“O Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) irá receber da empresa de indústria, comércio e exportação de grãos Granol S.A a metade dos valores gastos com o pagamento de pensão à família de um ex-funcionário morto após acidente de trabalho. O Tribunal Regional federal da 4ª Região (TRF4) considerou a empresa parcialmente culpada pelo ocorrido. A decisão foi proferida na última semana.
O acidente ocorreu em julho de 2010. Na ocasião, o funcionário que veio a falecer trabalhava junto a um colega desentupindo uma máquina de descarregamento de soja quando ambos foram sugados pelo equipamento. Um dos homens foi soterrado pelos grãos, vindo a morrer por asfixia mecânica. O outro teve ferimentos leves.
Uma série de fiscalizações realizadas pelo Ministério do Trabalho e Emprego nos dias seguintes à ocorrência apontou que a Granol não estava cumprindo as normas de segurança e higiene do trabalho.
O INSS ajuizou ação contra a empresa alegando que os funcionários não estavam usando cinto de proteção no momento do acidente devido à negligência por parte dos empregadores.
A ré contestou afirmando que os funcionários ingressaram no interior da máquina por sua conta e risco, não observando o procedimento adequado para o desentupimento que deveria ter ocorrido pelo lado de fora da estrutura.
Em depoimento, o funcionário sobrevivente relatou que o colega foi alertado sobre a necessidade de usar o cinto para entrar no equipamento, mas estava nervoso e respondeu que ‘era ‘ligeirinho’ e não precisava de proteção e que, se fossem buscar, iam demorar muito tempo’.
Por outro lado, o testemunho também permitiu concluir que a negligência no procedimento, da maneira como ocorreu na data do acidente, ainda que não incentivada ou ordenada, era tolerada pela empresa Granol. Também foi apontado que não havia equipamento de proteção próximo à máquina.
Em julgamento de primeira instância, a Justiça Federal de Cachoeira do Sul (RS) condenou a ré a contribuir com a metade da pensão paga à família do ex-funcionário, além de ressarcir o INSS pelos valores já gastos. A Granol recorreu.
Na última semana, a 4º Turma do TRF4 manteve a decisão por unanimidade. Segundo a relatora do processo, desembargadora federal Vivian Josete Pantaleão Caminha, ‘a culpa pelo acidente é de ambos, empregado e empresa e, portanto, é cabível o ressarcimento ao INSS da metade das despesas’”.
Fonte: TRF4, 27/04/2016.
Confira a íntegra da decisão:
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 5001122-69.2015.4.04.7119/RS
RELATORA
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Des. Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA
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APELANTE
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GRANOL INDUSTRIA COMERCIO E EXPORTACAO SA
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ADVOGADO
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BRUNO SILVA DOS SANTOS
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APELANTE
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INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS
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APELADO
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OS MESMOS
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RELATÓRIO
Trata-se de apelações interpostas em face de sentença cujo dispositivo foi exarado nos seguintes termos:
‘(…)3. DISPOSITIVO
Ante o exposto, resolvendo o mérito nos termos do art. 269, I, do Código de Processo Civil, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido para CONDENAR a parte ré a indenizar o INSS pelo pagamento de metade do valor da pensão por morte NB n.º 151.136.306-9, DIB em 15/07/2010, parcelas vencidas e vincendas, com juros de mora de 1,0% ao mês e correção monetária pelo INPC, ambos desde o vencimento de cada parcela.
Inviável a constituição de capital, a qual se destina a garantir o cumprimento de pensão alimentar de natureza civil (art. 475-Q do CPC).
Sendo recíproca a sucumbência, é desnecessária, diante da compensação, a condenação em honorários.
A parte ré fica condenada a pagar 50% das custas processuais. O INSS é isento do seu pagamento.
Publique-se.
Registre-se.
Intimem-se.’
Em suas razões recursais a empresa sustentou, em síntese, que não teve culpa no acidente, tendo este ocorrido por culpa exclusiva do segurado. Asseverou que foram realizados todos os treinamentos necessários, que forneceu adequados equipamentos de proteção aos seus colaboradores e que o comportamento desobediente do funcionário é que ocasionou o acidente. Postulou a reforma da sentença e o reconhecimento da improcedência do pedido.
