por Fabiano Cotta de Mello.
Incerteza significa medo. Nosso maior desejo nestes dias de março de 2020 é que esta fase passe, que a incerteza do contágio seja domada, que o medo de um espirro, de um beijo, de um aperto de mão, seja aniquilado pelo progresso da ciência.
Trata-se de uma fase desconfortável, para usar expressão de Bauman, potencializada porque somos os alvos do perigo.
“Todos nós estamos acostumados com ocasiões desagradáveis e desconfortáveis em que as coisas ou pessoas nos causam preocupações que não esperaríamos, e certamente não desejaríamos, que causassem. O que torna essas adversidades (“golpes do destino”, como às vezes as chamamos) particularmente incômodas é que elas chegam sem aviso — não esperamos que elas cheguem, e com muita frequência não acreditamos que possam estar perto. Elas nos atingem, como dizemos “como um raio em céu azul” — de modo que não podemos tomar precauções e evitar a catástrofe, já que ninguém espera que caia um raio quando o céu está sem nuvens…”.[1]
Nosso “raio em céu azul” atende pela denominação COVID-19, colocou o mundo em situações de isolamento e de quarentena e, no âmbito jurídico, está causando o descumprimento de obrigações contratuais previamente estabelecidas, gerando insegurança jurídica e flagrantes perdas econômicas, a fim de evitar a contaminação ou a propagação do coronavírus e, de conseguinte, o colapso dos sistemas de saúde mundo afora.
A lei excepcional de 6 de fevereiro de 2020, tendo por finalidade a promoção e a preservação da saúde pública, ameaçadas pela emergência de saúde pública de importância internacional que se tornou o surto de coronavírus, além de instituir medidas que restringem a liberdade individual como, v.g., a realização compulsória de isolamento, de quarentena, de exames médicos, testes laboratoriais, coleta de amostras clínicas, vacinação e outras medidas profiláticas ou tratamentos médicos específicos, sob pena de responsabilização penal, civil e administrativa, estabeleceu também o dever legal de toda a pessoa colaborar com as autoridades sanitárias comunicando imediatamente possíveis contatos com agentes infecciosos do coronavírus e a circulação em áreas consideradas como regiões de contaminação.[2]
O dever legal estende-se aos órgãos públicos e às pessoas jurídicas de direito público e de direito privado, que deverão compartilhar com as autoridades sanitárias dados essenciais à identificação de pessoas infectadas ou com suspeita de infecção pelo coronavírus.
Também como medidas para a contenção da circulação do vírus, governos como o do Distrito Federal, de São Paulo, do Rio de Janeiro, de Santa Catarina e do Mato Grosso impuseram restrições à liberdade de circulação e à propriedade privada que gerarão o descumprimento de obrigações contratadas antes que o COVID-19 se tornasse uma situação de calamidade pública no Brasil.
No dia 20 de março, em votação virtual, o Congresso Nacional aprovou decreto de reconhecimento de calamidade pública no Brasil.
Já se pode antever setores afetados diretamente pelas medidas estatais de combate ao coronavírus. A título exemplificativo companhias aéreas, shoppings centers e o comércio em geral, proprietários e estudantes de redes de ensino privada, restaurantes, academias, pessoas que necessitam do transporte público para se deslocarem ao trabalho e não tem possibilidade de exercer trabalho de forma não presencial, são alguns exemplos evidentes.
O governo do Distrito Federal suspendeu eventos, de qualquer natureza, que exijam licença do Poder Público, com público superior a 100 (cem) pessoas; atividades coletivas, cinema e teatro, serviços de academias de ginástica e museus, atividades educacionais em todas as escolas, universidades e faculdades, inclusive nas redes de ensino privada; eventos esportivos com público presente; além de determinar aos bares e restaurantes a observância na organização de suas mesas da distância mínima de dois metros entre elas.[3]
O Estado de São Paulo recomendou ao setor privado estadual a suspensão das aulas de educação básica e superior e, em um primeiro momento, dos eventos com público superior a 500 (quinhentas) pessoas. Dias depois, a recomendação foi ampliada para que o setor privado suspenda, por até 30 (trinta) dias, eventos com aglomerações de pessoas em qualquer número, incluída a programação de todos os equipamentos culturais e esportivos. [4] Por sua vez, o Município de São Paulo, a partir do dia 17 de março, declarou situação de emergência e vedou a expedição de novos alvarás de autorização para eventos, bem como determinou a revogação daqueles já expedidos.
