Direito Agrário

Empregador rural pessoa física não deve pagar contribuição previdenciária sobre comercialização de produtos agrícolas sob pena de bitributação

Direito Agrário

“A 8ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região negou provimento à apelação da Fazenda Nacional contra a sentença da 2ª Vara da Seção Judiciária do Maranhão que julgou procedente o pedido de um empregador rural para que fosse declarada a inexigibilidade da contribuição à seguridade social de empregador rural pessoa física, prevista no art. 25, incisos I e II, da Lei nº 8.212/1991. A decisão do juiz de primeira instância também havia assegurado à parte autora o direito à restituição dos valores indevidamente recolhidos no quinquênio anterior à ação.

A Fazenda Nacional recorreu alegando que o autor não providenciou os documentos indispensáveis à propositura da ação, deixando de comprovar o recolhimento do tributo de qual pretendia a restituição. Sendo assim, a apelante argumentou que a ausência de prova da condição de empregador rural ‘retira-lhe a legitimidade ativa para o ajuizamento da ação’.

Na apelação, o ente público destacou a constitucionalidade da exigência questionada, sobretudo a partir da entrada em vigor da Lei nº 10.256/2001, e requereu, ainda, que a legislação anterior fosse repristinada, na hipótese de ter o recurso negado. Dessa forma, a União pretendia o restabelecimento da obrigatoriedade do recolhimento da contribuição sobre a folha de salários e, em consequência, o limite “da restituição à diferença entre a contribuição tida por indevida e aquela revigorada no lugar”.

No voto, a relatora, desembargadora federal Maria do Carmo Cardoso, ressaltou que a documentação juntada aos autos é suficiente para comprovar a condição do autor como empregador rural, a retenção da contribuição analisada e a legitimidade para a propositura da ação.

A magistrada afastou a possibilidade de repristinação invocada pela recorrente por entender que a Lei nº 9.868/1999, que dispõe sobre o processamento e o julgamento das ações diretas de inconstitucionalidade e declaratórias de constitucionalidade no Supremo Tribunal Federal (STF), prevê, no art. 11, a possibilidade de repristinação apenas para a ‘hipótese de concessão de medida cautelar em ação direta, ou seja, em controle abstrato em que a eficácia é erga omnes (que vale para todos). A declaração de inconstitucionalidade tomada em recurso extraordinário e, portanto, em controle difuso de constitucionalidade, não admite, em regra, o efeito repristinatório’.

Já a respeito do mérito do pedido, a relatora destaca julgado do STF que declarou a inconstitucionalidade do art. 1º da Lei nº 8.540/1992, que deu nova redação ao artigo 25, I e II, da Lei nº 8.212/1991, atualizada até a Lei nº 9.528/1997. A fundamentação estava no fato de que a incidência da “exação sobre a comercialização de produtos agrícolas pelo produtor rural, pessoa natural, enseja dupla tributação, ofende o princípio da isonomia e implica na criação de nova fonte de custeio sem edição de lei complementar”.

‘O efeito da declaração de inexigibilidade da contribuição em exame repercute na sistemática prevista para o seu recolhimento – substituição tributária -, de forma que o adquirente dos produtos não deve promover a retenção, na condição de responsável tributário, para posterior repasse à autarquia previdenciária’, destacou a magistrada no voto.
A decisão foi unânime”.

Fonte: TRF1, 25/10/2016.

Comentário de DireitoAgrário.com:

por Joaquim Basso*

 

A notícia refere-se à contribuição previdenciária conhecida como “Funrural”, nome advindo de da contribuição instituída pela Lei Complementar n. 11, de 25 de maio de 1971, destinada à previdência dos trabalhadores rurais, o chamado Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural (Funrural). Essa contribuição veio a ser substituída por aquela aqui tratada, vindo a ser disposta nos arts. 12, V, “a”, e 25, I e II, da Lei n. 8.212, de 24 de julho de 1991, com redação dada pela Lei n. 8.540, de 22 de dezembro de 1992, e supervenientes alterações.

A Lei n. 8.540/1992, na parte em que trouxe uma nova redação ao art. 25 da Lei n.º 8.212/1991, foi julgada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário (RE) n. 363.852/MG[1].

