Direito Agrário

Qual Direito Agrário?

Direito Agrário - foto Manuel Masseno

por Francisco de Godoy Bueno.

 

A Sociedade Rural Brasileira (SRB), a Sociedade Nacional de Agricultura (SNA), a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), a União Brasileira dos Agraristas Universitários (UBAU) e o Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB) promoveram, na semana de 11 de agosto último, no Rio de Janeiro, um importante congresso de Direito Agrário, do qual participaram especialistas de todo o território nacional para discutir, sob os aspectos jurídico, teórico e prático, diversos temas de interesse do agro brasileiro.

A ordem jurídica é um dos principais desafios do setor para continuar promovendo ciclos de desenvolvimento econômico e social para as regiões menos favorecidas do Brasil. A cultura bacharelista do nosso sistema, cheia de mitos e ideologias, aliada a uma total desconsideração da realidade do agronegócio, impõe à produção rural insegurança, custos de transação e custos de compliance inéditos em outras áreas da economia.

Pensar qual deve ser o Direito Agrário a ser estudado, aprofundado e desenvolvido no Brasil é, portanto, um tema fundamental. Como verificado nas discussões ocorridas na dita Casa de Montezuma, o prisma de parte importante dos agraristas brasileiros continua vinculado a uma visão superada da disciplina, preocupada com a destinação do território rural e a regulação da propriedade da terra.

De fato, o debate fundiário parece incitar os acadêmicos às paixões mais eloquentes dos seus ideais de justiça. A realidade brasileira, no entanto, depende de uma disciplina agrária menos apaixonada, em que juristas se dediquem à solução de conflitos práticos da atividade agrária. Como nos ensinaram os agraristas italianos, a quem o Direito Agrário deve o estabelecimento desta disciplina, a missão do agrarista é estabelecer como o risco duplo da atividade agrária, sujeita aos riscos normais da empresa mais os riscos naturais (do ciclo agrobiológico), atua sobre as relações jurídicas.

O Direito Agrário deve orientar os problemas dinâmicos da atividade, deixando para a política a definição dos conflitos fundiários, mediante a definição de regras claras que acomodem as pretensões corporativas com base no império democrático da Lei.

O agrarista precisa, portanto, conhecer melhor a atividade, os riscos criados pela necessária intervenção nos ciclos agrobiológicos e como os fatores naturais influenciam a agrariedade. E, despindo-se das visões ideológicas preconcebidas, procurar entender as tecnologias agrícolas como soluções dos problemas naturais que o agricultor deve enfrentar para conduzir, da melhor forma possível, a sua produção, de forma organizada, econômica e profissional.

O melhor equacionamento das questões jurídicas importantes – como a responsabilidade ambiental na atividade agropecuária, a divisão de responsabilidade entre proprietários e cultivadores dos imóveis rurais, as relações contratuais dos sistemas agroindustriais, o reconhecimento da propriedade dos ativos imateriais do estabelecimento agrário, dentre muitas outras questões essenciais ao melhor desenvolvimento do agro brasileiro – depende de uma postura ativa.

É preciso que os agraristas abandonem as preocupações zetéticas que incitam o ativismo judicial a resolver juridicamente os problemas que a Lei não poderá jamais resolver. O agrarista deve buscar, com as botas no barro, compreender o fato técnico que o Direito Agrário deve regular e, a partir dele, definir as soluções jurídicas para os problemas reais da agropecuária.


Francisco de Godoy Bueno
Advogado, Mestre em Direito Civil pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP) e Vice-Presidente da Sociedade Rural Brasileira (SRB)

Veja também:

– A importância e relevância da criação do Direito Agrário e da edição do Estatuto da Terra (Portal DireitoAgrário.com, 10/07/2017)

– A pesca e a aquicultura como atividade agrária (Portal DireitoAgrário.com, 22/11/2016)

– ZIBETTI, Darcy Walmor; QUERUBINI, Albenir. O Direito Agrário brasileiro e sua relação com o agronegócio. In: Direito e Democracia – Revista de Divulgação Científica e Cultural do Isulpar. Vol. 1 – n. 1, jun./2016, disponível em: <http://www.isulpar.edu.br/revista/file/130-o-direito-agrario-brasileiro-e-a-sua-relacao-com-o-agronegocio.html>.

Confira as palestrados do I Congresso Nacional de Direito Agrário