“A Lei n. 11.101/2005 introduziu o regime de recuperação judicial na legislação falimentar brasileira, em substituição ao antigo instituto da concordata preventiva, regulado pelo Decreto-Lei n. 7.661/1945.
Com notáveis diferenças de sua predecessora, a recuperação judicial provocou consideráveis alterações no panorama jurídico-econômico no cenário brasileiro, sobretudo por propiciar aos credores e devedores um procedimento judicial destinado à negociação de um acordo “sui generis” deliberado em assembleia geral de credores: o plano de recuperação judicial.
Através da recuperação judicial, as dívidas e obrigações poderão ser negociadas com os credores estabelecendo-se prazos e condições diferenciados para que sejam quitadas, e os processos movidos contra a empresa em dificuldades fiquem suspensos por seis meses, enquanto o plano de recuperação é apresentado e aprovado.
Mas a grande controvérsia em relação ao produtor rural é a possibilidade ou não da extensão dos benefícios da lei de recuperação judicial.
A referida lei, no seu art. 1ª contempla a sua aplicabilidade exclusivamente aos empresários e sociedade empresárias.
De acordo com o art. 966 do Código Civil, “Considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços’’. O art. 971 do mesmo código equipara o produtor rural a empresário, exigindo, entretanto, que ele tenham requerido sua inscrição no Registro Público de Empresas Mercantis (Junta Comercial) da respectiva sede. Estando equiparado ao empresário, estará sujeito a todas as obrigações previstas aos empresários, sujeitando-se à falência e aos seus efeitos, inclusive no âmbito penal. Por outro lado, gozará de todos os benefícios previstos aos empresários, podendo requerer recuperação judicial e extrajudicial.
Contudo, a lei de recuperação judicial exige que a atividade empresarial do produtor venha sendo exercida regularmente há pelo menos 2 (dois) anos. Sem atender este requisito, não será possível que o produtor utilize os benefícios da lei. Vale frisar que o prazo será contado a partir da data de inscrição na Junta Comercial.
Neste sentido, a Comissão de Desenvolvimento Econômico, Industria e Comércio (CDEIC) da Câmara dos Deputados aprovou do dia 26 de outubro de 2015 a proposta do deputado Jerônimo Goergen (PP-RS), que simplifica os procedimentos para os produtores rurais pedirem recuperação judicial (PL 6279/13).
O projeto de lei 6279/13 regulamenta a recuperação judicial para os produtores rurais ao alterar da Lei de Falências permitindo a comprovação de dois anos de exercício regular da atividade rural apenas com a apresentação da declaração do imposto de renda da pessoa física, desde que os rendimentos da referida atividade sejam superiores a 50% do montante declarado.
O projeto de lei, que tramita de forma conclusiva, está sendo analisado ainda pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania.
Diante da atual paralisia do Poder Legislativo em plena crise política, é improvável que o referido PL, seja votado nas casas do parlamento no curto prazo, mas vale uma reflexão fora da seara jurídica.
Sob o ponto de vista de mercado, a atividade agrícola por si só, já é considerado um empreendimento de elevado risco, seja pela exposição às condições naturais, ou pela volatilidade de preços, típica da produção agropecuária. Hoje os bancos, através do depósito compulsório, são praticamente obrigados a emprestar para os produtores. Uma medida que crie um desequilíbrio entre as partes, poderia gerar uma insegurança jurídica com efeitos negativos na oferta de crédito, sobretudo nas linhas não reguladas pelo MCR (Manual de Crédito Rural).
Outro aspecto relevante a ser considerado na aplicação de uma Recuperação Judicial para produtores rurais, seria o elevado custo de se gerir uma assembleia de credores e um plano de reestruturação empresarial. Isso se deve ao fato de que a atividade produtiva nem sempre é operada em locais de fácil acesso, além de ter uma forte personificação gerencial, onde um produtor é o nome que conduz todas as ações da empresa: compra, venda, gestão de pessoas, planejamento e condução de lavoura etc., o que prejudicaria sobremaneira a intervenção externa de gestores, nos casos do pequenos e médios agropecuaristas”.
Fonte: Agro Security, Boletim Agrofinanças nº 39 (Texto: Mariana Ortega e Fernando Pimentel)
Sobre o Projeto de Lei nº 6279/2013:
PROJETO DE LEI Nº , DE 2013
(Do Sr. Jerônimo Goergen)
Altera a lei que Regula a recuperação judicial, a extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária, Lei nº 11.101, de 2005, incluindo disposições para que o produtor rural no regime jurídico empresarial possa requerer recuperação judicial.
O Congresso Nacional decreta:
Art. 1º Esta Lei altera a Lei nº 11.101, de 09 de fevereiro de 2005, que Regula a recuperação judicial, a extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária.
Art. 2º O art. 48, da Lei 11.101, de 9 de fevereiro de 2005, passa a vigorar da seguinte forma:
Art. 48. Poderá requerer recuperação judicial o devedor que, no momento do pedido, exerça regularmente suas atividades há mais de 2 (dois) anos e que atenda aos seguintes requisitos, cumulativamente:
I – não ser falido e, se o foi, estejam declaradas extintas, por sentença transitada em julgado, as responsabilidades daí decorrentes;
II – não ter, há menos de 5 (cinco) anos, obtido concessão de recuperação judicial;
III – não ter, há menos de 8 (oito) anos, obtido concessão de recuperação judicial com base no plano especial de que trata a Seção V deste Capítulo;
IV – não ter sido condenado ou não ter, como administrador ou sócio controlador, pessoa condenada por qualquer dos crimes previstos nesta Lei.
§ 1º A recuperação judicial também poderá ser requerida pelo cônjuge sobrevivente, herdeiros do devedor, inventariante ou sócio remanescente.
§ 2. Tratando-se de exercício de atividade rural, admite-se a comprovação do prazo estabelecido no caput deste artigo com a declaração de imposto de renda.
Art. 3º Esta Lei entra em vigor na data da sua publicação.
JUSTIFICAÇÃO
A atividade agrosilvopastorial responde por importante parcela da produção econômica nacional e se encontra cada vez mais voltada para atuação desde referenciais de mercado, os quais lhe impõem padrões de gestão e eficiência, estando totalmente suscetível às mudanças econômicas. Entretanto, não há uma solução jurídica para a crise do produtor rural, que contenha caráter preventivo e recuperatório (apenas a insolvência civil, contida no art. 748, CPC, que visa, precipuamente, à liquidação das dívidas, sem compromisso com a salvaguarda do devedor e a continuidade do negócio).
Por outro lado, o ingresso do produtor no regime jurídico empresarial – que lhe permitira a utilização da recuperação judicial na forma que hoje está inscrita na Lei 11.101-2005 – facultado pelo art. 971, do Código Civil, além de não ter se popularizado entre os agricultores, condiciona a recuperação judicial ao registro prévio perante a Junta Comercial, pelo prazo de dois anos. Cria-se, pois uma lacuna na legislação brasileira, que não oferece mecanismos para a superação da crise do agricultor que não tenha optado pelo registro na Junta Comercial. Esta circunstância precisa ser corrigida mediante a viabilização da recuperação judicial, pelo procedimento regular ou mediante a apresentação do plano especial, e extrajudicial, como pretende o projeto ora apresentado.
Por todas as razões expostas, é de clareza solar a necessidade das modificações apresentadas na proposta, e espero o apoio dos nobres Parlamentares.
Sala de sessões, 03 de agosto de 2013.
Deputado Jerônimo Goergen