Em suas razões o INSS sustentou a culpa exclusiva da empresa, que o ambiente no qual o segurado trabalhava era inseguro, estando ausentes os equipamentos de proteção e informações de segurança exigidas pela legislação trabalhista, conforme constataram os auditores fiscais do trabalho. Asseverou que a culpa do empregado não afasta a responsabilidade da empresa, salvo se restar demonstrado que tomou todas as precauções e cumpriu todas as regras de segurança. Postulou, pois, o afastamento da culpa concorrente e o julgamento da total procedência do pedido. Aduziu que o pleito inserto na inicial é de caução e não constituição de capital e que a prestação de caução consiste em medida imperativa nas ações indenizatórias, postulando o seu deferimento, bem como o reconhecimento da total procedência dos pedidos insertos na inicial.
Com contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.
É o relatório.
VOTO
Da constitucionalidade do art. 120 da Lei nº 8.213/91:
A Corte Especial do TRF 4ª Região, em sede de Arguição de Inconstitucionalidade, declarou constitucional o art. 120 da Lei n.º 8.213/91, em face das disposições do art. 7º, XXVIII, art. 154, I, e art. 195, § 4º, todos da Constituição Federal, consoante ementa que segue:
CONSTITUCIONAL. ARGÜIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE. INEXISTÊNCIA DE INCOMPATIBILIDADE ENTRE OS ARTS. 120 DA LEI Nº 8.213/91 E 7º, XXVIII, DA CF. Inocorre a inconstitucionalidade do art. 120 da Lei nº 8.213/91 (Art. 120. Nos casos de negligência quanto às normas padrão de segurança e higiene do trabalho indicadas para a proteção individual e coletiva, a Previdência Social proporá ação regressiva contra os responsáveis.) em face da disposição constitucional do art. 7º, XXVIII, da CF (Art. 7º. São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: XXXVIII – seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa;), pois que, cuidando-se de prestações de natureza diversa e a título próprio, inexiste incompatibilidade entre os ditos preceitos. Interpretação conforme a Constituição. Votos vencidos que acolhiam ante a verificação da dupla responsabilidade pelo mesmo fato. Argüição rejeitada, por maioria.’
(TRF 4ª Região, Corte Especial, INAC 1998.04.01.023654-8, Rel. p/ Acórdão Manoel Lauro Volkmer de Castilho, DJU 13/11/2002)
Transcrevo trecho do voto proferido pelo eminente Relator:
Salvo engano, não há incompatibilidade entre o art. 7º, inciso 28, da Constituição, e o art. 120 da Lei 8.213/91. Assim porque estou lendo o inc. 28 de modo diverso ao que faz a eminente Relatora. Penso que, quando a Constituição garante aos trabalhadores esse direito de seguro contra acidente de trabalho a cargo do empregador, é o custeio que ele faz perante a Previdência. Diz a Constituição em seguida: … ‘sem excluir a indenização a que este está obrigado quando incorrer em dolo ou culpa’. A Constituição não diz que essa indenização é ao empregado. A Constituição diz que o empregador fica responsável por uma indenização se ele der causa ao acidente por culpa ou dolo. O direito dos trabalhadores urbanos e rurais é o seguro contra acidente de trabalho; foi isso que se garantiu na Constituição. Se essa leitura é compatível do jeito que estou a propor, não há divergência entre o art. 120 da Lei nº 8.213 e este inciso, porque, quando o art. 120 diz que a Previdência vai propor ação de regresso, é justamente para se ressarcir daquilo que pagou por responsabilidade objetiva ao empregado, tendo o empregador tido culpa ou dolo. (…)
De modo que, se isso é verdadeiro, o ressarcimento ou a indenização, conforme o termo da Constituição, se é devido, é devido à Previdência Social, que atendeu o direito, garantido pela Constituição, ao empregado. Não estou vendo a incompatibilidade que se quer extrair, e mais, a inconstitucionalidade que se quer ler no dispositivo mencionado. De qualquer modo, se a regra tivesse a leitura afirmada pela Relatora, também não seria incompatível com a da Constituição, pois que, tendo títulos diversos, tanto o empregador tem de contribuir, quanto, sendo culpado, haverá de indenizar quem pagou o seguro, isto é, o INSS e a quem causar dano, e nessa perspectiva, não acontece inconstitucionalidade.
