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Direito Agrário - foto: Albenir Querubini

Análise dos artigos 11 a 13 do Projeto de Lei do Senado nº 1179/2020, que alteram temporariamente disposições referentes aos contratos agrários

por Albenir Querubini e Frederico Price Grechi.

 

O PLS nº 1179/2020, que “dispõe sobre o Regime Jurídico Emergencial e Transitório das relações jurídicas de Direito Privado (RJET) no período da pandemia do Coronavírus (Covid-19)”,  trouxe em seu Capítulo VII, disposições acerca dos contratos agrários. Pretendemos aqui realizar breve análise dos artigos 11 a 13 do Projeto de Lei nº 1179/2020, apresentado pelo Senador Antonio Anastasia, que alteram temporariamente disposições referentes aos contratos agrários, fazendo considerações técnicas e apresentando sugestões ao texto apresentado.

Conforme art. 11 do PLS nº 1179/2020, pretende-se a suspensão até 30 de outubro dos incisos IV, V e XI, alínea “b” do art. 95 da Lei nº 4.504, de 30 de novembro de 1964 (Estatuto da Terra), os quais dispõem acerca das seguintes disposições:

 (a) inciso IV do art. 95 do Estatuto da Terra – direito de preferência do arrendatário para renovação do contrato, quando existirem ofertas de terceiros interessados no respectivo imóvel agrário e prazo para resposta pelo arrendatário, que passa a ter regra transitória prevista no art. 12, incs. I e II, do respectivo PLS nº 1179/2020;

(b) inciso V do art. 95 do Estatuto da Terra – exercício do direito de retomada do imóvel cedido em arrendamento rural pelo arrendador, o qual passa a seguir a regra trazida pelo art. 12, inc. III, do PLS nº 1179/2020; e,

(c) inciso XI, alínea “b”, do Estatuto da Terra – prazos mínimos de arrendamento rural e limites de vigência para os tipos de atividades agrárias, os quais passam a observar o disposto no art. 12, inc. IV, do PLS nº 1179/2020.

Além disso, o art. 13 do PLS nº 1179/2020 traz disposição específica para a celebração de contratos de arrendamento rural com empresas nacionais cujo capital social pertença majoritariamente a pessoas naturais ou jurídicas estrangeiras.

A seguir a análise técnica dos respectivos dispositivos, partindo dos dispositivos aos quais se pretende modificar de forma temporária pelo Regime Jurídico Emergencial e Transitório das relações jurídicas de Direito Privado (RJET), no período compreendido pela pandemia do Covid-19:

 

a) Direito de preferência do arrendatário para renovação do contrato, quando existirem ofertas de terceiros interessados no respectivo imóvel agrário e prazo para resposta pelo arrendatário

Assim dispõe o Estatuto da Terra:

Art. 95. Quanto ao arrendamento rural, observar-se-ão os seguintes princípios:

(…)

IV – em igualdade de condições com estranhos, o arrendatário terá preferência à renovação do arrendamento, devendo o proprietário, até 6 (seis) meses antes do vencimento do contrato, fazer-lhe a competente notificação extrajudicial das propostas existentes. Não se verificando a notificação extrajudicial, o contrato considera-se automaticamente renovado, desde que o arrendador, nos 30 (trinta) dias seguintes, não manifeste sua desistência ou formule nova proposta, tudo mediante simples registro de suas declarações no competente Registro de Títulos e Documentos;  (Redação dada pela Lei nº 11.443, de 2007)

Proposta trazida pelo PLS nº 1179/2020:

Art. 12. Nos contratos de arrendamento rural, aplicam-se as seguintes regras:

I – em relação ao prazo de 6 (seis) meses de antecedência do vencimento do contrato para o proprietário promover a notificação extrajudicial do arrendatário sobre as propostas existentes nos termos do inciso IV do art. 95 da Lei nº 4.504, de 30 de dezembro de 1964, se a data máxima dessa notificação ocorrer até 1º de outubro de 2020, o proprietário poderá realizar essa notificação até 30 de outubro de 2020, caso em que o arrendatário terá seis meses para exercer o seu direito de preferência e caso em que o contrato de arrendamento seguirá em vigor durante esse prazo;

