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Direito Agrário

Atividade agrária como alternativa para a ressocialização de presos

Um pedaço de terreno baldio transformou a vida do reeducando Wellington Carlos dos Santos, de 56 anos. Inserido no programa Começar de Novo, que visa à inserção social de pessoas que cumprem pena, o homem descobriu um novo caminho, após passar 18 anos preso: semear, plantar e colher na horta criada, por sua iniciativa, na área do Fórum da comarca de Anicuns.

“O tempo em que passei fechado me fez enxergar o mundo de forma diferente, aproveitar a liberdade, dar valor ao trabalho e buscar oportunidades para crescer”, conta o reeducando, que hoje cumpre regime semiaberto, utilizando tornozeleira eletrônica.

A infância na roça o inspirou a olhar para a terra de forma diferente, conforme relata. “Inicialmente, eu fui chamado para fazer a limpeza da área externa do prédio. Mas o trabalho acabava rapidamente e eu me sentia constrangido ao ficar à toa. Olhei, então, para aquele espaço vazio ao lado do estacionamento, que poderia ser aproveitado para uma plantação e fiquei incomodado. Tive a ideia e fui bem recebido pela juíza”, conta em relação à magistrada titular da comarca, Lígia Nunes de Paula, que o apoiou desde o início do projeto, há 10 meses.

Para criar a horta, Wellington pesquisou na internet, por conta própria, técnicas de cultivo. Fez vários testes, construiu canteiros e hoje produz alface, rúcula, rabanete, cenoura, salsa, coentro, couve e cebola. A safra é destinada a entidades sociais da cidade e o restante é compartilhado com os servidores do fórum.

Preso por homicídio em abril de 1998 e condenado a 25 anos de prisão, Wellington passou a maior parte do tempo no Penitenciária Coronel Odenir Guimarães, no Complexo Prisional de Aparecida de Goiânia. Depois, pediu transferência para o presídio de Anicuns, cidade onde sua família e a de sua mulher, Selma Oliveira, residem. No tempo em que passou recluso, aproveitou para estudar. “Tinha cursado até a quarta série do ensino fundamental. Já que estava ali, na cadeia, fui procurar o que fazer e concluí o ensino médio. A experiência não foi tão negativa. Acredito que a violência é gerada por falta de educação também”, conta.

Contra o sistema

A visão de Wellington em, não apenas abraçar oportunidades, mas criá-las, é louvável, na opinião da juíza Lígia Nunes de Paula. “Contudo, ele é, infelizmente, uma exceção. Nas cidades do interior, há muitos problemas com drogas e o fato de ele não ter vícios foi fundamental para o sucesso da iniciativa”.

Segundo a magistrada, na comarca, de 40 mil habitantes, há 40 detentos – um número alto proporcionalmente. “Há, também, um índice elevado de transgressões e faltas graves entre os presos dos regimes aberto e semiaberto, que provocam a regressão ao fechado. Faltam, por parte da Superintendência Executiva de Administração Penitenciária, iniciativas para apoio psicológico e amparo para a reinserção social. Wellington luta contra o sistema”, avalia.

Pelo sucesso, a iniciativa de Wellington foi reconhecida pelos servidores que, inclusive, o integram a eventos e festas de confraternização. “É muito gratificante ver que está dando certo e superou nossas expectativas. Wellington tem uma produtividade alta, que surpreendeu por sua produção ser solitária”, relata a juíza.

“Gosto tanto do trabalho aqui que nem quero imaginar o dia que terminar. Mas sei apenas de uma coisa: descobri uma vocação e quero levar em frente”, conclui o detento. Veja galeria de fotos. (Texto: Lilian Cury/ Fotos: Wagner Soares – Centro de Comunicação Social do TJGO)

Fonte: TJGO, 03/08/2016

Direito Agrário

Comentário de DireitoAgrario.com:

por Cláudio Grande Júnior

Mestre em Direito Agrário pela Universidade Federal de Goiás ‒ UFG. Membro da União Brasileira dos Agraristas Universitários ‒ UBAU. Ex-Professor Substituto na UFG. Procurador do Estado de Goiás.

A necessidade de mão de obra para as atividades agrárias sempre foi um problema que tocou a política, a economia e o direito. Basta relembrar que na baixa idade média, no ano de 1375, foi compilada em Portugal a Lei de Sesmarias, que não apenas obrigava ao cultivo os possuidores de terra, mas também coagia os camponeses a trabalhar sem exigir salários excessivos, bem como compelia ao trabalho os ociosos, vadios e mendigos que pudessem fazer serviço de seu corpo. No Brasil, durante a colonização e primeiras décadas do Império, grandes empreendimentos agroexportadores só se viabilizavam com mão de obra escrava vinda da África. A progressiva adoção do trabalho livre exigiu a vinda de imigrantes europeus para a continuidade e criação de novos empreendimentos agrários.

Atualmente, como se sabe, muitas vezes a oferta de mão de obra para atividades agrárias não se localiza onde se precisa dela. E ainda hoje, infelizmente, se depara com situações de trabalho análogo ao escravo. Nem mesmo os presos podem ser forçados ao trabalho, porque a Constituição Federal proíbe penas de trabalhos forçados (art. 5º, XLVII). Contudo, o ordenamento jurídico incentiva os presos a se dedicarem ao trabalho (e ao estudo), sendo a face mais visível disso o instituto da remição de penas, previsto principalmente dos arts. 126 a 130 da Lei de Execuções Penais. Esta também prevê colônias agrícolas para o cumprimento da pena em regime semiaberto (art. 91).

Sem nenhuma dúvida o trabalho em atividades agrárias é uma alternativa para a ressocialização de condenados. Muitos destes podem até ter vocação agrária desconhecida, por preconceito urbano e falta de anteriores oportunidades desse tipo, e se ressocializarem abraçando um modo ou filosofia de vida agrária. Ao mesmo tempo, é possível que descubram também aptidão para alguma atividade no agronegócio. Aliás, as oportunidades de trabalho lícito não se restringem apenas ao trabalho direto com a atividade agrária, estendendo-se aos demais elos das cadeias de produção de bens de origem agrária. 

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