Dessa forma, reconhecida a constitucionalidade do artigo 120 da Lei nº 8.213/91, resta verificar os parâmetros em que uma conduta do empregador pode ser considerada negligente a ensejar o ressarcimento do INSS.
Para caracterização da responsabilidade do empregador em face do INSS são necessários os seguintes elementos: a) culpa, na forma de negligência quanto às normas padrão de segurança e higiene do trabalho; b) dano; c) nexo causal entre a conduta culposa e o dano.
Feitas tais considerações, passo à análise do caso concreto.
Em que pesem as alegações dos apelantes, considero irretocáveis as razões que alicerçaram a r. sentença monocrática, a qual me permito transcrever integralmente, verbis:
‘Vistos etc.
1. RELATÓRIO
O INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL ajuizou ação regressiva em face de GRANOL S/A.
Relatou o acidente de trabalho que culminou com o falecimento do segurado Douglas da Rosa Bittencourt, empregado da GRANOL S/A. No dia 15/07/2010, Douglas e outro colega atuavam na desobstrução da bica de uma moega a fim de viabilizar o descarregamento de grãos de soja. Para tanto, os dois ingressaram no interior da moega com um vergalhão. Realizada a desobstrução, os trabalhadores foram sugados em direção à bica, tendo Douglas sido soterrado pelos grãos e falecido e o seu colega ficado com soja até a altura do peito.
Afirmou o INSS não estar o empregado utilizando equipamento de proteção/EPI no momento do acidente, causado pelo descumprimento culposo de normas de segurança e higiene do trabalho por parte da GRANOL S/A. Referiu ter sido esta a conclusão da fiscalização do Ministério do Trabalho e Emprego nos dias seguintes ao acidente, ocasião em que houve a lavratura de diversos autos de infração e inclusive termo de interdição dos espaços confinados.
Requereu a condenação ao pagamento dos benefícios previdenciários decorrentes do acidente de trabalho (EV. 1).
Na contestação, a GRANOL S/A sustentou inicialmente o implemento do prazo de prescrição. No mérito, afirmou que Douglas e seu colega ingressaram no interior da moega por sua conta e risco, não observando o procedimento adequado para o desentupimento da moega, que deveria ter ocorrido pelo lado de fora da estrutura. Não houve, ademais, observância pelos trabalhadores das orientações relativas à necessidade de utilização de equipamento de proteção.
Referiu os depoimentos prestados pelas testemunhas presentes no acidente, especialmente o de Marcelo, que juntamente com Douglas ingressou no interior da moega. Segundo Marcelo, Douglas teria agido por impulso e irritação, além de haver expressamente rejeitado a utilização do cinto de segurança. Afirmou que Douglas tinha consicência das normas de segurança a serem observadas no trabalho no interior da moega.
Por fim, afirmou que, em razão da contribuição SAT, não é possível a cobrança em regresso do pagamento de benefício acidentário (EV. 9).
O INSS apresentou réplica (EV. 15).
É o relatório.
Passo a decidir.
