A ferramenta Pesquisa Pronta, do site do Superior Tribunal de Justiça (STJ), disponibilizou mais 13 acórdãos. Um deles, julgado sob o rito dos repetitivos, prevê as situações em que incide o Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural (ITR), ou Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU), nos imóveis situados em área urbana.
O acórdão de repetitivo disponibilizado resume a posição majoritária da corte sobre o assunto. “Não incide IPTU, mas ITR, sobre imóvel localizado na área urbana do Município, desde que comprovadamente utilizado em exploração extrativa, vegetal, agrícola, pecuária ou agroindustrial”.
As decisões do tribunal resolvem controvérsias acerca da classificação do imóvel, já que em muitos casos demandados, uma das partes pede a cobrança do IPTU. O argumento é que a classificação do município diz que tal imóvel, mesmo sendo de uso para agricultura, está caracterizado como “zona urbana”.
Os ministros destacam que, tendo em vista a incidência da Súmula 7 do STJ, não é possível fazer uma análise se realmente o imóvel foi devidamente classificado como de uso para agricultura, portanto as decisões do tribunal são somente a respeito da incidência ou não de IPTU e ITR.
O STJ ressaltou também em suas decisões que é necessário considerar de forma simultânea o critério espacial previsto no Código Tributário Nacional (CTN) e o critério da destinação do imóvel previsto no Decreto-Lei 57/66.
Ferramenta
A Pesquisa Pronta é uma ferramenta on-line do STJ criada para facilitar o trabalho de quem deseja conhecer o entendimento dos ministros em julgamentos semelhantes. A ferramenta oferece consultas a pesquisas prontamente disponíveis sobre temas jurídicos relevantes, bem como a acórdãos com julgamento de casos notórios.
Embora os parâmetros de pesquisa sejam predefinidos, a busca dos documentos é feita em tempo real, o que possibilita que os resultados fornecidos estejam sempre atualizados.
A Pesquisa Pronta está permanentemente disponível no portal do STJ. Basta acessar Jurisprudência > Pesquisa Pronta, na página inicial do site, no menu principal de navegação.
Processo REsp 1112646
Fonte: STJ, 06/06/2016.
Comentário de DireitoAgrário.com:
Imóvel Agrário localizado em área urbana e a inconstitucionalidade superveniente da legislação municipal que cobrava IPTU
por Sofia da Silveira Bohrz[1] e Albenir Querubini[2]
Por consequência do julgamento pelo Superior Tribunal de Justiça do Recurso Especial nº 1.112.646-SP, pelo chamado rito dos recursos repetitivos, pacifica-se a questão da incidência de ITR ou IPTU sobre os imóveis agrários localizados em área urbana dos municípios, uma vez que tal julgado opera efeitos vinculantes. Conforme o entendimento de direito uniformizado, “não incide IPTU, mas ITR, sobre imóvel localizado na área urbana do Município, desde que comprovadamente utilizado em exploração extrativa, vegetal, agrícola, pecuária ou agroindustrial (art. 15 do DL 57/1966)”.
Em outras palavras, para corrigir as cobranças indevidas de IPTU, ao invés de ITR, cumprirá aos proprietários dos referidos imóveis deverão fazer prova de que a destinação do respectivo imóvel é a exploração da atividade agrária. Como se faz isso? Por meio de documentos de compra e venda de produtos agrícolas e animais, Talão de Produtor, demonstrativos de contabilidade, etc.
Outro ponto que não pode passar despercebido é o fato de que muitos Municípios possuíam legislação dispondo sobre cobrança de IPTU com alíquotas diferenciadas para os imóveis agrários localizados em área urbana. É o caso do Município de Santa Maria/RS, onde o Decreto Executivo de nº 0145/2008, que regulamenta o IPTU da cidade, assim prevê em seu art. 17:
Art. 17. Para redução do valor venal dos imóveis residenciais, comerciais, industriais ou de serviços, com a existência conjunta de áreas com utilização agrícola ou pecuária são necessários os seguintes documentos:
I. Requerimento dirigido ao Sr. Secretario de Município das Finanças;
II. Comprovação, pelo interessado, da efetiva exploração de uma ou mais das atividades acima especificadas, através de guia anual de apuração de Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação – ICMS;