II – se a data de vencimento do contrato de arrendamento expirar até 1º de outubro de 2020, o prazo de 30 (trinta) dias previsto no IV do art. 95 da Lei nº 4.504, de 30 de dezembro de 1964, para o arrendatário manifestar seu desinteresse pela prorrogação do contrato passa a correr a partir de 30 de outubro de 2020;

A respectiva proposta de modificação transitória do art. 95, inc. IV, do Estatuto da Terra apresenta-se razoável, pois a lei exige a observância de forma solene de comunicação da existência de ofertas de terceiro por meio de notificação extrajudicial, a qual se dá por meio de Registro de Títulos e Documentos. Nesse sentido, os arrendadores poderiam ser prejudicados tanto pelas medidas de isolamento social determinadas pelo Poder Público, bem como ter dificultada a realização da forma legal em razão das restrições de funcionamento dos Cartórios e Registros Públicos, o que poderia acarretar como consequência a renovação automática dos contratos de arrendamento rural.

De igual forma, o prazo de resposta do arrendatário, que eventualmente tenha sido notificado de propostas antes da pandemia, também poderia ser prejudicado, ao deixar de realizar a contraoferta no prazo legal (30 dias), o que caracterizaria hipótese de extinção do contrato de arrendamento, com a obrigação de devolução do imóvel agrários ao final do prazo contratual, sob pena de sobre o ajuizamento de ação de despejo.

b) Exercício do direito de retomada do imóvel              

Assim consta no Estatuto da Terra:

Art. 95. Quanto ao arrendamento rural, observar-se-ão os seguintes princípios:

(…)

 V – os direitos assegurados no inciso IV do caput deste artigo não prevalecerão se, no prazo de 6 (seis) meses antes do vencimento do contrato, o proprietário, por via de notificação extrajudicial, declarar sua intenção de retomar o imóvel para explorá-lo diretamente ou por intermédio de descendente seu;   (Redação dada pela Lei nº 11.443, de 2007).

Proposta trazida pelo PLS nº 1179/2020:

Art. 12. Nos contratos de arrendamento rural, aplicam-se as seguintes regras:

(…)

III – em relação ao prazo de 6 (seis) meses de antecedência do vencimento do contrato para o proprietário promover a notificação extrajudicial do arrendatário sobre seu interesse em retomar o imóvel para exploração por si ou por seu descendente nos termos do inciso V do art. 95 da Lei nº 4.504, de 30 de dezembro de 1964, se a data máxima dessa notificação ocorrer até 30 de outubro de 2020, o proprietário poderá realizar essa notificação até 30 de outubro de 2020, caso em que o contrato de arrendamento seguirá em vigor por mais seis meses dessa data;

No mesmo sentido da disposição analisada anteriormente, a proposta de alteração de suspensão dos prazos é medida razoável para assegurar o exercício de direito de preferência pelo arrendador, uma que a lei também traz forma solene a ser observada para garantir a validade da notificação premonitória, via Cartório de Títulos e Documentos, a ser entregue ao arrendatário, sob pena de renovação automática do contrato.

No entanto, cumpre observar que a previsão constante na parte final, ao dispor que prevê a possibilidade de prorrogar a vigência do contrato por mais seis meses, a contar de 30 de outubro de 2020, não parece acertada, posto que as normas de Direito Agrário devem sempre ser interpretadas levando em conta o início e o fim das safras. Nesse caso, vale lembrar que já existe regra contida na 2ª parte do inc. I do art. 95 do Estatuto da Terra, dispondo que “no caso de retardamento da colheita por motivo de força maior, considerar-se-ão esses prazos prorrogados nas mesmas condições, até sua ultimação”.

