor final e portanto irrelevante é a origem das sementes nestes casos.
Enriquecendo ainda mais a fala do Dr Guilherme, Dr. Tobias Luz, coordenador do blog diretorural.com e sócio do escritório do renomado Professor Dr. Lutero Pereira, inicia seus apontamentos relatando a diferença nas demandas de seguro rural nas regiões em que atua: Paraná e Mato Grosso do Sul.
O advogado diz ter observado que as seguradoras estão fazendo o que chamamos de “administração do passivo”, negando tudo que pode ser negado, achando “pelo em ovo”, para tentar ganhar tempo em função do prazo prescricional de uma ação de indenização de seguro agrícola ser muito curto, apenas 1 (um) ano a contar do recebimento da negativa de indenização.
Complementando sua fala, Dr. Frederico Buss, membro do corpo jurídico da Farsul, afirma que este é um dos pontos que devem ser alertados aos produtores, visto que muitos acabam perdendo este prazo buscando solucionar o problema de forma administrativa com a própria seguradora, permitindo por vezes que está apenas “arraste com a barriga” até o fim do prazo.
Além disso, Dr. Tobias diz haver pouco conhecimento prático da área por parte de alguns advogados, e o principal: “acomodação” da maioria dos produtores rurais, que mesmo sendo lesados, não buscam seus direitos e permanecem inertes, facilitando o trabalho das seguradoras.
Segundo ele, a cada 10 negativas de seguro, apenas 4 ou 5 produtores, se não muito, irão de fato buscar a via judicial e sabendo, aproveitando-se disso, as seguradoras seguem com as mesmas táticas e justificativas para negar as indenizações.
Dr. Francisco Torma e Dr. Frederico, discordam deste número, afirmando acreditar que o número de produtores que buscam a via judicial é na verade, infelizmente, ainda menor.
Outro ponto levantado por Dr. Tobias é a criatividade das seguradoras no indeferimento dos seguros, salientando existirem diversas questões, trazendo algumas delas ao nosso conhecimento.
Ele cita questões agronômicas, como a existência do risco de não cobertura sob efeitos de falha de stand (má emergência das sementes, ausência ou baixa densidade de plântulas (plantas jovens) (falhas) na linha de semeadura e atrasos de emergência).
As falhas de stand, podem ser ocasionadas por diversos fatores, tanto em casos nos quais o produtor utilizou menos sementes por linha, quanto devido a questões climáticas e fortuitas como a seca.
Na hipótese de estiagem, esta que é justamente o objeto do contrato de seguro e neste último caso, no qual o sinistro não se deu por culpa ou negligência do produtor, trata-se de um risco coberto pela apólice, não podendo ser negada a indenização.
Outra questão agronômica levantada é a de sinistro antes do primeiro trifólio.
Não são poucos os casos de produtores que acionaram sinistro no seguro agrícola devido a estiagem e tiveram seus pedidos indeferidos por uma porcentagem da área ainda não ter apresentado o primeiro trifólio quando o evento começou.
Trifólio é um dos estádios de crescimento da planta após o estádio de emergência e cotiledonar que devido a estiagem podem ter sido retardados.
Além deste, casos de plantio fora do período de zoneamento agrícola (ZARC), plantio em solo tipo 1 (solos arenosos, mais propensos aos processos erosivos, o que facilita a degradação do solo, dificulta sua fertilidade e favorece a perda de nutrientes), encontramento de solo, plantio em pó entre outros.
Frente a isso, Dr. Tobias ressalta que o advogado deve utilizar a questão do nexo de causalidade:
“Qual foi a causa preponderante deste sinistro?”
Foi a seca? Será a seca então que irá definir a questão do risco neste seguro.
Já nas questões contratuais, segundo ele, houveram casos de negativas relacionadas ao custo de produção: determinadas seguradoras alegam que o que contrataram na verdade está relacionado a custos de produção exigindo as notas do que foi gasto.
Algumas inclusive, além de glosarem inúmeras das notas, realizando o desconto dos valores, condicionam o recebimento do restante do valor a assinatura de uma carta de autorização dando quitação geral.
Daí a importância de um advogado especialista, capaz de analisar cada item da apólice do seguro, pois muitas vezes a resposta, ou melhor, a saída poderá ser encontrada na própria apólice.
No que diz respeito às questões comerciais, o advogado relata os casos de cooperativas que realizam acordos comerciais com seguradoras para atender produtores que plantam em solo tipo 1 (arenoso).
Contratos de seguro específicos para este tipo de produtor, criados pela própria seguradora e negados por ela mesma em justificativa deste.
Elencou ainda os seguintes casos:
ANTECIPAÇÃO DE DATA DE PLANTIO
Seguradoras observaram que a época do plantio do milho estava com “um pouco” atraso e então resolveu estabelecer uma data – anterior – ao Zarc (Zoneamento Agrícola de de Risco Climático).
Criando seu próprio período de zoneamento agrícola sem comunicar o produtor. Estabelecendo em suas cláusulas que o plantio só seria aceito até determinada data bem antes do período de encerramento do Zarc.