2. FUNDAMENTAÇÃO
Prejudicial de prescrição
De acordo com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, prescreve em cinco anos, nos termos do Decreto 20.910/32, a pretensão do INSS obter a indenização do prejuízo consistente no pagamento de benefício previdenciário derivado de acidente de trabalho:
ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. ACIDENTE DE TRABALHO. DEMANDA RESSARCITÓRIA AJUIZADA PELO INSS CONTRA O EMPREGADOR DO SEGURADO. PRAZO PRESCRICIONAL. INCIDÊNCIA DO ART. 1º DO DECRETO Nº 20.910/32. INAPLICABILIDADE DOS ARTS. 103 E 104 DA LEI Nº 8.213/91.1. Nas demandas ajuizadas pelo INSS contra o empregador do segurado falecido em acidente laboral, visando ao ressarcimento dos danos decorrentes do pagamento do benefício previdenciário, o termo a quo da prescrição da pretensão é a data da concessão do referido benefício.2. Em razão do princípio da isonomia, é quinquenal, nos termos do art. 1º do Decreto nº 20.910/32, o prazo prescricional da ação de regresso acidentária movida pelo INSS em face de particular.3. A natureza ressarcitória de tal demanda afasta a aplicação do regime jurídico-legal previdenciário, não se podendo, por isso, cogitar de imprescritibilidade de seu ajuizamento em face do empregador.4. Agravo regimental a que nega provimento.(AgRg no REsp 1365905/SC, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 20/11/2014, DJe 25/11/2014)
E, como acrescenta o Tribunal Regional Federal da 4ª Região, a prescrição atinge o fundo do direito:
ACIDENTE DE TRABALHO. AÇÃO REGRESSIVA DO INSS CONTRA O EMPREGADOR. ARTIGO 120 DA LEI Nº 8.213/91. PRESCRIÇÃO. CULPA CONCORRENTE.. A Lei nº 8.213/91, em seu artigo 120, prevê o ressarcimento ao INSS dos valores despendidos com o pagamento de benefícios previdenciários decorrentes de acidentes de trabalho, exigindo, para a responsabilização do empregador, prova de nexo causal entre a conduta omissiva – consistente em ‘negligência quanto às normas padrão de segurança e higiene do trabalho indicados para a proteção individual e coletiva’ – e o infortúnio que deu causa ao pagamento da prestação previdenciária. . Quando o INSS pretende ressarcir-se dos valores pagos a título de benefício previdenciário, a prescrição aplicada não é a prevista no Código Civil, trienal, mas, sim, a qüinqüenal, prevista no Decreto nº 20.910, de 6 de janeiro de 1932. O prazo prescricional subordina-se ao principio da actio nata, tendo início a partir da data em que o credor pode demandar judicialmente a satisfação do direito. A prescrição atinge o fundo do direito de ação, ou seja, o próprio direito de regresso postulado pelo INSS, e não apenas as parcelas vencidas anteriormente ao seu ajuizamento, pois não se trata de prestação de trato sucessivo, mas de relação jurídica instantânea de efeitos permanentes. Havendo culpa concorrente da vítima, a empresa demandada deve arcar com o ressarcimento de somente metade dos valores pagos pelo INSS a título de benefício. (TRF4, AC 5004863-70.2012.404.7104, Quarta Turma, Relator p/ Acórdão Maria Cristina Saraiva Ferreira e Silva, juntado aos autos em 03/11/2014)
Como a pensão por morte tem como DIB o dia 15/07/2010 e a ação foi ajuizada em 28/04/2015, não há prescrição a reconhecer.
Mérito
O art. 120 da Lei 8.213/91 disciplina a ação de regresso do INSS em face do causador de benefício previdenciário acidentário:
Art. 120. Nos casos de negligência quanto às normas padrão de segurança e higiene do trabalho indicados para a proteção individual e coletiva, a Previdência Social proporá ação regressiva contra os responsáveis.
Assim, o prejuízo consistente no pagamento de benefício previdenciário pelo INSS deverá ser indenizado por aquele que, agindo de maneira negligente em relação às normas padrão de segurança e higiene do trabalho indicadas para a proteção individual e coletiva, tiver dado causa ao prejuízo.
A previsão do art. 120 da Lei 8.213/91 não representa, por outro lado, inconstitucionalidade.
A contribuição SAT visa a assegurar o risco natural e inerente à prestação do serviço, que não é eliminado mesmo com a observância das normas padrão de segurança e higiene do trabalho. Não abrange, pois, o risco anormal, criado a partir da negligência do empregador, o qual, por este motivo, deve assegurá-lo, conforme o art. 120 da Lei 8.213/91.