Desta forma, sugere-se que seja retirada da redação do inc. III do art. 12 do PLS nº 1179/2020 a parte final, nos seguintes termos:

III – em relação ao prazo de 6 (seis) meses de antecedência do vencimento do contrato para o proprietário promover a notificação extrajudicial do arrendatário sobre seu interesse em retomar o imóvel para exploração por si ou por seu descendente nos termos do inciso V do art. 95 da Lei nº 4.504, de 30 de dezembro de 1964, se a data máxima dessa notificação ocorrer até 30 de outubro de 2020, o proprietário poderá realizar essa notificação até 30 de outubro de 2020;

c) Prazos mínimos de arrendamento rural e limites de vigência para os tipos de atividades agrárias

Acerca da respectiva disposição, assim prevê o Estatuto da Terra:

Art. 95. Quanto ao arrendamento rural, observar-se-ão os seguintes princípios:

(…)

 XI – na regulamentação desta Lei, serão complementadas as seguintes condições que, obrigatoriamente, constarão dos contratos de arrendamento:

(…)

b) prazos mínimos de arrendamento e limites de vigência para os vários tipos de atividades agrícolas;  (Redação dada pela Lei nº 11.443, de 2007).

A regulamentação do referido dispositivo legal é dada pelas seguintes disposições do Decreto nº 59.566, de 14 de novembro de 1966, que assim prevê:

Art 13. Nos contratos agrários, qualquer que seja a sua forma, contarão obrigatoriamente, clausulas que assegurem a conservação dos recursos naturais e a proteção social e econômica dos arrendatários e dos parceiros-outorgados a saber (Art. 13, incisos III e V da Lei nº 4.947-66);

(…)

II – Observância das seguintes normas, visando a conservação dos recursos naturais:

a) prazos mínimos, na forma da alínea ” b“, do inciso XI, do art. 95 e da alínea ” b “, do inciso V, do art. 96 do Estatuto da Terra:

– de 3 (três), anos nos casos de arrendamento em que ocorra atividade de exploração de lavoura temporária e ou de pecuária de pequeno e médio porte; ou em todos os casos de parceria;

– de 5 (cinco), anos nos casos de arrendamento em que ocorra atividade de exploração de lavoura permanente e ou de pecuária de grande porte para cria, recria, engorda ou extração de matérias primas de origem animal;

– de 7 (sete), anos nos casos em que ocorra atividade de exploração florestal;

Por sua vez, o PLS nº 1179/2020 pretende a seguinte modificação:

Art. 12. Nos contratos de arrendamento rural, aplicam-se as seguintes regras:

(…)

IV – se o prazo do contrato de arrendamento rural ou dos limites de vigência para os vários tipos de cultura expirar antes de 30 de outubro de 2020, presume-se a prorrogação até essa data.

Nesse ponto, entende-se que a respectiva modificação parece ser desnecessária, posto que, conforme analisado anteriormente, as normas de Direito Agrário, ao estabelecerem prazos mínimos, levam em conta os ciclos culturais (início e o fim das safras ou da criação dos animais), além de que já existe regra contida na 2ª parte do inc. I do art. 95 do Estatuto da Terra dispondo que “no caso de retardamento da colheita por motivo de força maior, considerar-se-ão esses prazos prorrogados nas mesmas condições, até sua ultimação”.

Assim sendo, sugere-se a retirada do inc. IV do art. 12 do PLS nº 1179/2020, o que implica também na modificação do caput do art. 11 do PLS nº 1179/2020, o qual passaria a ter a seguinte redação:

Art. 11. Os incisos IV e V do art. 95 da Lei nº 4.504, de 30 de novembro de 1964, têm sua aplicação suspensa até 30 de outubro de 2020.

 

d) celebração de contratos de arrendamento rural com empresas nacionais cujo capital social pertença majoritariamente a pessoas naturais ou jurídicas estrangeiras

 

Por fim, cumpre analisar o art. 13 do PLS nº 1179/2020, que prevê o seguinte:

Art. 13. Fica suspensa, até 30 de outubro de 2020, a proibição de celebração de contratos de arrendamento com empresas nacionais cujo capital social pertença majoritariamente a pessoas naturais ou jurídicas estrangeiras, nos termos da Lei nº 5.709, de 7 de outubro de 1971.

A medida de proibição da celebração de contratos de arrendamento rural com empresas nacionais cujo capital social pertença majoritariamente a pessoas naturais ou jurídicas estrangeiras trata-se de inovação legislativa[1].

