Direito Agrário

Responsabilidade do produtor rural em razão de acidente de trabalho sofrido pelos empregados rurais

Direito Agrário

Duas notícias de julgados envolvendo a responsabilidade de produtores rurais em face de acidente sofrido pelos vaqueiros (empregados rurais) tiveram destaque no meio jurídico, expondo a divergência jurídica acerca do tipo de responsabilidade dos produtores decorrente do acidente de trabalho. A primeira delas diz respeito a julgamento noticiado pelo TRT da 3ª Região, no qual se considerou que o proprietário deve ser responsabilizado por acidente de vaqueiro mesmo sem ter culpa. A outra, é relativa a decisão da 4ª Turma do TST, que considerou que o produtor rural não responde pelo acidente de trabalho sofrido por vaqueiro que caiu de uma mula, após ter sido atingido por uma mula.

Nota de DireitoAgrário.com:

“Diante a contradição de entendimento sobre a incidência de responsabilidade civil do empregador, se objetiva ou subjetiva, ao comparar as decisões do TRT da 3ª Região e do TST, solidarizamos ao Tribunal Regional, conforme explicações adiante. A decisão do TRT, proferida pela juíza Simey Rodrigues, considera os três requisitos essenciais caracterizadores da responsabilidade: a conduta (culposa, em regra), o dano propriamente dito e o nexo causal entre esses dois elementos. Ocorre que, diante comando explícito do artigo 936 do Código Civil (O dono, ou detentor, do animal ressarcirá o dano por este causado, se não provar culpa da vítima ou força maior) deve ser interpretado em conjunto com o artigo 927, parágrafo único, do mesmo diploma (Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem). A Lei Complementar 95/98 determina, como anota Arthur Marinho, “(…) parágrafo sempre foi, numa lei, disposição secundária de um artigo em que se explica ou modifica a disposição principal“. A juíza do TRT foi atenta ao fato de existir lei específica regulamentando a profissão de vaqueiro (Lei 12.870/13) satisfazendo, então, a disposição do parágrafo único do artigo 927 do Código Civil, decidindo, ao nosso sentir, corretamente pela responsabilidade objetiva”.

Por Rodrigo Borges de Barros, advogado e professor de Direito Agrário, Ambiental, Internacional e Urbanístico; Especialista, Mestre e Doutorando. (E-mail: rodrigo@barrosenogueira.adv.br)

Vejamos, abaixo, as respectivas notícias:

1- Notícia publicada pelo TRT3 – entendimento pela responsabilidade objetiva do empregador rural:

“A atividade de vaqueiro, que inclui montaria, lida e trato com animais, é considerada atividade de risco, em razão do perigo a que expõe o trabalhador. Assim, é objetiva a responsabilidade civil do empregador rural em relação a acidente do trabalho que venha a ocorrer com o empregado no exercício dessa função, aplicando-se, no caso, o parágrafo primeiro do art. 927 do Código Civil. Em outras palavras, ainda que não tenha tido culpa no evento, o empregador é obrigado a indenizar o vaqueiro pelos danos causados por acidente que ele sofreu no trabalho, por se tratar de atividade que, por sua natureza, expõe o trabalhador ao perigo.

Foi justamente esse o quadro encontrado pela juíza Simey Rodrigues, em sua atuação na Vara do Trabalho de Unaí/MG, ao analisar uma ação trabalhista proposta por um reclamante, que pretendia ser indenizado por danos morais e materiais em razão de acidente que sofreu quando trabalhava como vaqueiro na fazenda do réu.

Ao examinar as provas, a magistrada constatou que o vaqueiro, de fato, foi vítima de acidente do trabalho, quando, certo dia, lidando com gado na fazenda do réu, o cavalo que montava se assustou e o derrubou da sela, causando-lhe fratura no cotovelo e lesão no ombro. Conforme observou a juíza, houve, inclusive, emissão de CAT (Comunicação de Acidente do Trabalho) e o reclamante foi afastado pelo INSS, com recebimento de auxílio-doença-acidentário.

