Uma empresa de manipulação e comércio de insumos agrícolas de Toledo (PR) terá que pagar R$ 24 mil de multa por infringir as regras de produção e armazenamento de sementes de cultivares (espécies de plantas melhoradas) de soja, estabelecidas pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa). A decisão foi proferida pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) na última semana.
A multa, que será paga pela empresa de forma corrigida, foi imposta pelo Mapa em 2012. Na ocasião, o órgão regulador acusou a empresa Herbioeste Herbicidas de armazenar 12 toneladas de sementes de cultivares de soja contendo variedades de outras cultivares não declaradas acima do limite aceito.
Após ser notificado da sanção, o estabelecimento ingressou com processo para anular a cobrança e alegou não ter cometido nenhum ato ilícito, uma vez que as sementes condenadas foram completamente descartadas do plantio.
A Justiça Federal de Toledo julgou a ação improcedente e a empresa recorreu contra a decisão. No entanto, por unanimidade, a 4ª Turma do TRF4 decidiu manter a sentença por entender que houve conduta ilícita por parte da autora.
O relator do processo, desembargador federal Luís Alberto d’Azevedo Aurvalle, concluiu que “as irregularidades na produção de sementes descritas no auto de infração que inaugurou o processo administrativo sujeitam o infrator a penalidade de multa”.
As cultivares são espécies de plantas melhoradas devido à alteração ou introdução de uma característica que antes não possuíam. Elas se distinguem das outras variedades da mesma espécie por sua homogeneidade, estabilidade e novidade. Plantas cultivares não são obrigatoriamente transgênicas.
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5000096-88.2014.4.04.7016/PR
RELATOR
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LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE
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APELANTE
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HERBIOESTE HERBICIDAS LTDA
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ADVOGADO
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Norton Emmel Mühlbeier
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APELANTE
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UNIÃO – ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO
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APELADO
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OS MESMOS
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UNIDADE EXTERNA
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Agência TOLEDO, PR
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MARCIO AURELIO REOLON
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LIDIANE DA SILVA FERNANDES
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MARCIA ANGELICA MITIKO TANIZAWA ZULIAN
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RELATÓRIO
Trata-se de ação ordinária ajuizada por HERBIOESTE HERBICIDAS LTDA contra a UNIÃO, objetivando a nulidade de auto de infração lavrado pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) em seu desfavor, e, consequentemente, a inexigibilidade do crédito tributário.
Narra que foi autuada por infração aos artigos 41 e 177, XI, do Regulamento da Lei nº 10.711/03, aprovado pelo Decreto nº 5.153/2004 por produzir e armazenar sementes de soja cultivar Don Mário 5.8i, lote n. Sj-771, categoria C1, Safra 2011/2012, contendo sementes de outras cultivares além dos limites estabelecidos pela legislação. Alega que não houve transgressão, uma vez que não ocorreu mistura varietal conforme laudo emitido por laboratório credenciado pelo MAPA, e que as sementes supostamente contaminadas com mistura varietal foram descartadas e vendidas como grão comercial. Sustenta, assim, não ter havido conduta ilícita ante a não comercialização das sementes de soja supostamente fora dos padrões estabelecidos pela Instrução Normativa nº 25/2005 com produtores, bem como que a multa aplicada é indevida.
Processado o feito, sobreveio sentença de improcedência. O autor foi condenado ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, fixados em R$ 500,00 (quinhentos reais), com fundamnto no artigo 20, §§ 3º e 4º, do CPC/1973).
Inconformada, apela a autora. Repisa argumentos da inicial. Assevera que, conforme laudo emitido pelo Laboratório da Associação Paranaense dos Produtores de Sementes e Mudas (APASEM), também credenciado no MAPA, a produção do lote de sementes cultivar Don Mario 5.8i foi realizada de acordo com as normas e padrões de certificação. Defende a insubsistência de auto de infração baseado tão somente em boletim oriundo do Laboratório Oficial de Análises de Sementes do MAPA, que considerou a soja fora dos padrões.
A União apresentou recurso adesivo. Busca a majoração da verba honorária.
Com contrarrazões, vieram os autos.
VOTO
A Lei nº 10.711/03, que dispõe sobre o Sistema Nacional de Sementes e Mudas e dá outras providências, instituiu um rigoroso controle de produção e comercialização de sementes e mudas, a fim de garantir a identidade e qualidade do material. Estabelece também vedações à utilização de sementes e mudas que não atendam às exigências do diploma legal.
Quanto às proibições, restam assim consignadas:
Art. 41. Ficam proibidos a produção, o beneficiamento, o armazenamento, a análise, o comércio, o transporte e a utilização de sementes e mudas em desacordo com o estabelecido nesta Lei e em sua regulamentação.
Parágrafo único. A classificação das infrações desta Lei e as respectivas penalidades serão disciplinadas no regulamento.
Art. 42. No ato da ação fiscal serão adotadas como medidas cautelares, conforme dispuser o regulamento desta Lei:
I – suspensão da comercialização; ou
II – interdição de estabelecimento.
Art. 43. Sem prejuízo da responsabilidade penal e civil cabível, a inobservância das disposições desta Lei sujeita as pessoas físicas e jurídicas, referidas no art. 8o, às seguintes penalidades, isolada ou cumulativamente, conforme dispuser o regulamento desta Lei:
I – advertência;
II – multa pecuniária;
III – apreensão das sementes ou mudas;
IV – condenação das sementes ou mudas;
V – suspensão da inscrição no Renasem;
VI – cassação da inscrição no Renasem.
Parágrafo único. A multa pecuniária será de valor equivalente a até 250% (duzentos e cinqüenta por cento) do valor comercial do produto fiscalizado, quando incidir sobre a produção, beneficiamento ou comercialização.