 Ademais, cumpre observar que não constam quaisquer explicações a respeito da sua motivação na Justificação do PLS nº 1179/202, o que leva a entender se enquadrar na ideia de  proteção (em viés lato sensu) de proteção de vulneráveis, que no caso se presume ser as empresas nacionais em face das desvantagens decorrentes da crise econômica em face do capital estrangeiro, em especial pela desvalorização do real em face do dólar e outras moedas estrangeiras.

Nesse sentido, sugere-se ao Relator do PLS nº 1179/202, Senador Anastasia, que encaminhe justificação complementar explicando a motivação da inserção do art. 13, enquanto medida relacionada à proposta do Regime Jurídico Emergencial e Transitório das relações jurídicas de Direito Privado.

Nota:

[1] Em âmbito infraconstitucional a matéria é regulada pela Instrução Normativa INCRA nº 94, de 17 de dezembro de 2018, que dispõe sobre a aquisição e o arrendamento de imóvel rural por pessoa natural estrangeira residente no País, pessoa jurídica estrangeira autorizada a funcionar no Brasil e pessoa jurídica brasileira equiparada à estrangeira e dá outras providências.

Albenir Querubini – Mestre em Direito pela UFRGS. Membro da União Mundial dos Agraristas Universitário (UMAU) e da União Brasileira dos Agraristas Universitários (UBAU). Professor.
Frederico Price Grechi – Mestre, Doutor e Pós-Doutor pela UERJ. Diretor de Assuntos Jurídicos e legislativos da SNA. Advogado e Professor.

Direito Agrário

Abaixo, vídeo gravado pela advogada agrarista Andréia Ribeiro:

Direito Agrário

*Nota de atualização:

– Na votação do Projeto de Lei do Senado nº 1179/2020 – que dispõe sobre Regime Jurídico Emergencial e Transitório das relações jurídicas de Direito Privado (RJET) no período da pandemia do Coronavírus (Covid-19), ocorrida no dia 03/04/2020, foram retiradas as disposições referentes aos contratos agrários (artigos 11 a 13).

Confira o parecer aprovado: Clicando aqui.

 

Veja também:

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Direito Agrário

Conheça o texto inicial do PLS 1179/2020:

 

PROJETO DE LEI Nº 1179, DE 2020

Dispõe sobre o Regime Jurídico Emergencial e Transitório das relações jurídicas de Direito Privado (RJET) no período da pandemia do Coronavírus (Covid-19).

O CONGRESSO NACIONAL decreta:

CAPÍTULO I
Disposições Gerais

Art. 1  Esta Lei institui normas de caráter transitório e emergencial para a regulação de relações jurídicas de Direito Privado no período da pandemia do Coronavírus (Covid-19).

Parágrafo único. Para os fins desta Lei, considera-se 20 de março de 2020, data da publicação do Decreto Legislativo nº 6, como termo inicial dos eventos derivados da pandemia do coronavírus (Covid-19).

Art. 2º A suspensão da aplicação de normas referidas nesta Lei não implica sua revogação ou alteração.

CAPÍTULO II
Da Prescrição e Decadência

Art. 3º Os prazos prescricionais consideram-se impedidos ou suspensos, conforme o caso, a partir da vigência desta Lei até 30 de outubro de 2020.

§ 1° As hipóteses específicas de impedimento, suspensão e interrupção dos prazos prescricionais previstas no ordenamento jurídico nacional prevalecem sobre o impedimento ou a suspensão determinados no caput.

§ 2° Caso seja superado o impedimento, a suspensão ou a interrupção dos prazos prescricionais tratados no § 1°, aplica-se o disposto no caput deste artigo.

§ 3° Aplicam-se as regras deste artigo ao disposto no art. 207 do Código Civil.

CAPÍTULO III
Das Pessoas Jurídicas de Direito Privado

Art. 4º As pessoas jurídicas de direito privado, referidas nos incisos I a IV do art. 44 do Código Civil, deverão observar as restrições à realização de reuniões e assembleias presenciais durante a vigência desta Lei, observadas as determinações sanitárias das autoridades locais.

Art. 5º A assembleia geral, inclusive para os fins do art. 59 do Código Civil, poderá ser realizada por meios eletrônicos.