Do mesmo modo, a julgadora não teve dúvida quanto ao dano que o acidente causou ao trabalhador, com base no laudo de perito médico que, embora considerando-o apto para desenvolver o trabalho de vaqueiro, diagnosticou a presença de ‘sequelas permanentes de traumatismo no cotovelo esquerdo, com redução da capacidade de trabalho avaliada em 6,25% de acordo com Tabela da SUSEP’.

Diante desse quadro, a magistrada aplicou ao caso o artigo 936 do Código Civil, que dispõe que: ‘O dono, ou detentor, do animal ressarcirá o dano por este causado, se não provar culpa da vítima ou força maior’. Ela explicou que essa norma legal é expressa ao estabelecer a responsabilidade objetiva do dono do animal que, por fato seu, causar dano a terceiro, além de ter plena incidência ao contrato de trabalho, como, inclusive, já reconhecido em decisões do TST e também do TRT mineiro.

E, na visão da juíza, atividade de vaqueiro exercida pelo reclamante (regida pela Lei 12.870/13) implica em risco maior para os trabalhadores que lidam com animais de grande porte, instáveis por natureza e que, por isso, aumentam a possibilidade de acidentes em seu manejo diário, circunstâncias que reforçam a responsabilidade objetiva do fazendeiro. Ela explicou que somente poderia haver a exclusão da responsabilidade do dono do animal que exerce atividade econômica de risco na ocorrência de culpa exclusiva da vítima ou de força maior (artigo 936 do CCB), o que não foi demonstrado pelo réu.

Além disso, ressaltou a juíza que o artigo 501 da CLT estabelece como força maior todo acontecimento inevitável, em relação à vontade do empregador, para o qual ele não contribuiu, direta ou indiretamente e, ainda, que não pudesse ser previsto por ele. ‘Queda de animal de grande porte utilizado como instrumento de trabalho está longe de ser imprevisível e pode ser sempre evitada com a adequada capacitação do empregado. Além do mais, para a exclusão da responsabilidade por força maior, o fato imprevisível não pode estar relacionado com a atividade de risco, como se deu no caso’, frisou a julgadora.

Por essas razões, a magistrada condenou o réu a pagar ao trabalhador indenização equivalente à pensão mensal de 6,25% do salário mínimo (conforme a redução da capacitada apurada em perícia), inclusive em relação à gratificação natalina, contada da data do acidente (em 14.03.14) até a idade de 65 anos do trabalhador, em parcela única, nos termos do art. 950, parágrafo único, do Código Civil.

Dano material

O reclamante também pediu o ressarcimento dos gastos com tratamento médico, inclusive futuros, medicamentos, etc.. Mas, tendo em vista a existência de serviço público de saúde (SUS) para eventual tratamento médico, fisioterápico e hospitalar, ao notar que o reclamante não fez prova das despesas que alegou, a juíza indeferiu o ressarcimento pretendido.

Entretanto, pelo fato do reclamante residir em Unaí e ter obtido o benefício previdenciário em agência do INSS localizada em João Pinheiro/MG, a magistrada condenou o réu a ressarcir as despesas comprovadas com o deslocamento do trabalhador entre as duas cidades.

Dano moral

Para a juíza, a redução da capacidade do reclamante, provocada por acidente no curso da jornada por fato de animal, em atividade de risco, atingiu a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem do jovem trabalhador. E, diante do sofrimento imposto com a menor possibilidade de ascensão profissional e até de recolocação no mercado de trabalho, ela concluiu pela existência do dano moral que, conforme ressaltou, decorre do próprio fato e é presumível, porque ínsito ao homem mediano (art. 334 do CPC). Assim, condenou o reclamado a pagar ao reclamante indenização por dano moral no valor de R$15.000,00.