No sábado, dia 21.03.2020, quando o Estado de São Paulo registra 15 (quinze) mortes pelo coronavírus, o governador Jorge Doria determinou quarentena, pelo prazo de 15 dias, a partir de 24 de março, obrigando o fechamento do comércio com atendimento presencial, inclusive bares, restaurantes, cafés e lanchonetes, e a manutenção apenas dos serviços essenciais de alimentação, tais como supermercados, hipermercados, açougues e padarias; serviços de abastecimento como transportadoras, armazéns, postos de gasolina, oficinas, transporte público, táxis, aplicativos de transporte, serviços de call center, pet shops e bancas de jornais; e serviços de saúde, bancos, limpeza e segurança. Foi assegurado, contudo, a empresas como restaurantes, bares e cafés a possibilidade de continuar operando com a entrega a domicílio.[5]
O governador do Rio de Janeiro, além de determinar, inclusive ao setor privado, a suspensão: de aulas, eventos esportivos, shows, feiras científicas, cinemas, teatros, entre outros; do funcionamento de shoppings e centros comerciais; da frequência a praias, lagoas, rios e piscinas públicas; do serviço público de transporte interestadual de passageiros; da circulação de carros de aplicativos de transporte em a capital e outros municípios, chegou ao ponto de determinar a suspensão, por 15 (quinze) dias, a partir de sábado (21.03.2020), da operação aeroviária de passageiros internacionais ou nacionais no Estado.[6]
O Estado de Santa Catarina instituiu regime de quarentena em todo o território catarinense e, para tanto, suspendeu a circulação de veículos de transporte coletivo urbano municipal, intermunicipal e interestadual de passageiros; as atividades e serviços privados não essenciais, como, v.g., de academias, shopping centers, restaurantes e comércio em geral; a entrada de novos hóspedes no setor hoteleiro; quaisquer eventos e reuniões, de qualquer natureza, de caráter público ou privado, incluídas excursões, cursos presenciais, missas e cultos religiosos.[7]
No Estado de Mato Grosso, inicialmente, o Governador recomendou ao setor privado a suspensão de eventos em ambientes fechados com mais de 200 (duzentas) pessoas. Dois dias depois, em novo decreto, recomendou a suspensão de eventos, feiras, cinemas, clubes, missas, cultos, bares, restaurantes, boates, e congêneres, bem como as atividades de academias de clubes esportivos pelo período de 30 (trinta) dias, prorrogáveis, além de autorizar as concessionárias e permissionárias de serviço público de transporte coletivo intermunicipal a suspender suas atividades a partir do dia 23 de março de 2020.[8]
Além dos afetados diretamente pelas necessárias medidas de emergência sanitária, o número dos que serão indiretamente atingidos é muito maior, podendo-se pensar daquele que perderá o emprego porque o patrão não tem mais clientes e, de conseguinte, não aufere mais renda com seu negócio, àquele que é o proprietário do imóvel que o restaurante com atividade suspensa ocupa que, devido a insustentabilidade econômica decorrente da proibição legal de funcionar, não conseguirá pagar o aluguel. A mesma lógica vale para aquele empreendedor que locou determinado espaço para um evento e, por imposição do poder público, teve sua realização impossibilitada e, de conseguinte, não terá ele meios para honrar a locação, além de tal contrato de locação do espaço ter perdido sua finalidade.
Portanto, a difícil quadra em que nos encontramos devido à pandemia do coronavírus, impondo aos empreendedores restrições à livre iniciativa e paralisação temporária de serviços públicos e privados, gerarão inúmeros casos de descumprimento contratual.