Parágrafo único. A manifestação de participantes poderá ocorrer por qualquer meio eletrônico indicado pelo administrador e produzirá todos os efeitos legais de uma assinatura presencial.

 

CAPÍTULO IV
Da Resilição, Resolução e Revisão dos Contratos

Art. 6º As consequências decorrentes da pandemia do Coronavírus (Covid-19) nas execuções dos contratos, incluídas as previstas no art. 393 do Código Civil, não terão efeitos jurídicos retroativos.

Art. 7º Não se consideram fatos imprevisíveis, para os fins exclusivos dos art. 478, 479 e 480 do Código Civil, o aumento da inflação, a variação cambial, a desvalorização ou substituição do padrão monetário.

§1° As regras sobre revisão contratual previstas no Código de Defesa do Consumidor e na Lei nº 8.245, de 18 de outubro de 1991 não se sujeitam ao disposto no caput deste artigo.

§ 2° Para os fins desta Lei, as normas de proteção ao consumidor não se aplicam às relações contratuais subordinadas ao Código Civil, incluindo aquelas estabelecidas exclusivamente entre empresas ou empresários.

 

CAPÍTULO V
Das Relações de Consumo

Art. 8º Até 30 de outubro de 2020, fica suspensa a aplicação do art. 49 do Código de Defesa do Consumidor na hipótese de produto ou serviço adquirido por entrega domiciliar (delivery).

CAPÍTULO VI
Das Locações de Imóveis Urbanos

Art. 9º Não se concederá liminar para desocupação de imóvel urbano nas ações de despejo, a que se refere o art. 59 da Lei nº 8.245, de 18 de outubro de 1991, até 31 de dezembro de 2020.

§ 1° O disposto no caput deste artigo aplica-se apenas às ações ajuizadas a partir de 20 de março de 2020.

§ 2° É assegurado o direito de retomada do imóvel nas hipóteses previstas no art. 47, incisos I, II, III e IV da Lei nº 8.245, de 18 de outubro de 1991, não se aplicando a tais hipóteses as restrições do caput.

Art. 10. Os locatários residenciais que sofrerem alteração econômico-financeira, decorrente de demissão, redução de carga horária ou diminuição de remuneração, poderão suspender, total ou parcialmente, o pagamento dos alugueres vencíveis a partir de 20 de março de 2020 até 30 de outubro de 2020.

§ 1° Na hipótese de exercício da suspensão do pagamento de que trata o caput, os alugueres vencidos deverão ser pagos parceladamente, a partir de 30 de outubro de 2020, na data do vencimento, somando-se à prestação dos alugueres vincendos o percentual mensal de 20% dos
alugueres vencidos.

§ 2° Os locatários deverão comunicar aos locadores o exercício da suspensão previsto no caput.

§ 3º A comunicação prevista no § 2º poderá ser realizada por qualquer ato que possa ser objeto de prova lícita.

 

CAPÍTULO VII
Dos Contratos Agrários

Art. 11. Os incisos IV, V e XI, alínea “b” do art. 95 da Lei nº 4.504, de 30 de novembro de 1964, têm sua aplicação suspensa até 30 de outubro de 2020.

Art. 12. Nos contratos de arrendamento rural, aplicam-se as seguintes regras:

I – em relação ao prazo de 6 (seis) meses de antecedência do vencimento do contrato para o proprietário promover a notificação extrajudicial do arrendatário sobre as propostas existentes nos termos do inciso IV do art. 95 da Lei nº 4.504, de 30 de dezembro de 1964, se a data máxima dessa notificação ocorrer até 1º de outubro de 2020, o proprietário poderá realizar essa notificação até 30 de outubro de 2020, caso em que o arrendatário terá seis meses para exercer o seu direito de preferência e caso em que o contrato de arrendamento seguirá em vigor durante esse prazo;

II – se a data de vencimento do contrato de arrendamento expirar até 1º de outubro de 2020, o prazo de 30 (trinta) dias previsto no IV do art. 95 da Lei nº 4.504, de 30 de dezembro de 1964, para o arrendatário manifestar seu desinteresse pela prorrogação do contrato passa a correr a partir de 30 de outubro de 2020;