Recurso do réu

O reclamado recorreu da sentença, mas a 5ª Turma do TRT-MG manteve o entendimento da juíza, quanto à obrigação do fazendeiro de reparar os danos materiais e morais que o acidente de trabalho causou ao reclamante.

Mas, a Turma decidiu reformar a sentença, para reduzir o valor fixado pela reparação do dano moral, de R$ 15.000,00, para R$8.000,00. As razões apresentadas foram que a compensação pecuniária deve ser fixada com moderação e razoabilidade, proporcionalmente ao grau de culpa dos envolvidos. E, no caso, a responsabilidade do reclamado não passou pela apuração de culpa na ocorrência do acidente, já que é objetiva”.

Fonte: TRT3, 17/02/2013 (Processo nº 0000868-84.2014.5.03.0096 ED ).

 

2- Notícia do TST – entendimento pela responsabilidade subjetiva do empregador rural:

 

“Uma produtora rural de Santa Maria das Barreiras (PA) foi isenta de culpa no acidente de trabalho em que um vaqueiro fraturou a clavícula ao cair de uma mula, após ser atingido por uma vaca. A Quarta Turma do Tribunal Superior do Trabalho não proveu agravo do trabalhador e manteve a decisão que afastou a responsabilidade da empregadora, pois não ficou comprovada ação ou omissão de sua parte no acidente causado pelo animal.

A mula que o trabalhador montava saltou ao ser atingida por uma vaca laçada por outro vaqueiro, derrubando-o no chão e caindo sobre ele. Na reclamação, o vaqueiro alegou que o acidente ocorreu porque a mula não era domada. A defesa da produtora rural, porém, assegurou que, se o animal não fosse domado, o vaqueiro não teria conseguido selá-lo e montá-lo.

O juízo da Vara do Trabalho de Redenção (PA) considerou que a propriedade rural não tomou os devidos cuidados para evitar acidentes, pois não tinha domador à época do acidente. “Não há como averiguar se o animal é manso somente na hora da compra”, afirmou a sentença, que condenou a empregadora em R$ 30 mil por danos morais.

O Tribunal Regional do Trabalho da 8ª Região (PA-AP) excluiu a condenação por danos morais, pois considerou que não ficou comprovada a culpa da fazenda no acidente causado por um animal, frisando que ‘não é todo e qualquer acidente do trabalho que gera o dever de indenizar’.

Ao analisar o agravo de instrumento pelo qual o vaqueiro pretendia que o caso fosse examinado pelo TST, a relatora, desembargadora convocada Cilene Ferreira Amaro Santos, observou que, segundo a instância regional, o acidente porque a vaca atingiu a mula, e não pelo fato de o animal montado não ser domado. Ela ainda ressaltou que não consta nos autos nenhuma informação que comprove que o vaqueiro desenvolvia atividade de risco na fazenda para atrair a aplicação de responsabilidade objetiva do empregador. ‘No Direito do Trabalho, a responsabilidade do empregador é, em regra, subjetiva’, concluiu.

A decisão foi unânime”.

Fonte: TST, 15/03/2016 (Alessandro Jacó/CF).

Processo: AIRR-1606-70.2011.5.08.0118

Segue a íntegra da decisão do TST:

 