Com efeito, o Decreto nº 5.153/2004, regulamentando a referida Lei, estabelece criterioso procedimento para análise das sementes ou mudas produzidas.
No caso em tela, a autora busca a declaração de nulidade do auto de infração nº 004/1349/PR/2012, no qual foi autuada por produzir e armazenar sementes de soja cultivar Don Mário 5.8i, lote Sj-771, categoria C1, safra 2011/2012, contendo sementes de outros cultivares além dos limites estabelecidos. Ocorre que, havendo discordância do resultado da análise procedida por laboratórios especiais, é facultado ao interessado solicitar a reanálise do atributo que apresentou valores fora do padrão (artigos 85 e 86, do Decreto nº 5.153/2004).
Todavia, alega a autora que não foi possível proceder à reanálise do lote de sementes coletado ante o descarte do material vendido como grão comercial. Sendo este o meio cabível para ilidir conclusão de laudo desfavorável, entendo que a autora não logrou desconstituir a prova produzida nos autos administrativos.
No tocante à multa aplicada, assim disciplina o artigo 199 do Decreto nº 5.153/2004:
Art. 198. A pena de multa será aplicada nas demais infrações que não estão previstas no art. 197.
Parágrafo único. Em caso de reincidência genérica, o valor da multa será cobrado em dobro.
Art. 199. A pena de multa será de valor equivalente a até duzentos e cinqüenta por cento do valor comercial do produto fiscalizado, quando incidir sobre a produção, o beneficiamento ou a comercialização, e graduada de acordo com a gravidade da infração, na seguinte forma:
I – até quarenta por cento do valor comercial do produto, quando se tratar de infração de natureza leve;
II – de quarenta e um por cento a oitenta por cento do valor comercial do produto, quando se tratar de infração de natureza grave; ou
III – de oitenta e um por cento a cento e vinte e cinco por cento do valor comercial do produto, quando se tratar de infração de natureza gravíssima.
Examinando os referidos dispositivos, extrai-se que as práticas descritas no auto de infração que inaugurou o processo administrativo sujeitam o infrator a penalidade de multa. Quanto ao valor da penalidade, entendo que a multa aplicada pela autoridade administrativa não extrapola o limite legal.
Ademais, agrego às razões de decidir deste voto o entendimento adotado pelo magistrado de primeiro grau, Dr. Fábio Nunes de Martino, uma vez que acertada a fundamentação, assim vertida:
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A autora foi autuada por agente do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento mediante o Auto de Infração nº 004/1349/PR/2012, com aplicação de multa, em razão da seguinte conduta:
‘1) Produzir e armazenar 12.000 kilogramas de sementes de soja, cultivar Don Mário 5.8 i, lote ST-771, categoria C1, safra 2011/2012, contendo sementes de outras cultivares além dos limites estabelecidos, conforme Boletim Oficial de Análise de Sementes nº 0428/2012, de 23/07/2012, do Laboratório Oficial de Análises de Sementes do Ministério da Agricultura, Pecuária e abastecimento, oriundo do Termo de Coleta de Amostra 002/1417/PR/2012 de 19/06/2012.’
A autuação deu-se com base no art. 177, inc. XI do Regulamento da Lei 10.711/2003, anexo ao Decreto nº 5.153/2004, que prescreve:
Art. 177. Ficam proibidos e constituem infração de natureza grave: (…)
IX – a produção, o armazenamento, a reembalagem e o comércio de sementes cujo lote esteja com o índice de germinação abaixo do padrão estabelecido;
A autora sustenta que a legislação prescreve, de forma cumulativa, as condutas capazes de caracterizar a infração, sendo que a ausência de qualquer uma destas etapas não configuraria a infração.
Não lhe assiste razão.
A prática de qualquer uma das condutas descritas no dispositivo transcrito é suficiente para caracterizar a infração e para autorizar a imposição da sanção. Na verdade, a conjunção ‘e’ contida na redação do artigo é utilizada para indicar a existência de mais de uma conduta proibida pela mesma norma, concluindo-se que, praticada qualquer uma das condutas descritas no art. 177, IX, incide a norma, sendo cabível a aplicação da sanção.
Note-se que, no caso em tela, a autora produziu e armazenou as sementes com irregularidade, não havendo que se falar em inocorrência de infração.
Outrossim, cumpre salientar que o laudo oficial, elaborado pela CLASPAR, prevalece sobre laudo particular, nada obstante realizado por laboratório também credenciado pelo Ministério da Agricultura. Veja-se que o exame oficial possui presunção de legitimidade, e para discussão acerca de sua correção haveria necessidade de produção de exame pericial em juízo, sob o crivo do contraditório, o que não foi requerido pela autora.
Em suma, não foi apontado pela autora qualquer outro vício capaz de macular o AI nº 004/1349/PR/2012, razão pela qual ele deve ser mantido.
Afasto, ademais, o cálculo da multa sugerido pela autora pois levou em consideração o preço de venda das sementes contaminadas como grão comercial e não como semente de soja (grão destinado ao plantio). O fato da autora ter vendido as semente como grão comercial não altera a base de cálculo da multa, que deve ser o preço das sementes de soja como grãos destinados ao plantio constante no próprio termo de coleta.
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Por fim, mantenho a verba honorária, fixada em R$ 500,00 (quinhentos reais), nos termos do artigo 85, § 8º, do NCPC, por considerar o valor arbitrado em conformidade com os critérios da razoabilidade e equidade, tendo em vista a simplicidade da causa e a inexistência de dilação probatória.
Ante o exposto, voto por negar provimento aos apelos.
Desembargador Federal Luís Alberto D’Azevedo Aurvalle
Relator