III – em relação ao prazo de 6 (seis) meses de antecedência do vencimento do contrato para o proprietário promover a notificação extrajudicial do arrendatário sobre seu interesse em retomar o imóvel para exploração por si ou por seu descendente nos termos do inciso V do art. 95 da Lei nº 4.504, de 30 de dezembro de 1964, se a data máxima dessa notificação ocorrer até 30 de outubro de 2020, o proprietário poderá realizar essa notificação até 30 de outubro de 2020, caso em que o contrato de arrendamento seguirá em vigor por mais seis meses dessa data;

IV – se o prazo do contrato de arrendamento rural ou dos limites de vigência para os vários tipos de cultura expirar antes de 30 de outubro de 2020, presume-se a prorrogação até essa data.

Art. 13. Fica suspensa, até 30 de outubro de 2020, a proibição de celebração de contratos de arrendamento com empresas nacionais cujo capital social pertença majoritariamente a pessoas naturais ou jurídicas estrangeiras, nos termos da Lei nº 5.709, de 7 de outubro de 1971.

CAPÍTULO VIII
Da Usucapião

Art. 14. Suspendem-se os prazos de aquisição para a propriedade imobiliária ou mobiliária, nas diversas espécies de usucapião, até 30 de outubro de 2020.

 

CAPÍTULO IX

Dos Condomínios Edilícios

Art. 15. Em caráter emergencial, além dos poderes conferidos ao síndico pelo art. 1.348 do Código Civil, compete-lhe:

I – restringir a utilização das áreas comuns para evitar a contaminação do Coronavírus (Covid-19), respeitado o acesso à propriedade exclusiva dos condôminos;

II – restringir ou proibir a realização de reuniões, festividades, uso dos abrigos de veículos por terceiros, inclusive nas áreas de propriedade exclusiva dos condôminos, como medida provisoriamente necessária para evitar a propagação do Coronavírus (Covid-19), vedada qualquer restrição ao uso exclusivo pelos condôminos e pelo possuidor direto de cada unidade.

Parágrafo único. Não se aplicam as restrições e proibições contidas neste artigo para casos de atendimento médico, obras de natureza estrutural ou a realização de benfeitorias necessárias.

Art. 16. A assembleia condominial, inclusive para os fins dos arts. 1.349 e 1.350 do Código Civil, e a respectiva votação poderão ocorrer, em caráter emergencial, por meios virtuais, caso em que a manifestação de vontade de cada condômino por esse meio será equiparada, para todos os efeitos jurídicos, à sua assinatura presencial.

Art. 17. É obrigatória, sob pena de destituição do síndico, a prestação de contas regular de seus atos de administração.

 

CAPÍTULO X
DO REGIME SOCIETÁRIO
Seção I
Dilação de assembleias e reuniões

Art. 18. Todos os prazos legais para a realização de assembleias e reuniões de quaisquer órgãos, presenciais ou não, e para a divulgação ou
arquivamento nos órgãos competentes das demonstrações financeiras pelas pessoas físicas ou jurídicas que exerçam atividade empresarial, ficam prorrogados até 30 de outubro de 2020.

Parágrafo único. A Comissão de Valores Mobiliários, no exercício da sua competência, regulamentará os demais prazos aplicáveis às companhias abertas.

Seção II
Assembleias e reuniões externas ou virtuais

Art. 19. As assembleias e reuniões referidas no art. 17 poder-se-ão realizar de forma remota, com a possibilidade de participação e votação virtual, por meio da rede mundial de computadores (internet).

§ 1º Caso admitido pelas autoridades sanitárias locais, em caráter alternativo, os atos referidos no caput poderão ocorrer presencialmente em locais diversos dos determinados pela legislação em vigor, desde que se dê ciência aos participantes e que tais atos ocorram no município da sede social da pessoa jurídica.

§ 2° Caberá à Comissão de Valores Mobiliários, no caso das companhias abertas, e ao Departamento Nacional de Registro Empresarial e Integração, para as demais sociedades, empresárias ou não, regulamentar a realização de assembleias e reuniões remotas, sempre visando à ampliação do exercício de direitos e proteções aos sócios ou acionistas.