Esse julgamento foi posteriormente reiterado, em sede de julgamento de repercussão geral, ou seja, com base no então vigente art. 543-B, do CPC/1973, em decisão assim ementada:

CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO SOCIAL PREVIDENCIÁRIA. EMPREGADOR RURAL PESSOA FÍSICA. INCIDÊNCIA SOBRE A COMERCIALIZAÇÃO DA PRODUÇÃO. ART. 25 DA LEI 8.212/1991, NA REDAÇÃO DADA PELO ART. 1º DA LEI 8.540/1992. INCONSTITUCIONALIDADE. I – Ofensa ao art. 150, II, da CF em virtude da exigência de dupla contribuição caso o produtor rural seja empregador. II – Necessidade de lei complementar para a instituição de nova fonte de custeio para a seguridade social. III – RE conhecido e provido para reconhecer a inconstitucionalidade do art. 1º da Lei 8.540/1992, aplicando-se aos casos semelhantes o disposto no art. 543-B do CPC[2].

Ocorre que já tinha havido tentativa do Poder Legislativo em sanar o vício que posteriormente viria ser reconhecido pelo STF, nos julgados mencionados.

A Emenda Constitucional de n. 20, de 15 de dezembro de 1998, entre diversas modificações, trouxe uma nova redação para o art. 195, I, da Carta Maior, e, após essa Emenda Constitucional, adveio a Lei n. 10.256, de 9 de julho de 2001, que modificou caput do art. 25 da Lei n. 8.212/1992 (dando-lhe a redação que até hoje subsiste), permanecendo os incisos (que definem o critério quantitativo do tributo) com a redação dada pela inconstitucional (consoante o STF, no RE 596.177) Lei n. 9.528/1997.

Assim é que, muito embora esteja pacificada a inconstitucionalidade da chamada “contribuição ao Funrural” no período de vigência da Lei n. 8.540/2012, com alterações subsequentes, a partir da Lei n. 10.256/2001, a jurisprudência ainda é divergente.

A decisão proferida na Apelação Cível n. 0003540-60.2011.4.01.3701/MA, aqui noticiada, reitera jurisprudência já pacificada no âmbito do TRF da 1ª Região. Para esse Tribunal, mesmo após a Lei n. 10.256/2001, a inconstitucionalidade daquela contribuição persiste, seja porque o julgamento do STF apontou outros vícios que não foram sanados por essa lei, seja porque permanecem os incisos do art. 25, da Lei 8.212/1992, que definem o critério quantitativo do tributo (alíquota e base de cálculo), ainda regidos por lei declarada inconstitucional no RE 596.177.

Esse entendimento, reiterado naquele Tribunal, cuja região abrange os estados da região norte, além de Mato Grosso, Bahia, Distrito Federal, Goiás, Maranhão, Piauí, Minas Gerais e Tocantins, também é acompanhado pelo TRF da 4ª Região (região sul do país), inclusive com julgamento pacificado pela Corte Especial desse Tribunal[3].

O posicionamento contrário é adotado pelos TRFs da 3ª Região (São Paulo e Mato Grosso do Sul)[4], da 5ª Região (Alagoas, Ceará, Paraíba, Pernambuco, Rio Grande do Norte e Sergipe)[5] e da 2ª Região (Rio de Janeiro e Espírito Santo)[6], que entendem que a Lei n. 10.256/2001 sanou os vícios que levavam à inconstitucionalidade da exação.

A decisão definitiva caberá ao STF, que já reconheceu a repercussão geral de Recurso Extraordinário que levanta a inconstitucionalidade do tributo ao Funrural após a Lei n. 10.256/2001, no RE 718.874[7]. No dia 26 de outubro de 2016, o atual relator desse recurso, Ministro Edson Fachin, determinou a suspensão de todos os processos pendentes que tratem sobre essa matéria, conforme determina o art. 1.035, §5º, do novo Código de Processo Civil.

 

Joaquim Basso, Mestre em Direito Agroambiental pela UFMT, especialista em Direito Ambiental pela UCDB, bacharel em Agronomia e Direito, advogado no escritório Cestari & Basso Advocacia, sediado em Campo Grande/MS.