Ementa:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. ACIDENTE DE TRABALHO. VAQUEIRO. QUEDA DE MULA ATINGIDA POR OUTRO ANIMAL. I. Não há violação do art. 927, parágrafo único, do Código Civil. No direito do trabalho, a responsabilidade do empregador é, em regra, subjetiva (art. 7º, XXVIII, da Constituição Federal de 1988), de modo que a correspondência com a norma civil deve ser feita com o art. 186 do Código Civil de 2002 (responsabilidade subjetiva), e não com o art. 927, parágrafo único, do mesmo diploma legal (responsabilidade objetiva pela teoria do risco). Ademais, não consta do acórdão regional nenhuma informação de que a Reclamada desenvolve atividade de risco. Ao contrário, a Corte Regional consignou que “o autor exercia a função de vaqueiro na reclamada, o que não constitui por si só, uma atividade de risco, capaz de atrair a aplicação da responsabilidade objetiva do empregador”. II. Também não procede a indicada ofensa aos arts. 5º, V, e 7º, XXVIII, da CF/88 e 186 do CC/2002, pois o Tribunal Regional entendeu que não houve dolo ou culpa da Reclamada no infortúnio ocorrido com o Reclamante, registrando que ele “caiu em virtude de a mula ter sido atingida por outro animal, e não porque a mula montada por ele não era domada, como quis fazer crer na sua inicial. De toda forma, não se verificam nos autos indícios de qualquer atitude ilícita, que possa caracterizar dolo ou culpa da reclamada pelo acidente”. III. Agravo de instrumento de que se conhece e a que se nega provimento.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento em Recurso de Revista n° TST-AIRR-1606-70.2011.5.08.0118, em que é Agravante TEÓFILO JOSÉ NOGUEIRA e são Agravadas LUCIANA DUCA COSTA e FAZENDA NOVA ARAGUAIA.

O Vice-Presidente do Tribunal Regional do Trabalho da Oitava Região denegou seguimento ao recurso de revista interposto pelo Reclamante, o que ensejou a interposição do presente agravo de instrumento.

As Reclamadas-Agravadas (LUCIANA e FAZENDA NOVA ARAGUAIA) não apresentaram contraminuta ao agravo de instrumento nem contrarrazões ao recurso de revista (conforme certidão à fl. 365).

Os autos não foram remetidos ao Ministério Público do Trabalho.

É o relatório.

V O T O

1. CONHECIMENTO

Atendidos os pressupostos legais de admissibilidade do agravo de instrumento, dele conheço.

2. MÉRITO

A decisão denegatória está assim fundamentada:

“PRESSUPOSTOS INTRÍNSECOS

RESPONSABILIDADE CIVIL DO EMPREGADOR / INDENIZAÇAO POR DANO MORAL.

Alegação(ões):

– afronta direta e literal ao(s) art(s). 5º, V, 7º, I e XXVIII, da CF/1988.

– violação ao(s) artigo(s) 186 e 927 do Código Civil.

– divergência jurisprudencial. Alega o recorrente que a r. sentença, com base no conjunto probatório que consta do processo, ou seja, depoimento das partes e testemunhas, provas documentais e perícia, julgou procedente a parcela de indenização compensatória por danos morais, no valor de R$ 30.000,00, no entanto, o v. acórdão excluiu a parcela da condenação, pois responsabilizou o obreiro pelo acidente de trabalho ocorrido. Cita que em decorrência do acidente teve perda parcial de sua capacidade laborativa. Argumenta que desempenhava atividade de risco e, ao seu ver, restaram configurados o dano moral sofrido pelo autor, a culpa da reclamada e o nexo da causalidade. Pede a reforma do v. acórdão a fim de evitar que os fatos ocorridos não se repitam, bem como para que a recorrida não pratique situação desrespeitosa com seus empregados.

Aponta violação aos artigos em destaque e divergência jurisprudencial.

Assim consta no Acórdão, fls. 233-235:

‘ACIDENTE DE TRABALHO. AUSÊNCIA DE CULPA. RESPONSABILIDADE CIVIL DO EMPREGADOR AFASTADA. INDENIZAÇÃO INCABÍVEL. Ainda que se trate de acidente ocorrido no trabalho, ausente nos autos qualquer prova de conduta ilícita do empregador, não há como imputar-lhe responsabilidade, o que torna indevida a reparação por dano moral deferida pelo Juízo no valor de R$-30.000,00. No caso, ante a confissão do autor de que caiu em virtude de a mula por ele montada ter sido atingida por outro animal, conclui-se que a queda não foi motivada porque a mula não era domada, como quis fazer crer na sua inicial. De toda forma, não se verificam nos autos indícios de participação da reclamada em dolo ou culpa pelo infortúnio. Recurso provido’.