§ 3° O disposto neste artigo será observado, no que for compatível, pelas demais pessoas jurídicas de direito privado.

Seção III
Distribuição de lucros, dividendos e resultados

Art. 20. Os dividendos e outros proventos, ainda que sobre o lucro constante de balanço levantado ao final de exercícios encerrados, mas ainda não aprovados pelos sócios ou acionistas das sociedades, conforme o caso, poderão ser declarados durante o exercício social de 2020 pelo Conselho de Administração independentemente de previsão estatutária ou contratual.

Parágrafo único. Quando não houver Conselho de Administração, a Diretoria da sociedade assumirá a competência prevista no caput deste artigo.

 

CAPÍTULO XI
DO REGIME CONCORRENCIAL

Art. 21. Fica suspensa até 31 de outubro de 2020 a aplicação dos incisos XV e XVII do § 3º do art. 36 e do inciso IV do art. 90 da Lei nº 12.529, de 30 de novembro de 2011.

Parágrafo único. As demais infrações previstas no art. 36 da Lei nº 12.529, de 30 de novembro de 2011, quando apreciadas pelo órgão competente, se praticadas a partir de 20 de março de 2020, deverão considerar as circunstâncias extraordinárias decorrentes da pandemia do Coronavírus (Covid-19).

 

CAPÍTULO XII
Do Direito de Família e Sucessões

Art. 22. A prisão civil por dívida alimentícia, prevista no art. 528, § 3º e seguintes do Código de Processo Civil, deverá ser cumprida exclusivamente sob a modalidade domiciliar, sem prejuízo da exigibilidade das respectivas obrigações.

Art. 23. O prazo do art. 611 do Código de Processo Civil para sucessões abertas a partir de 1º de fevereiro de 2020 terá seu termo inicial
dilatado para 30 de outubro de 2020.

Parágrafo único. O prazo de 12 meses do art. 611 do Código de Processo Civil, para que seja ultimado o processo de inventário e de partilha, caso iniciado antes de 1º de fevereiro de 2020, ficará suspenso a partir da vigência desta Lei até 30 de outubro de 2020.

DISPOSIÇÕES FINAIS

Art. 24. Fica suspensa até 30 de outubro de 2020 a aplicação do art. 100 da Lei nº 9.503, de 23 de setembro de 1997.

Art. 25. O art. 65 da Lei nº 13.709, de 14 de agosto de 2018, passa a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 65. …………………………………..…………………………………………………
II – 36 (trinta e seis) meses após a data de sua publicação,
quanto aos demais artigos.”

Art. 26. Esta Lei entrará em vigor na data de sua publicação.

JUSTIFICAÇÃO

As dramáticas consequências da pandemia do Coronavírus (Covid-19) já se fazem sentir na economia e na sociedade brasileiras, ao exemplo do que ocorre em mais de uma centena de países.

Algumas medidas legislativas têm sido aprovadas nos últimos dias nos parlamentos dos Estados Unidos da América, da República Federal da Alemanha e do Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte, abrangendo diversas áreas do Direito. A ênfase de algumas dessas medidas emergenciais, como as aprovadas pelo Parlamento alemão, dá-se em setores do Direito Privado, de modo a preservar as relações jurídicas e proteger os vulneráveis.

O presente Projeto de Lei insere-se nesse conjunto de iniciativas que os Parlamentos estão convertendo em regras jurídicas nos últimos dias.

O projeto baseia-se em alguns princípios: (1) manter a separação entre relações paritéticas (de Direito Civil e de Direito Comercial) e relações assimétricas (de Direito do Consumidor e das Locações Prediais Urbanas); (2) não alterar as leis vigentes, dado o caráter emergencial da crise gerada pela pandemia, mas apenas criar regras transitórias que, em alguns casos, suspendam temporariamente a aplicação de dispositivos dos códigos e leis extravagantes; (3) limitar-se a matérias preponderantemente privadas, deixando questões tributárias e administrativas para outros projetos; (4) as matérias de natureza falimentar e recuperacional foram deixadas no âmbito de projetos já em tramitação no Congresso Nacional.

Em linhas gerais, o projeto estabelece que:

(i) Os prazos prescricionais e decadenciais estão impedidos ou suspensos.