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Notas:

[1] STF – RE 363.852/MG – Rel. Min. Marco Aurélio; Pleno; votação unânime – j. 03/02/2010; DJe 23/04/2010.

Ementa: “[…] CONTRIBUIÇÃO SOCIAL – COMERCIALIZAÇÃO DE BOVINOS – PRODUTORES RURAIS PESSOAS NATURAIS – SUB-ROGAÇÃO – LEI Nº 8.212/91 – ARTIGO 195, INCISO I, DA CARTA FEDERAL – PERÍODO ANTERIOR À EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 20/98 – UNICIDADE DE INCIDÊNCIA – EXCEÇÕES – COFINS E CONTRIBUIÇÃO SOCIAL – PRECEDENTE – INEXISTÊNCIA DE LEI COMPLEMENTAR. Ante o texto constitucional, não subsiste a obrigação tributária sub-rogada do adquirente, presente a venda de bovinos por produtores rurais, pessoas naturais, prevista nos artigos 12, incisos V e VII, 25, incisos I e II, e 30, inciso IV, da Lei nº 8.212/91, com as redações decorrentes das Leis nº 8.540/92 e nº 9.528/97. Aplicação de leis no tempo – considerações”.

[2] STF – RE 596.177 Repercussão Geral: Mérito – Pleno; Rel. Min. Ricardo Lewandowski – j. 01/08/2011; DJe-165, 29/08/2011.

[3] TRF4, ARGINC 2008.70.16.000444-6, CORTE ESPECIAL, Relator ÁLVARO EDUARDO JUNQUEIRA, D.E. 20/07/2011. A título de exemplo, cf. outro julgado mais recente no mesmo sentido: TRF4 5003060-25.2016.404.7003, SEGUNDA TURMA, Relator ROBERTO FERNANDES JÚNIOR, juntado aos autos em 13/10/2016.

[4] A título de exemplo, cf. TRF3 – APELREEX 00044356120104036106, JUIZ CONVOCADO RENATO TONIASSO, Primeira Turma, e-DJF3 Judicial 1 15/07/2016.

[5] A título de exemplo, cf. TRF 5 – APELREEX 00067167420104058000, Desembargador Federal Ivan Lira de Carvalho, Segunda Turma, DJE 08/07/2016, p. 38; e TRF5 – AC 00019192320134058300, Desembargador Federal Flávio Lima, Primeira Turma, DJE 02/05/2014, p. 194.

[6] A título de exemplo, cf. TRF2 – AC 201251010074454, Desembargador Federal LUIZ ANTONIO SOARES, QUARTA TURMA ESPECIALIZADA, E-DJF2R 15/09/2014.

[7] “CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO SOCIAL. EMPREGADOR RURAL PESSOA FÍSICA. RECEITA BRUTA. COMERCIALIZAÇÃO DA PRODUÇÃO. ART. 25 DA LEI 8.212/1991, NA REDAÇÃO DADA PELA LEI 10.256/2001. CONSTITUCIONALIDADE. I – A discussão sobre a constitucionalidade da contribuição a ser recolhida pelo empregador rural pessoa física, prevista no art. 25 da Lei 8.212/1991, com a redação dada pela Lei 10.256/2001, ultrapassa os interesses subjetivos da causa. II – Repercussão geral reconhecida” (STF – RE 718.874 RG, Relator Min. RICARDO LEWANDOWSKI, julgado em 22/08/2013, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-178 DIVULG 10-09-2013 PUBLIC 11-09-2013).

 

Confira a íntegra da decisão:

APELAÇÃO CÍVEL N. 0003540-60.2011.4.01.3701/MA

RELATORA : DESEMBARGADORA FEDERAL MARIA DO CARMO CARDOSO
APELANTE : FAZENDA NACIONAL
PROCURADOR : PR00014823 – CRISTINA LUISA HEDLER
APELADO : NICODEMOS FERREIRA GUIMARAES
ADVOGADO : PI00004400 – ELANO MARTINS COELHO

RELATÓRIO

A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL MARIA DO CARMO CARDOSO (RELATORA):

A presente apelação foi interposta pela FAZENDA NACIONAL à sentença que julgou procedente o pedido formulado em ação de procedimento ordinário ajuizada por NICODEMUS FERREIRA GUIMARÃES, para declarar a inexigibilidade da contribuição prevista no art. 25, I e II, da Lei 8.212/1991, bem como para assegurar ao autor o direito à restituição dos valores indevidamente recolhidos a esse título, no quinquênio anterior à propositura da ação. A União foi condenada ao reembolso das custas adiantadas pelo autor e ao pagamento de honorários advocatícios arbitrados em R$ 2.000,00 (dois mil reais).