Está-se diante de uma situação excepcional e superveniente em que a execução de negócios jurídicos já contratados, desde um contrato de trabalho até complexas avenças para a comercialização internacional de grãos para exportação, não estão mais sob controle das partes contratantes.
Inadimplementos contratuais surgirão e, certamente, serão levados à análise dos operadores do direito, sejam aos tribunais arbitrais, aos núcleos permanentes de solução consensual de conflitos ou em forma de litígio aos tribunais judiciais.
A questão será definir como se repartirão entre os contratantes os prejuízos decorrentes dessa situação excepcional e superveniente.
O Código Civil brasileiro, ao tratar do inadimplemento das obrigações, estipula que o descumprimento contratual resolve-se em perdas e danos, respondendo por ela todos os bens do devedor. Ainda, nos contratos onerosos, responde cada uma das partes por culpa, salvo as exceções previstas em lei.[9]
Como exceção expressa à obrigação de indenizar, dispõe o artigo 393 que o devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou força maior, salvo se expressamente tiver se responsabilizado por eles.[10]
Portanto, a primeira observação necessária é no sentido de que a repartição dos danos decorrentes do inadimplemento contratual, ainda que verificado caso fortuito ou de força maior, será do devedor se ele houver, contratual e expressamente, por eles se responsabilizado.
A contrário senso, também observa-se que verificado o caso fortuito ou de força maior, sem expressa e prévia assunção de responsabilidade pelo contratante devedor, excluída estará sua responsabilidade civil contratual pelo inadimplemento, pois esse não teve como causa a vontade do contratante (trata-se de um fortuito externo à relação contratual).
Ressalte-se, como terceira observação, que o fortuito externo opera ex lege, não sendo necessário que a hipótese de descumprimento contratual por doença, epidemia ou pandemia, por exemplo, esteja expressa no instrumento contratual.[11]
Nesse contexto normativo, a tese jurídica para justificar a quebra de contratos em decorrência da pandemia do coronavírus poderá ser a do caso fortuito ou de força maior. Todavia, não é certo que esse acontecimento será reconhecido pelos tribunais como excludente de responsabilização do contratante inadimplente, autorizando a extinção do pacto, mormente porque demandará, em cada caso concreto, o exame de prova sobre a demonstração do nexo de causalidade entre a pandemia de coronavírus e o inadimplemento contratual, bem como a prova de que o acontecimento gerou uma impossibilidade absoluta de cumprir a obrigação.
Frisa-se que a existência de uma impossibilidade relativa de cumprir a obrigação não configura a excludente do caso fortuito ou de força maior. Porém, pode autorizar a aplicação da teoria da imprevisão e, de conseguinte, a revisão do contrato. Recorde-se que nos contratos de execução continuada ou de execução diferida, quando a superveniência de eventos imprevisíveis e extraordinários tornar a prestação de uma das partes exageradamente onerosa, com extrema vantagem para a outra, poderá o devedor pedir a revisão ou a resolução do contrato. [12]
Tendo em vista a inexistência de definição única dos termos caso fortuito ou de força maior, utiliza-se, aqui, ambos como sinônimos.
Tratam-se de conceitos jurídicos que abrangem todo acontecimento inevitável, necessário, cujos efeitos não seria dado a nenhum homem prudente prevenir ou obstar.[13]
Na precisa lição de Arnaldo Medeiros da Fonseca,
da própria noção do caso fortuito decorrem os dois elementos indispensáveis à sua caracterização: um interno, de ordem objetiva: a inevitabilidade, ou impossibilidade de impedir ou resistir ao acontecimento, objetivamente considerado, tendo em vista as possibilidades humanas, atendidas em toda a sua generalidade, sem nenhuma consideração pelas condições pessoais do indivíduo cuja responsabilidade está em causa; outro externo, de ordem subjetiva: a ausência de culpa.[14]
Aqui surge uma nova incerteza às relações contratuais afetadas pelo coronavírus: O que os operadores do direito entenderão por acontecimento inevitável apto a caracterizar caso fortuito ou de força maior?