(ii) Atos associativos, como reuniões de colegiados e assembleias, poder-se-ão realizar por meio remoto.

(iii) Os efeitos da pandemia equivalem ao caso fortuito ou de força maior, mas não se aproveitam a obrigações vencidas antes do reconhecimento da pandemia.

(iv) Os despejos de imóveis prediais ficam suspensos até 31 de dezembro de 2020, mas não se liberam os inquilinos de pagar os alugueis, embora se possa diferir seu adimplemento em caso de perda de renda por desemprego. É possível o locador retomar o imóvel para uso próprio ou de seus familiares.

(v) Flexibilizam-se regras de contratos agrários, mas se impede a contagem de tempo para usucapião durante a pandemia.

(vi) Criam-se restrições temporárias de acesso e de obras em condomínios edilícios, ao tempo em que se admite a realização de assembleias virtuais.

(vii) Assembleias e reuniões em sociedades comerciais podem ser virtuais. Os dividendos e outros proventos poderão ser antecipados.

(viii) Algumas sanções por práticas anticoncorrenciais ficam suspensas, a fim de atender às necessidades da escassez de serviços e produtos. Cria-se um parâmetro para que, no futuro, certas práticas sejam desconsideradas como ilícitas em razão da natureza crítica do período da pandemia.

(ix) Regras específicas são adotadas emergencialmente para prisão civil de devedor de alimentos e para início do prazo de abertura e de conclusão de inventários.

(x) A vigência da Lei Geral de Proteção de Dados é postergada por mais 18 meses, de modo a não onerar as empresas em face das enormes dificuldades técnicas econômicas advindas da pandemia.

Este projeto de lei contou com o auxílio de ilustres professores de Direito Civil, Direito Comercial e Direito Processual, e juristas como Fernando Campos Scaff, Paula Forgioni, Marcelo von Adamek e Francisco Satyro, da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, da Universidade de São Paulo; José Manoel de Arruda Alvim Netto, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo; Rodrigo Xavier Leonardo, da Universidade Federal do Paraná, e Rafael Peteffi da Silva, da Universidade Federal de Santa Catarina, além dos advogados Roberta Rangel e Gabriel Nogueira Dias.

A iniciativa desse projeto deve-se à incansável preocupação do presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Dias Toffoli, com os severos efeitos econômicos e sociais da pandemia do Coronavírus (Convid19), que liderou sua formulação, tendo a coordenação técnica do ministro Antonio Carlos Ferreira, do Superior Tribunal de Justiça, e do Conselheiro Nacional do Ministério Público e professor Otavio Luiz Rodrigues Jr., docente de Direito Civil do Largo de São Francisco, da Universidade de São Paulo.

Algumas das normas contidas neste projeto serão apresentadas pelo Min. Dias Toffoli ao Conselho Nacional de Justiça, sob a forma de recomendação aos magistrados brasileiros. Permanecerá, contudo, a necessidade de uma alteração legislativa, que terá efeitos gerais e vinculantes para toda a população brasileira.

A inspiração para este projeto, a qual compartilhamos com o Min. Dias Toffoli, o Min. Antonio Carlos Ferreira e o Professor Otavio Rodrigues, foi a célebre Lei Faillot, de 21 de janeiro de 1918, que foi apresentada pelo deputado que lhe deu nome. A Lei Faillot criou regras
excepcionais para a aplicação da teoria da imprevisão no Direito francês.

Hoje, tanto o Código Civil quanto o Código de Defesa do Consumidor, possuem regras adequadas para resolver ou revisar contratos por imprevisão, no primeiro caso, e onerosidade excessiva, no segundo diploma. É preciso agora conter os excessos em nome da ocorrência do caso fortuito e da força maior, mas também permitir que segmentos vulneráveis como os locatários urbanos não sofram restrições ao direito à moradia.

O projeto de lei chega, assim, a um adequado equilíbrio de posições em áreas extremamente complexas e de difícil ponderação entre interesses. Diante do exposto, conclamamos os nobres Pares a aderirem à aprovação desta proposição com a maior celeridade possível.

Sala das Sessões,
Senador ANTONIO ANASTASIA

 

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