A recorrente afirma, em seu apelo, que não foi providenciada a juntada dos documentos indispensáveis à propositura da ação, nem comprovado o efetivo recolhimento do tributo que se pretende repetir. Alega que a ausência de prova da condição da parte autora de empregadora rural pessoa física retira-lhe a legitimidade ativa para o ajuizamento da ação.

Quanto ao mérito, sustenta, no essencial, a constitucionalidade da exação questionada, sobretudo a partir da entrada em vigor da Lei 10.256/2001. Na hipótese de não acolhimento da pretensão recursal, requer: a) seja repristinada a legislação anterior, de modo a restabelecer a obrigatoriedade de recolhimento da contribuição incidente sobre a folha de salários e, em consequência, limitar a restituição à diferença entre a contribuição tida por indevida e aquela revigorada em seu lugar; b) seja reduzida a condenação ao pagamento de honorários advocatícios.

Não foi requerida, nas razões recursais, a apreciação do Agravo de Instrumento 0032974-42.2011.4.01.0000/MA, convertido em retido por meio de decisão prolatada em 29/7/2011.

Não foram apresentadas as contrarrazões.

É o relatório.

VOTO

A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL MARIA DO CARMO CARDOSO (RELATORA):

Inicialmente, não conheço do agravo retido, uma vez que não foi requerida sua apreciação pelo Tribunal, nos moldes exigidos pelo art. 523, § 1º, do CPC de 1973, em vigor à época da interposição do recurso.

Discute-se nos presentes autos a legitimidade da exigência da contribuição devida pelo empregador rural pessoa física, prevista no art. 25, I e II, da Lei 8.212/1991, incidente sobre a receita bruta proveniente do comércio de sua produção, bem como o direito à repetição das quantias indevidamente recolhidas a esse título, observado o prazo prescricional quinquenal.

A documentação juntada aos autos é apta a comprovar a condição da parte autora de empregadora rural pessoa física e também demonstra a retenção da contribuição ora em análise. Reputo-a suficiente, nesse momento processual, para conferir legitimidade à parte autora para a propositura da ação.

De outra parte, os documentos indispensáveis à propositura da ação de repetição de indébito são aqueles hábeis a comprovar a legitimidade ativa ad causam do contribuinte que arcou com o pagamento indevido da exação,  sendo desnecessária a juntada de todos os comprovantes de recolhimento do tributo, providência que deverá ser levada a termo quando da apuração do montante que se pretende restituir, em sede de liquidação do título executivo judicial (REsp 1.111.003/PR, julgado na sistemática dos recursos repetitivos, DJe de 25/5/2009).

Rejeito, portanto, as preliminares suscitadas pela Fazenda Nacional.

Afasto, igualmente, a possibilidade de repristinação invocada pela União, por desbordar dos limites do pedido e da própria lide.

A Lei 9.868/1999, que dispõe sobre o processamento e o julgamento das ações direta de inconstitucionalidade e declaratória de constitucionalidade no STF, prevê, no art. 11, a possibilidade de repristinação apenas para a hipótese de concessão de medida cautelar em ação direta, ou seja, em controle abstrato, em que a eficácia é erga omnes. A declaração de inconstitucionalidade tomada em recurso extraordinário e, portanto, em controle difuso de constitucionalidade, não admite, em regra, o efeito repristinatório.

Deve ser ressaltado, que, no julgamento do referido recurso extraordinário, foi expressamente afastado o pretendido efeito repristinatório suscitado em petição incidental e em embargos de declaração, uma vez que o pedido dos autores restringiu-se ao exame da contribuição proveniente do comércio da produção.