DIVERGÊNCIA DE CIDADE
Uma determinada área estava localizada exatamente na divisa de duas cidades. O seguro se localizava na cidade A e dentro do sistema do banco a propriedade se localizava na cidade B.
O vistoriador inclusive esteve na área, alegou que a área estava correta e mesmo assim a seguradora negou pode divergência de cidade.
FOTO DE SATÉLITE
A Seguradora juntou foto de satélite afirmando que o plantio havia sido feito em abril.
Neste caso específico o plantio claramente havia sido feito em março, pois o produtor possuía as fotos de satélite comprovando isso, e inclusive laudos da própria seguradora, provando que antes da data do início do plantio o vistoriador esteve na lavoura e informou a seguradora.
Por fim, conclui sua fala com o caso de uma seguradora que realizou o indeferimento afirmando que este se deu em função da constatação de que a quebra de produção se deu em patamar acentuado e muito dissonante do média de produtividade obtida na localidade e que isto somente se daria como resultado da inadequada produção da lavoura, o que conduziria frustração das expectativas originalmente criadas.
Dando continuidade o Dr. Frederico Buss relata que em seu escritório os problemas com o anexo 33 estão na 1ª posição de demandas relacionadas a seguros agrícolas neste ano, sendo o principal motivo de indeferimento das indenizações. Estes indeferimentos, segundo ele,podem se dar por dois vieses:
Primeiramente, porque o segurado teria apresentado a solicitação do anexo fora do prazo: casos em que os clientes apresentaram de fato documento, porém com cerca de 2, 3, 5 dias de atraso.
E casos de exclusão de permissão de utilização de sementes para uso próprio, reservadas, dentro da própria apólice. Onde mesmo havendo o protocolo do anexo dentro do prazo, o produtor não teria direito a indenização pois não poderia ter utilizado sementes salvas sem comunicar previamente à seguradora.
De acordo com a Instrução Normativa nº 45/2013, a declaração deve ser feita no prazo de até 45 dias após a semeadura de soja e milho. No caso de feijão e algodão, o período é de 30 dias.
Tecnicamente o produtor não precisa apresentar isso na época da contratação do seguro.
O grande problema está no fato de que invariavelmente nestes casos estas questões relativas a sementes são alertadas, são trazidas à tona pela seguradora, somente no momento do indeferimento da indenização.
Ou seja, em sua grande maioria, as seguradoras fazem mais de uma vistoria durante todo o decorrer do contrato, e inclusive ao final, não realizando nenhum apontamento neste sentido.
Outro ponto levantado por Dr. Frederico é também a questão do plantio fora do Zarc, segundo ele, as seguradoras vêm fazendo “gerenciamento de custos”.
Há casos em que a seguradora faz o seguro em 3 ou 4 talhões e glosa (indefere) 2, 3 talhões, normalmente os maiores por conta do plantio fora do período do Zarc.
Além de, casos de cancelamento de seguro: onde a seguradora envia e-mail ao corretor informando o cancelamento na fração “x” , afirmando o não plantio da cultura e enviando em seguida, cheque para devolução do valor.
No entanto, neste caso o plantio havia sido feito e por conta da estiagem, ao momento que o vistoriador foi até o local, a germinação estava em um estágio mais atrasado, fato este usado para justificar o cancelamento do seguro.
Dr. Francisco relata também casos em que a seguradora não teria sido previamente avisada da colheita e o produtor afirma ter a informado através do seu corretor, mas o vistoriador não teria aparecido.
Casos em que, para não perder a lavoura o produtor teve de dar início a colheita.
Nestas hipóteses é essencial a comprovação probatória.
E para isso é fundamental que o produtor tenha produzido laudos particulares, esteja bem orientado, que possua um engenheiro agrônomo de sua confiança durante todo período, desde a contratação do seguro, preparo, plantio e colheita da lavoura.
Um agrônomo responsável por fazer o acompanhamento da evolução destas perdas, acompanhar todas as vistorias, ler com atenção os laudos dos vistoriadores e apontar eventuais divergências caso haja. Lembrando que estas devem ser formalizadas por escrito e que para a seguradora, quanto mais informal, melhor.
Cabe ainda orientar ao produtor que melhore/formalize toda comunicação realizada com a seguradora, pois em eventual judicialização, cabe ao produtor o ônus da prova.
Assim sendo, caso o produtor não apresente uma prova robusta, poderá não conseguir provar seu dano frente ao judiciário.
E a nós advogados, agraristas, cabe orientar estes produtores rurais, desde o momento da assinatura do contrato a uma eventual ação judicial, ajudando a mitigar os riscos e prejuízos de sua atividade.
Descrição:
Webinário: Casos práticos de Seguro Rural
realizado pela Comissão Nacional de Crédito Rural e Financiamento do Agronegócio (@crfaubau) da União Brasileira dos Agraristas Universitários – UBAU (ubau.agrarismo)
Expositores:
– Dr. Francisco Torma @franciscotorma.adv @agrolei
– Dr. Frederico Buss @frederico.buss
– Dr. Guilherme Medeiros @advogadorural @wellingtonbarrosadvogados
– Dr. Tobias Luz @sallesluz
Na equipe técnica: Dra. Bianca Thais Nascimento @btnascimento_