Como já referido, nos termos da legislação que rege a matéria, o caso fortuito ou de força maior verifica-se no fato necessário, cujos efeitos não era possível evitar ou impedir (CC/2002, art. 393, parágrafo único). Todavia, face à vaguidade da linguagem jurídica, as decisões judiciais não são um produto estritamente lógico da norma. E isso possibilitará que o poder judiciário, sem ferir a norma legal ou a ordem jurídica, atribua a um conceito jurídico indeterminado – “inevitabilidade do acontecimento” – interpretação adequada à nova realidade que será imposta à toda a sociedade após a pandemia do Novo Coronavírus.[15]
Uma fórmula proposta de fórmula invocável nos julgamentos futuros é a seguinte:
O caso fortuito ou de força maior capaz de excluir a responsabilidade do contratante pelos prejuízos resultantes do descumprimento da obrigação contratada, não prescinde a demonstração, à saciedade, de que o dano não teria sido evitado mesmo se tomadas pelo devedor todas as medidas razoavelmente exigidas para a execução do contrato em decorrência da pandemia do COVID-19.
Construções pretorianas mais ou menos flexíveis surgirão e só serão possíveis porque a inevitabilidade do acontecimento — no caso, a pandemia do COVID-19 —, inclui-se dentre aquelas tantas expressões dotadas de uma vagueza socialmente típica[16] que, por exprimirem um conceito valorativo, devem sempre ser precisadas pelo juiz quando de sua aplicação[17] [18].
A vagueza semântica dessas normas apresenta-se no direito positivo como uma verdadeira janela, facultando ao interprete a perseguição da solução mais justa e juridicamente sustentável na ordem fundamental do Estado, compatibilizando o desiderato do Direito – que é a Justiça – com a necessária legitimação da atividade judicante no ordem jurídica em vigor (ordem constitucional).
Não se desconhece que essa vagueza provoca compreensível insegurança para os contratantes, pois a norma de direito material que trata do caso fortuito ou de força maior, apesar de afirmar que a excludente “verifica-se no fato necessário, cujos efeitos não era possível evitar ou impedir”, não descreve que fatos são estes e, tanto menos, o que o juiz deve entender por acontecimento inevitável.
A expressão inevitabilidade do acontecimento, elemento caracterizador do caso fortuito ou de força maior, é dotada de uma imprecisão de significado que exige que o juiz, antes de reconhecê-la no caso concreto, verifique se não houve mudança de sua valoração na atual conjuntura, v.g., na conjuntura de uma emergência de saúde pública de importância internacional como se tornou o surto de coronavírus, com eventual alteração de sua conotação face às novas exigências sociais e/ou diante dos novos recursos tecnológicos surgidos.
Entendemos que a emergência de saúde pública pela qual estamos passando poderá ser invocada e excluirá a responsabilização civil contratual de muitos contratantes que não conseguirem adimplir obrigações contratadas antes do surto do Novo Coronavírus, desde que comprovem o nexo de causalidade entre o descumprimento contratual e o surto de COVID-19, bem como a impossibilidade absoluta de cumprir a obrigação contratada.
Outra tese jurídica eximente com a qual se pode afastar o descumprimento contratual será o factum principis. Vale dizer, a existência de uma proibição estatal que inviabilize o cumprimento da obrigação contratual.[19]
Assim como o caso fortuito ou de força maior, o factum principis é uma fato jurídico extraordinário capaz de modificar os efeitos de relações jurídicas já existentes à época do seu surgimento, apto, v.g., a escusar o contratante devedor do cumprimento de obrigação estipulada.
O factum principis é um ato de império do Estado que, v.g., para fins de tutelar o interesse público, interfere em relações jurídicas privadas. O exemplo mais comum é a desapropriação promovida pelo poder público. Contudo, entende-se que as restrições e proibições impostas pelos governos às relações negociais privadas, ainda que a fim promover e preservar a saúde pública, contendo a propagação do surto de coronavírus, também poderão ser caracterizadas como factum principis para excluir responsabilidades por descumprimentos contratuais quando a prestação se tornou objetivamente impossível ao devedor.