Conforme a fundamentação acima transcrita, constata-se que a E. Turma não incorreu em violação aos dispositivos destacados, mas decidiu em conformidade com o princípio do livre convencimento racional e motivado (artigo 131 do CPC), pelo qual o magistrado é livre para apreciar e valorar as provas e não está obrigado a rebater todas as alegações e argumentos deduzidos pelas partes, bastando que indique os fatos e as razões que levaram à formação de seu convencimento, o que se concretizou de forma plena e satisfatória na decisão recorrida.

Por outro lado, para se concluir pela existência ou não de dano, ou de culpa de uma ou outra parte, bem como do quantum arbitrado, ter-se-ia que revolver fatos e provas, o que é defeso em sede de recurso de revista, nos termos da Súmula nº 126 do C. TST, inclusive por divergência jurisprudencial, que de todo modo não restou demonstrada, vez que as  jurisprudências citadas não serve para comprovar a divergência, porque não atentem, integralmente, ao disposto na Súmula nº 337 do C. TST, além da oriunda deste Regional, não se adequar à hipótese da alínea a do artigo 896 da CLT.

Ressalto, por fim, que em relação à alegada afronta a CF/88, se existente, esta não seria direta e sim reflexa, não preenchendo, portanto, a hipótese de admissibilidade prevista na alínea “a” do artigo 896 da CLT. Nesse sentido, colaciono julgado da Suprema Corte:

‘Não cabe recurso extraordinário quando a alegada ofensa à Constituição é reflexa ou indireta, porquanto, a prevalecer o entendimento contrário, toda a alegação de negativa de vigência de lei ou até de má interpretação desta passa a ser ofensa a princípios constitucionais genéricos como o da reserva legal, o do devido processo legal ou o da ampla defesa, tornando-se, assim, o recurso extraordinário – ao contrário do que pretende a Constituição – meio de ataque à aplicação à legislação infraconstitucional’ (STF, AgRg 170637-7, rel. Min. Moreira Alves).

CONCLUSÃO

DENEGO seguimento ao recurso de revista” (fls. 297/299 do documento sequencial eletrônico nº 01 – destaques acrescidos).

A decisão proferida no despacho denegatório não merece reforma, pelas seguintes razões:

2.1. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. ACIDENTE DE TRABALHO. VAQUEIRO. QUEDA DE MULA ATINGIDA POR OUTRO ANIMAL

Na minuta do agravo de instrumento, o Reclamante insiste no processamento do recurso de revista por violação dos arts. 5º, V, e 7º, I e XXVIII, da Constituição Federal e 186 e 927 do Código Civil e divergência jurisprudencial, sob a afirmação de que, “de todo conjunto probatório constante dos autos, depoimentos das partes e testemunhas, ficou comprovada ser a atividade desempenhada pelo recorrente de risco, além das provas documentais, periciais, que atestam a incapacidade do reclamante para o trabalho, comprovando também o nexo de causalidade” (fl. 307).

Não assiste razão ao Agravante.

O Tribunal Regional deu provimento ao recurso ordinário interposto pela primeira Reclamada (LUCIANA DUCA COSTA), para “excluir da condenação o pagamento de indenização por dano moral deferida pelo Juízo de primeiro grau no valor de R$-30.000,00. Em consequência, julgar totalmente improcedente a ação”. Consta do acórdão regional a seguinte fundamentação:

DO ACIDENTE DE TRABALHO. DA RESPONSABILIDADE CIVIL DA RECLAMADA. DA CULPA. DO DANO MORAL. DO QUANTUM INDENIZATÓRIO

A reclamada pretende obter o julgamento de improcedência do pedido de indenização por dano moral. Aduz que não lhe cabe qualquer responsabilidade, uma vez que não agiu com culpa; e que não é caso de aplicação da teoria objetiva do risco.