Neste sentido, a jurisprudência do STJ e do TRF da 4ª Região:
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL. AÇÃO REGRESSIVA. ACIDENTE DO TRABALHO. MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7/STJ.SÚMULA 83/STJ. AGRAVO NÃO PROVIDO.1. Cuida-se, na origem, de ação que objetiva a condenação da empresa ao ressarcimento de valores despendidos no pagamento de benefícios previdenciários decorrentes de acidente de trabalho ocorrido em 10.10.2007, nas dependências da ré, com a funcionária que sofreu acidente ao realizar tarefas laborais, e teve amputada sua mão direita.2. É assente nesta Corte Superior que a contribuição ao SAT não exime o empregador da sua responsabilização por culpa em acidente de trabalho, conforme art. 120 da Lei 8.213/1991. Nesse sentido: REsp 506.881/SC, Relator Ministro José Arnaldo da Fonseca; Quinta Turma, DJ 17.11.2003; e EDcl no AgRg nos EDcl no REsp 973.379/RS, Rel.Ministra Alderita Ramos de Oliveira (Desembargadora Convocada do TJ/PE), Sexta Turma, DJe 14.6.2013.3. É inviável analisar a tese defendida no Recurso Especial, a qual busca afastar as premissas fáticas estabelecidas pelo acórdão recorrido, pois inarredável a revisão do conjunto probatório dos autos. Aplica-se o óbice da Súmula 7/STJ.4. No mais, o STJ vem sedimentando o entendimento de que o prazo prescricional é o do Decreto 20.910/32. Nesse sentido: AgRg no REsp 1.423.088/PR, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 19.5.2014.5. Agravo Regimental não provido.(AgRg no REsp 1452783/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 16/09/2014, DJe 13/10/2014)
CONSTITUCIONAL. ARGÜIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE. INEXISTÊNCIA DE INCOMPATIBILIDADE ENTRE OS ARTS. 120 DA LEI Nº 8.213/91 E 7º, XXVIII, DA CF. Inocorre a inconstitucionalidade do art. 120 da Lei nº 8.213/91 (Art. 120. Nos casos de negligência quanto às normas padrão de segurança e higiene do trabalho indicadas para a proteção individual e coletiva, a Previdência Social proporá ação regressiva contra os responsáveis.) em face da disposição constitucional do art. 7º, XXVIII, da CF (Art. 7º. São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: XXXVIII – seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa;), pois que, cuidando-se de prestações de natureza diversa e a título próprio, inexiste incompatibilidade entre os ditos preceitos. Interpretação conforme a Constituição. Votos vencidos que acolhiam ante a verificação da dupla responsabilidade pelo mesmo fato. Argüição rejeitada, por maioria. (TRF4, INAC 1998.04.01.023654-8, Corte Especial, Relator p/ Acórdão Manoel Lauro Volkmer de Castilho, DJ 13/11/2002)
Não há controvérsia entre as partes em relação à forma como ocorreu o acidente (art. 334, III, do CPC): Douglas ingressou no interior da moega com um vergalhão a fim de desobstruir a bica por onde passariam os grãos de soja; realizada a desobstrução, Douglas foi sugado em direção à bica, tendo sido soterrado pelos grãos e falecido por asfixia mecânica.
Não há igualmente controvérsia em relação à não utilização de equipamento de proteção quando do acidente, notadamente cinto de segurança, providência a ser observada em atenção às normas de segurança e higiene do trabalho do Ministério do Trabalho e Emprego, mais especificamente a NR n.º 33, item 33.2.1.
De acordo com a teoria da causalidade adequada ou do dano direto e imediato, utilizadas para a determinação do nexo causal na responsabilidade civil, somente poderá ser reconhecida como causa a circunstância adequada (teoria da causalidade adequada) ou determinante (teoria do dano direto e imediato) para a ocorrência do evento danoso.
A causa adequada ou determinante do falecimento do segurado Douglas residiu justamente na não utilização de cinto de segurança.
As demais circunstâncias mencionadas pelo INSS, como a ausência de treinamento do segurado, de restrição de acesso à moega, de sinalização da estrutura ou a adoção de procedimento equivocado poderiam, no sentido jurídico, ser reconhecidas no máximo como condição, mas jamais como causa, adequada ou determinante, para a ocorrência do acidente de trabalho.