As medidas de enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do Novo Coronavírus tomadas através de lei ou de decretos pelos governos federal, estaduais, distrital e municipais constituem argumento suficiente à exclusão da responsabilidade do contratante por descumprimento da avença. E o argumento é muito simples. Se o contratante cumprisse o contratado estaria incorrendo em manifesta ilegalidade.
Por exemplo, se o governo de um dos Estados da Federação proíbe a realização de qualquer evento com público acima de 10 (dez) pessoas, inviabilizado está o cumprimento de um contrato, por exemplo, para a apresentação de um show ou uma peça de teatro com público previsto de 400 (quatrocentas) pessoas. A justificativa para o inadimplemento contratual não será o caso fortuito ou de força maior, mas sim a impossibilidade de cumprir o contratado face à uma restrição legal imposta de forma cogente pelo Poder Público (factum principis).[20]
Portanto, sustenta-se que a configuração da pandemia do COVID-19 como caso fortuito ou de força maior será uma das principais teses jurídicas a ser defendida nos tribunais pátrios para excluir a responsabilidade do contratante que se viu absolutamente impossibilitado de cumprir a obrigação previamente contratada. Todavia, também há que se pensar no factum principis como fundamento para a exclusão da responsabilidade, materializado nos atos normativos expedidos por vários governos da federação impondo medidas restritivas à liberdade e à propriedade privada e, de conseguinte, inviabilizando a execução de contratos pré-existentes, sob pena de o contratante praticar ato manifestamente ilegal.
A vida não pode parar. Em meio ao surto viral, quem tem a graça de poder trabalhar em casa e cumprir o isolamento ou a quarentena necessários à preservação da saúde de todos, já pensa nos dias que virão. Nossa única certeza é que tudo passa.
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Notas:
[1] BAUMAN, Zygmunt, Tempos líquidos / Zygmunt Bauman; tradução Carlos Alberto Medeiros. – Rio de Janeiro: Zahar, 2007, p. 99.
[2] Lei nº 13.979, de 6 de fevereiro de 2020, regulamentada pela Portaria nº 356, de 11 de março de 2020.
[3] Decreto nº 40.520, de 14 de março de 2020, que dispõe sobre as medidas de enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do novo coronavírus, e dá outras providências.
[4] Decreto nº 64.862, de 13 de março de 2020, que dispõe sobre a adoção, no âmbito da Administração Pública direta e indireta, de medidas temporárias e emergenciais de prevenção ao contágio do COVID-19 (Novo Coronavírus), bem como sobre recomendações no setor privado estadual. Posteriormente alterado pelo Decreto nº 64.864, de 16 de março de 2020, para ampliar as medidas de prevenção.
[5] Quando da finalização desse artigo o decreto ainda havia sido publicado em edição extraordinária do Diário Oficial do Estado de São Paulo. Informação disponível em: https://www.saopaulo.sp.gov.br/ultimas. Acesso em: 22 de março de 2020.
[6] Decreto nº 46. 970, de 13 de março de 2020, posteriormente ampliado pelo decreto de 19 de março de 2020.
[7] Decreto nº 515, de 17 de março de 2020, que declara situação de emergência em todo o território catarinense, nos termos do COBRADE nº 1.5.1.1.0 – doenças infecciosas virais, para fins de prevenção e enfrentamento à COVID-19, e estabelece outras providências.
[8] Decreto nº413, de 18 de março de 2020, que dispõe sobre as novas medidas para enfrentamento do coronavírus e altera do Decreto nº 407, de 16 de março de 2020.
[9] CC/2002, arts. 389, 391 e 392.
[10] Art. 393. O devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou força maior, se expressamente não se houver por eles responsabilizado.
Parágrafo único. O caso fortuito ou de força maior verifica-se no fato necessário, cujos efeitos não era possível evitar ou impedir.
[11] Neste sentido: RECURSO INOMINADO 71003034881, 1ª Turma Recursal Cível dos Juizados Especiais Cíveis do Rio Grande do Sul, rel. Dr. Ricardo Torres Hermann, julgado em 14.04.2011.
[12] Vide: art. 478 e seguintes do CC/2002.