Quanto ao mais, o Plenário do STF, no julgamento do Recurso Extraordinário 363.852/MG, da relatoria do ministro Marco Aurélio, declarou a inconstitucionalidade do art. 1º da Lei 8.540/1992, que deu nova redação aos arts. 12, V; 25, I e II; e 30, IV, da Lei 8.212/1991, com redação atualizada até a Lei 9.528/1997.

A declaração de inconstitucionalidade foi fundamentada no fato de que a incidência da referida exação sobre a comercialização de produtos agrícolas pelo produtor rural, pessoa natural, enseja dupla tributação, ofende o princípio da isonomia e implica a criação de nova fonte de custeio sem edição de lei complementar. O referido acórdão tem a seguinte ementa:

RECURSO EXTRAORDINÁRIO – PRESSUPOSTO ESPECÍFICO – VIOLÊNCIA À CONSTITUIÇÃO – ANÁLISE – CONCLUSÃO.

Porque o Supremo, na análise da violência à Constituição, adota entendimento quanto à matéria de fundo do extraordinário, a conclusão a que chega deságua, conforme sempre sustentou a melhor doutrina – José Carlos Barbosa Moreira -, em provimento ou desprovimento do recurso, sendo impróprias as nomenclaturas conhecimento e não conhecimento.

CONTRIBUIÇÃO SOCIAL – COMERCIALIZAÇÃO DE BOVINOS – PRODUTORES RURAIS PESSOAS NATURAIS – SUB-ROGAÇÃO – LEI Nº 8.212/91 – ARTIGO 195, INCISO I, DA CARTA FEDERAL – PERÍODO ANTERIOR À EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 20/98 – UNICIDADE DE INCIDÊNCIA – EXCEÇÕES – COFINS E CONTRIBUIÇÃO SOCIAL – PRECEDENTE – INEXISTÊNCIA DE LEI COMPLEMENTAR.

Ante o texto constitucional, não subsiste a obrigação tributária sub-rogada do adquirente, presente a venda de bovinos por produtores rurais, pessoas naturais, prevista nos artigos 12, incisos V e VII, 25, incisos I e II, e 30, inciso IV, da Lei nº 8.212/91, com as redações decorrentes das Leis nº 8.540/92 e nº 9.528/97. Aplicação de leis no tempo – considerações.

(Sem grifos no original)

A posição favorável ao contribuinte, adotada nos autos do RE 363852/MG — de que a declaração de inconstitucionalidade decorreu não apenas de vício formal, quanto à necessidade de lei complementar para a criação de nova exação, mas, também, de vícios materiais, consistentes na ofensa ao princípio da isonomia e na duplicidade da tributação —, foi reafirmada no julgamento da Repercussão Geral no RE 596177/RS, cujo acórdão foi publicado em 29/8/2011, e do qual destaco a seguinte passagem, constante do voto do ministro Marco Aurélio:

Senhor Presidente, apenas em atenção ao que foi veiculado da tribuna, consigno que persiste o erro glosado quando do pronunciamento anterior do Tribunal.

Veio à balha não uma lei complementar que atendesse ao artigo 195, § 4º, da Carta Federal, mas uma lei ordinária, a de nº 10.256/2001. E nem se diga que a Emenda Constitucional nº 20 acabou por placitar a utilização da lei ordinária para criação desse tributo, porque apenas alterou o § 8º do art. 195 para expungir a referência a garimpeiro.

A situação, portanto, é idêntica àquela com a qual o Plenário se defrontou — se não me falha a memória, quando do julgamento do Recurso Extraordinário nº 363.852/MG —, e concluiu pelo provimento do recurso do contribuinte.

Não se pode afirmar, portanto, que com a Lei 10.256/2001 a razão de inconstitucionalidade deixou de existir, uma vez que a contribuição ainda está viciada no seu aspecto material.

Deve ser ressaltado, de outra parte, que o sistema jurídico brasileiro não contempla a figura da constitucionalidade superveniente, o que também afasta a tese de que a modificação trazida pela Lei 10.256/2001 seria apta a legitimar a cobrança da exação.