Assim, embora importantes para o esclarecimento do acidente e a compreensão da sua causa, a ausência de treinamento, restrição de acesso à moega ou sinalização da estrutura ou a adoção de procedimento inadequado para a desobstrução não ocasionaram o falecimento de Douglas, que estaria vivo se simplesmente tivesse utilizado cinto de segurança.
Em relação à não utilização do cinto de segurança, causa adequada ou determinante do acidente que culminou com o falecimento de Douglas, reconheço tanto a participação deste como da GRANOL S/A. Por outras palavaras, para que, no dia 15/07/2010, Douglas não utilizasse cinto de segurança, houve a concorrência tanto do segurado como da empresa.
No Inquérito Policial, foram ouvidas diversas testemunhas, estando presentes no momento do acidente Marcelo e Getúlio (EV. 1, INQPOL13): Marcelo foi quem ingressou juntamente com Douglas no interior da moega, vindo a ficar, após a desobstrução da bica, com soja até a altura do peito; Getúlio era o preposto da empresa encarregado do descarremento.
Embora o depoimento de Getúlio deva ser avaliado com cautela em face da possibilidade de sua responsabilização penal, não há motivo para não conferir credibilidade ao de Marcelo, a partir do qual é possível concluir ter havido tanto a participação de Douglas como da GRANOL S/A no processo de causação do acidente de trabalho.
Evidenciando a participação de Douglas, Marcelo disse que, lembrado do cinto de segurança, Douglas respondeu ‘que era ligeirinho, que não precisava, que até irem buscar os cintos, ia demorar muito tempo’, além do que ‘Douglas estava nervoso’. O depoimento de Marcelo indica ainda a consciência de Douglas a respeito da necessidade de utilizar o cinto: ‘que já haviam recebido orientação de que deviam usar o cinto para descer na moega’.
Por outro lado, o depoimento de Marcelo permite inferir que o procedimento, da maneira como ocorreu em 15/07/2010, era tolerado pela GRANOL S/A, ainda que não incentivado ou ordenado: ‘que nunca usavam o cinto’, ‘tinha uma corda que largavam na moega para descer’. Por fim, mesmo que pudesse ser buscado em outros setores da empresa, na área em torno da moega ‘não tinha nenhum cinto’ naquele momento.
Havendo concorrência entre a empresa e o segurado na causação do acidente, deve ser reconhecido ao INSS o direito de obter tão-somente a metade do prejuízo decorrente do pagamento do benefício previdenciário (pensão por morte, NB 151.136.306-9, DIB 15/07/2010). Embora possível a condenação à indenização em regresso de todos os benefícios decorrentes do acidente, no caso dos autos não há outro benefício que pudesse ser concedido senão a pensão por morte.
3. DISPOSITIVO
Ante o exposto, resolvendo o mérito nos termos do art. 269, I, do Código de Processo Civil, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido para CONDENAR a parte ré a indenizar o INSS pelo pagamento de metade do valor da pensão por morte NB n.º 151.136.306-9, DIB em 15/07/2010, parcelas vencidas e vincendas, com juros de mora de 1,0% ao mês e correção monetária pelo INPC, ambos desde o vencimento de cada parcela.
Inviável a constituição de capital, a qual se destina a garantir o cumprimento de pensão alimentar de natureza civil (art. 475-Q do CPC).
Sendo recíproca a sucumbência, é desnecessária, diante da compensação, a condenação em honorários.
A parte ré fica condenada a pagar 50% das custas processuais. O INSS é isento do seu pagamento.
Publique-se.
Com efeito, o Juízo de origem está próximo das partes, realizou ampla dilação probatória, devendo ser prestigiada sua apreciação dos fatos da causa, bem como sua conclusão no sentido da existência de culpa concorrente, inexistindo nos autos, pois, situação que justifique alteração do que foi decidido.