[13] Na dicção legal do parágrafo único do art. 393 do Código Civil, “O caso fortuito ou de força maior verifica-se no fato necessário, cujos efeitos não era possível evitar ou impedir”.
[14] FONSECA, Arnaldo Medeiros da. Caso Fortuito e Teoria da Imprevisão. 2. ed. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1943, p. 142 e 143.
[15] Mesmo antes da entrada em vigor do CC/2202, RUY ROSADO DE AGUIAR JR. já advertia que o art. 393 continha expressões com imprecisão terminológica que só poderiam ser precisadas e concretizadas na sentença (O Poder Judiciário e a Concretização das Cláusulas Gerais: Limites e Responsabilidade, Revista da Faculdade de Direito da UFRGS, vol. 18, Porto Alegre: UFRGS, 2000, p. 221-228).
[16] LUZZATI, Claudio. “La Vagueza delle norme – Un’analisi del linguaggio giuridico”, Milão: Giuffrè, 1990, p. 70.
[17] Segundo CANARIS, as normas que carecem de preenchimento com valorações para serem concretizadas, tais como a boa-fé, os bons costumes, a exigibilidade, o cuidado necessário no tráfego, etc, são insuscetíveis de dogmatização, uma vez o sentido/significado dos termos que as compõem é complexo e variável (Pensamento Sistemático e Conceito de Sistema na Ciência do Direito, 2. ed., Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1996, p. 44).
[18] “Todos sabemos que os termos através dos quais o legislador se expressa contêm conceitos indeterminados, discricionários e cláusulas gerais, assim como referidos na lição de Engisch (Introdução ao Pensamento Jurídico, 2ª ed., p. 170 e segs.), também examinados e classificados por Warat (Mitos e Teorias na Interpretação da Lei, p. 96 e segs.). O preenchimento dessa vaguidão leva o Juiz a atribuir à lei o conteúdo que considera o mais adequado, exercendo então atividade eminentemente criadora”, AGUIAR JR. (ob. cit.). No mesmo diapasão, CLÓVIS DO COUTO E SILVA (O Direito Civil em perspectiva histórica e visão de futuro, Revista da AJURIS nº 40, ano XIV, 1987, julho, p. 128-149).
[19] Parte da doutrina que distingue caso fortuito e força maior classifica o fato do príncipe como modalidade de força maior (acontecimento inevitável decorrente de ação humana de autoridades públicas).
[20] Com base no direito do common law, Nelson Rosenvald anota que as restrições estatais estabelecidas para conter o coronavírus podem estar contempladas na doutrina da “frustration”:
A ‘frustation’ atuará em circunstâncias muito limitadas, intervindo para eximir justificadamente a performance do contratante. A lei exige um evento superveniente que atinja a própria raiz do contrato – tornando-o física ou comercialmente impossível o seu cumprimento – para além do que foi contemplado pelas partes, sendo que nenhuma delas foi responsável pelo evento. Como o evento precisa ser imprevisto, se as partes tiverem aventado tal eventualidade, ele não mais será imprevisível. As restrições estabelecidas para conter o coronavírus provavelmente atendem aos critérios exigidos para evidenciar a “frustration”, permitindo que um fornecedor evite a responsabilidade por perdas causadas por sua incapacidade de executar o contrato. Impossibilidade (por perda superveniente de objeto) e ilegalidade (performance proibida) são exemplos clássicos de “frustration”, assim como o cancelamento de um evento esperado (os chamados “coronation cases” decorrentes da coroação cancelada do rei Eduardo VII), frustrando a finalidade subjacente ao contrato. Igualmente, uma conferência cancelada pode justificar a execução de contratos relacionados, se esses contratos subjacentes forem concebidos por ambas as partes com o único objetivo do evento (in Os impactos do coronavírus na responsabilidade contratual e aquiliana. Disponível em: https://www.nelsonrosenvald.info/single-post/2020/03/06/OS-IMPACTOS-DO-CORONAVIRUS-NA-RESPONSABILIDADE-CONTRATUAL-E-AQUILIANA. Acesso em: 19 de março de 2020).