Analiso.

Restou incontroverso pelo depoimento do preposto, à fl. 127v, que o autor exercia a função de vaqueiro na reclamada, o que não constitui por si só, uma atividade de risco, capaz de atrair a aplicação da responsabilidade objetiva do empregador. Pois há que se considerar como atividade normal de risco aquela que envolva risco fora do normal, levando em conta o padrão médio da sociedade e a probabilidade de ocorrência de sinistros.

É sabido que o artigo 5°, incisos V e X, da Constituição da República, assegura àquele que teve o seu direito violado indenização pelo dano material ou moral sofrido.

Todavia, para imputar ao empregador a responsabilidade pelo dano moral ou material experimentado pelo empregado, há que se demonstrar o dano no ambiente de trabalho ou em decorrência dele, o dolo ou culpa do empregador, e o nexo causal entre a ação ou omissão do empregador e o resultado sofrido (art. 7º, inciso XXVIII). Ausente qualquer desses elementos, não se poderá falar em responsabilidade do empregador, cabendo ao autor o ônus de demonstrar o fato constitutivo do seu direito, consoante arts. 818 da CLT e 333 do CPC c/c 927 do CC.

No caso concreto, o reclamante pleiteou indenização por dano moral decorrente do acidente que sofreu, quando foi derrubado por uma mula. Ao narrar o acidente, o reclamante afirmou, em depoimento à fl. 126v, que:

…estava montado em uma mula e deveria tocar a vaca que fora laçada por outro vaqueiro; que a vaca levantou e acertou a mula que estava montada pelo depoente e esta saltou com o depoente e em decorrência o depoente caiu...”.

Da narrativa do reclamante, conclui-se que ele caiu em virtude de a mula ter sido atingida por outro animal, e não porque a mula montada por ele não era domada, como quis fazer crer na sua inicial. De toda forma, não se verificam nos autos indícios de qualquer atitude ilícita, que possa caracterizar dolo ou culpa da reclamada pelo acidente.

Importante ressaltar que não é todo e qualquer acidente do trabalho que gera para o empregador o dever de indenizar, mas sim aquele que envolve atividade de risco, ou aquele que contou com a participação do patrão em culpa ou dolo, nos termos do art. 7º, XXVIII, da CR, o que não é o caso destes autos.

Assim, ainda que se trate de acidente ocorrido no trabalho, ausente nos autos qualquer prova de conduta ilícita da reclamada, não há como imputar-lhe responsabilidade, o que torna indevida a reparação pretendida.

Por essas razões, dou provimento ao recurso, para excluir da condenação o pagamento de indenização por dano moral deferida pelo Juízo de primeiro grau no valor de R$-30.000,00” (fls. 281/282 do documento sequencial eletrônico nº 01 – destaques acrescidos).

Como se observa, a Corte Regional analisou a prova dos autos e estabeleceu que o acidente ocorrido com o Reclamante, ao ser derrubado de uma mula, se deu “em virtude de a mula ter sido atingida por outro animal, e não porque a mula montada por ele não era domada, como quis fazer crer na sua inicial”, registrando que, assim, “não se verificam nos autos indícios de qualquer atitude ilícita, que possa caracterizar dolo ou culpa da reclamada pelo acidente. Importante ressaltar que não é todo e qualquer acidente do trabalho que gera para o empregador o dever de indenizar, mas sim aquele que envolve atividade de risco, ou aquele que contou com a participação do patrão em culpa ou dolo, nos termos do art. 7º, XXVIII, da CR, o que não é o caso destes autos”, pois “há que se considerar como atividade normal de risco aquela que envolva risco fora do normal, levando em conta o padrão médio da sociedade e a probabilidade de ocorrência de sinistros”.