As alegações do INSS de imputar tão-somente à empresa a culpa pelo acidente estão baseadas unicamente em análise de acidente de trabalho pelo Ministério do Trabalho e Emprego. Todavia, entendo que deve ser prestigiada a prova produzida em Juízo, tendo o magistrado, de forma motivada, concluído que os elementos apontados pelo INSS não são, no caso, suficientes à total procedência do pedido.
Entendo relevante destacar, ainda, que a Justiça do Trabalho adota a teoria da responsabilidade objetiva, admitindo a condenação da empresa independentemente de prova de culpa. Na esfera previdenciária, porém, o regime jurídico é diverso: exige-se a prova de culpa do empregador, cujo ônus probatório compete ao INSS, não cabendo falar-se em responsabilização objetiva.
Quanto ao pleito de caução, afasto o pedido de prestação de caução em relação às parcelas vincendas.
Em se tratando de ressarcimento, via regressiva, dos valores despendidos pelo INSS em virtude de concessão de benefício previdenciário, improcede o referido pleito, uma vez que não se trata de obrigação de natureza alimentar, onde tal previsão constitui garantia de subsistência do alimentando para que o pensionamento não sofra solução de continuidade, mas de mero ressarcimento de valores pagos pelo INSS ao segurado acidente.
Nesse sentido:
AÇÃO INDENIZATÓRIA REGRESSIVA. INSS. PENSÃO POR MORTE. ACIDENTE DE TRABALHO. NEGLIGÊNCIA. CULPA CONCORRENTE. CONSTITUIÇÃO DE CAPITAL. PRESTAÇÃO DE CAUÇÃO. 1- Configurada a legitimidade passiva da empresa ré RIEG IND. E COM. DE PRÉ-MOLDADOS LTDA. 2- Demonstrada a culpa concorrente do empregado e da empresa empregadora, cabível o ressarcimento ao INSS, por parte dessa última, de metade das despesas já efetuadas com a concessão do benefício previdenciário e das que ainda serão realizadas durante a manutenção do benefício. 3- Rejeitado o pedido de constituição de capital ou de prestação de caução para assegurar o pagamento das parcelas vincendas. (TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 5000517-05.2010.404.7215, 4ª TURMA, Des. Federal CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JÚNIOR, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 05/04/2013)
Assim, nenhuma reforma merece a r. sentença monocrática.
Do prequestionamento
Em face do disposto nas súmulas n.ºs 282 e 356 do STF e 98 do STJ, e a fim de viabilizar o acesso às instâncias superiores, explicito que a decisão não contraria nem nega vigência às disposições legais/constitucionais prequestionadas pelas partes.
Ante o exposto, voto por negar provimento às apelações.
É o voto.
Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA
Relatora
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 5001122-69.2015.4.04.7119/RS
RELATORA
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Des. Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA
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APELANTE
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GRANOL INDUSTRIA COMERCIO E EXPORTACAO SA
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ADVOGADO
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BRUNO SILVA DOS SANTOS
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APELANTE
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INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS
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APELADO
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OS MESMOS
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EMENTA
ADMINISTRATIVO. AÇÃO REGRESSIVA DO INSS. ACIDENTE DE TRABALHO. ART. 120 DA LEI 8.213/91. CULPA CONCORRENTE. CONSTITUIÇÃO DE CAPITAL. PRESTAÇÃO DE CAUÇÃO.
Consoante prescreve o artigo 120 da Lei nº 8.213/91, ‘nos casos de negligência quanto às normas padrão de segurança e higiene do trabalho indicados para a proteção individual e coletiva, a Previdência Social proporá ação regressiva contra os responsáveis’.
Demonstrada a culpa concorrente do empregado e da empresa empregadora, cabível o ressarcimento ao INSS, por parte dessa última, de metade das despesas já efetuadas com a concessão do benefício previdenciário e das que ainda serão realizadas durante a manutenção do benefício.
Desacolhido o pleito de constituição de capital ou de prestação de caução para assegurar o pagamento das parcelas vincendas.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento às apelações, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 13 de abril de 2016.
Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA
Relatora
Documento eletrônico assinado por Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8192999v5 e, se solicitado, do código CRC 61DC55CE. |
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