No julgamento do AGRSES 0029131-06.2010.4.01.0000/MT, a Corte Especial deste Tribunal, por maioria, manteve o entendimento de que, quanto ao produtor pessoa física, os incisos I e II do art. 25 ainda têm a redação atualizada até a Lei 9.528/97, de modo que, se as alíquotas e a base de cálculo da contribuição permanecem com a redação antiga, declarada inconstitucional, carece de base legal e constitucional a exigência da contribuição social.

O efeito da declaração de inexigibilidade da contribuição em exame repercute na sistemática prevista para o seu recolhimento — substituição tributária —, de forma que o adquirente dos produtos não deve promover a retenção, na condição de responsável tributário, para posterior repasse à autarquia previdenciária.

O entendimento ora adotado está pacificado nesta 8ª Turma: AC 0000335-05.2015.4.01.3500 (e-DJF1 de 1º/7/2016) e AC 0053133-86.2010.4.01.3800/MG (e-DJF1 de 17/6/2016), entre outros.

Devida a repetição postulada relativamente aos recolhimentos havidos nos cinco anos que antecederam ao ajuizamento da ação, o indébito deverá ser corrigido monetariamente pela taxa SELIC, nos termos do art. 39, § 4º, da Lei 9.250/1995.

Por fim, no que concerne aos honorários advocatícios, entendo que o percentual fixado pelo juízo de origem, diversamente do que sustentado na apelação, não se mostra excessivo ou inadequado, mas sim razoável e condizente com o trabalho desenvolvido, devendo ser mantido.

Ademais, nos casos em que vencida a Fazenda Pública, o julgador não está obrigado a fixar os honorários em percentual sobre o valor da condenação, e pode arbitrá-los sobre valor certo, ou em percentual sobre o valor da causa, atendido o critério da equidade, conforme previsto no art. 20, § 4º, do CPC/1973 (vigente à época da prolação da sentença).

Ante o exposto, não conheço do agravo retido e nego provimento à apelação.

É como voto.

EMENTA

PROCESSUAL. TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. COMERCIALIZAÇÃO DE PRODUTOS RURAIS. ART. 25, I E II, DA LEI 8.212/1991, COM A REDAÇÃO DECORRENTE DAS LEIS 8.540/1992 E 9.528/1997. INCONSTITUCIONALIDADE DECLARADA PELO STF. REPRISTINAÇÃO. DESCABIMENTO. LEI 10.256/2001.

  1. A ausência de requerimento expresso para a apreciação do agravo retido impede o seu conhecimento pelo Tribunal (art. 523, § 1º, do CPC/1973).
  2. A documentação juntada pela parte autora é apta a comprovar sua condição de empregadora rural pessoa física e a retenção da contribuição previdenciária sobre a comercialização de sua produção rural. Desnecessária, para fins de repetição de indébito, a juntada de todos os comprovantes de recolhimento do tributo.
  3. Incabível o efeito repristinatório pretendido pela Fazenda Nacional, por desbordar dos limites do pedido e da própria lide.
  4. O art. 1º da Lei 8.540/1992, que deu nova redação aos arts. 12, V; 25, I e II; e 30, IV, da Lei 8.212/1991, foi declarado inconstitucional pelo STF, ao fundamento de que a incidência da contribuição previdenciária sobre a comercialização de produtos agrícolas pelo empregador rural enseja dupla tributação, ofende o princípio da isonomia e implica a criação de nova fonte de custeio sem edição de lei complementar.
  5. Uma vez que a inconstitucionalidade declarada pelo STF não está fundamentada somente em vício formal — necessidade de lei complementar para a criação de nova exação —, mas também em vícios materiais — ofensa ao princípio da isonomia e duplicidade de tributação —, não há como se afirmar que com a Lei 10.256/2001 a razão de inconstitucionalidade deixou de existir, pois a contribuição ainda está viciada no seu aspecto material.
  6. Agravo retido de que não se conhece.
  7. Apelação a que se nega provimento.


ACÓRDÃO

Decide a Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, não conhecer do agravo retido e negar provimento à apelação, nos termos do voto da relatora.

Brasília/DF, 1º de agosto de 2016.

 

Desembargadora Federal Maria do Carmo Cardoso

Relatora