Não há violação do art. 927, parágrafo único, do Código Civil. No direito do trabalho, a responsabilidade do empregador é, em regra, subjetiva (art. 7º, XXVIII, da Constituição Federal), de modo que a correspondência com a norma civil deve ser feita com o art. 186 do Código Civil de 2002 (responsabilidade subjetiva), e não com o art. 927, parágrafo único, do mesmo diploma legal (responsabilidade objetiva pela teoria do risco). Ademais, não consta do acórdão regional nenhuma informação de que a Reclamada desenvolve atividade de risco. Ao contrário, a Corte Regional consignou que “o autor exercia a função de vaqueiro na reclamada, o que não constitui por si só, uma atividade de risco, capaz de atrair a aplicação da responsabilidade objetiva do empregador”.

Também não procede a indicada ofensa aos arts. 5º, V, e 7º, XXVIII, da Constituição Federal e 186 do Código Civil, pois a Corte Regional entendeu que não houve dolo ou culpa da Reclamada no infortúnio ocorrido com o Reclamante, registrando que ele “caiu em virtude de a mula ter sido atingida por outro animal, e não porque a mula montada por ele não era domada, como quis fazer crer na sua inicial. De toda forma, não se verificam nos autos indícios de qualquer atitude ilícita, que possa caracterizar dolo ou culpa da reclamada pelo acidente”.

Por outro lado, para se chegar a conclusões diversas daquelas do Tribunal Regional, com os argumentos trazidos pelo Agravante, é necessário o revolvimento de fatos e provas, procedimento incompatível com a natureza extraordinária do recurso de revista, nos termos da Súmula nº 126 do TST.

Ademais, a Corte Regional não emitiu tese a respeito da matéria disciplinada no art. 7º, I, da Constituição Federal (“relação de emprego protegida contra despedida arbitrária ou sem justa causa, nos termos de lei complementar, que preverá indenização compensatória, dentre outros direitos”). Logo, não houve o necessário prequestionamento, próprio dos recursos extraordinários, a teor da Súmula nº 297 do TST.

Por fim, quanto à divergência jurisprudencial apontada, os modelos colacionados são inservíveis para demonstração de conflito de teses que justifique o conhecimento do recurso de revista.

No primeiro aresto (TRT da 5ª Região – fl. 293), o Reclamante não juntou certidão ou cópia autenticada nem citou fonte oficial ou repositório autorizado em que foi publicado, a teor da Súmula nº 337, I, “a”, e III, do TST.

O segundo modelo colacionado também é inservível, porque oriundo do mesmo Tribunal Regional prolator da decisão (TRT da 8ª Região – fls. 294/295). Incide na espécie o óbice da Orientação Jurisprudencial nº 111 da SBDI-1 desta Corte Superior:

“RECURSO DE REVISTA. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL. ARESTO ORIUNDO DO MESMO TRIBUNAL REGIONAL. LEI Nº 9.756/98. INSERVÍVEL AO CONHECIMENTO (nova redação) – DJ 20.04.2005 – Não é servível ao conhecimento de recurso de revista aresto oriundo de mesmo Tribunal Regional do Trabalho, salvo se o recurso houver sido interposto anteriormente à vigência da Lei nº 9.756/98”.

Assim, no caso em análise, constata-se que não foi demonstrada nenhuma das hipóteses de cabimento do recurso de revista previstas no art. 896 da CLT.

Diante do exposto, nego provimento ao agravo de instrumento.

ISTO POSTO

ACORDAM os Ministros da Quarta Turma do Tribunal Superior do Trabalho, à unanimidade, conhecer do agravo de instrumento e, no mérito, negar-lhe provimento.

Brasília, 24 de Fevereiro de 2016.

Firmado por assinatura digital (MP 2.200-2/2001)

CILENE FERREIRA AMARO SANTOS

Desembargadora Convocada Relatora