III. Cópia atualizada da Escritura Pública do imóvel ou outro documento que comprove a posse do do mesmo;
IV. Certidão Negativa dos Tributos Municipais;
V. Cópia do CPF e Carteira de Identidade do titular, caso seja representante legal, apresentar cópia da procuração;
VI. Nota fiscal de produtor rural.
Parágrafo único. Para a analise da redução do valor venal dos imóveis especificados no caput são aplicados os seguintes critérios:
a) Se da área total do imóvel estiver sendo usada para agricultura e/ou pecuária de 1% a 10%, o imóvel terá redução do valor venal de 10%;
b) Se da área total do imóvel estiver sendo usada para agricultura e/ou pecuária de 11% a 20%, o imóvel terá redução do valor venal de 20%;
c) Se da área total do imóvel estiver sendo usada para agricultura e/ou pecuária de 21% a 30%, o imóvel terá redução do valor venal de 30%;
d) Se da área total do imóvel estiver sendo usada para agricultura e/ou pecuária de 31% a 40%, o imóvel terá redução do valor venal de 40%;
e) Se da área total do imóvel estiver sendo usada para agricultura e/ou pecuária de 41% a 50%, o imóvel terá redução do valor venal de 50%;
f) Se da área total do imóvel estiver sendo usada para agricultura e/ou pecuária de 51% a 60%, o imóvel terá redução do valor venal de 60%;
g) Se da área total do imóvel estiver sendo usada para agricultura e/ou pecuária de 61% a 70%, o imóvel terá redução do valor venal de 70%;
h) Se da área total do imóvel estiver sendo usada para agricultura e/ou pecuária acima de 71%, o imóvel terá redução do valor venal de 85%.
Portanto, segundo o referido Decreto Municipal há uma redução no valor do IPTU proporcional ao grau de destinação que o imóvel localizado na área urbana possui para utilização agrícola ou pecuária.
No entanto, conforme visto na publicação acima, diante do entendimento de direito uniformizado pelo Superior Tribunal de Justiça, os Decretos Municipais dispondo pela cobrança de IPTU tornaram-se inconstitucionais. Trata-se de caso atípico de inconstitucionalidade superveniente, sendo que na via judicial dá ensejo a hipótese de cabimento de recurso extraordinário ao Supremo Tribunal Federal, conforme previsto no art. 102, inc. III, alínea “d”, da Constituição Federal de 1988.
Assim, com base no entendimento uniformizado pelo Superior Tribunal de Justiça, os proprietários de imóveis nessas situações e que tenham sofrido cobrança de IPTU com base em legislação municipal, a qual se apresenta equivocada, possuem o direito de corrigir a respectiva situação para passar a recolher ITR, seja mediante procedimento administrativamente ou, até mesmo, judicial. Inclusive, é possível que em algumas hipóteses os proprietário possam cobrar valores indevidamente pagos aos Municípios a título de IPTU, o que deve ser analisado caso a caso, contando com assessoria especializada.
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Notas:
[1] Advogada, Especialista em Direito Ambiental Nacional e Internacional pela UFRGS e em Direito Agrário e Ambiental aplicado ao Agronegócio pelo I-UMA/UNIP. Membro da União Brasileira dos Agraristas Universitários – UBAU.
[2] Professor de Direito Agrário e Ambiental. Mestre em Direito pela UFRGS. Vice-Presidente da União Brasileira dos Agraristas Universitários – UBAU.
Confira a íntegra da decisão:
RECURSO ESPECIAL Nº 1.112.646 – SP (2009/0051088-6)
RELATOR : MINISTRO HERMAN BENJAMIN
RECORRENTE : MÁRIO YOKOYA
ADVOGADO : FERNANDO DIAS JÚNIOR E OUTRO(S)
RECORRIDO : MUNICÍPIO DE SÃO BERNARDO DO CAMPO
PROCURADOR : ANDREA ALIONIS BANZATTO E OUTRO(S)
RELATÓRIO
O EXMO. SR. MINISTRO HERMAN BENJAMIN (Relator):
Trata-se de Recurso Especial interposto, com fundamento no art. 105, III, “a”, da Constituição da República, contra acórdão assim ementado (fl. 170):
APELAÇÃO – Mandado de Segurança – IPTU X ITR – Imóvel situado em zona urbana — Alegação de produção agrícola – Cobrança de IPTU devida – Competência do ente Municipal para fixar as diretrizes visando o desenvolvimento das funções sociais da cidade – Somente o Município pode definir critérios de cobrança do imposto sobre a propriedade existente na zona urbana – Recurso provido.
Os Embargos de Declaração foram rejeitados (fl. 193). O recorrente aponta ofensa ao art. 15 do Decreto 57/1966, pois submete-se ao ITR o imóvel “que, comprovadamente, seja utilizado em exploração extrativa, vegetal, agrícola, pecuário ou agro-industrial” (fl. 219). O Recurso foi admitido na origem (fl. 271).
Reconheci o Recurso como representativo de controvérsia, nos termos do art. 543-C do CPC, e determinei as providências cabíveis, além de intimação da Fazenda Nacional (fl. 278), que deixou de se manifestar (fl. 283). O MPF opinou pelo não conhecimento do Recurso (fl. 284).
É o relatório.
VOTO
O EXMO. SR. MINISTRO HERMAN BENJAMIN (Relator):
Discute-se a aplicação do art. 15 do DL 57/1966 como critério para afastamento da incidência do IPTU.
Inicialmente, analiso a questão levantada pelo MPF em seu parecer, ao opinar pelo não conhecimento do Recurso, pois “o recorrente não fez demonstração cabal de que sua propriedade destina-se a atividades rurais”, o que atrairia o disposto na Súmula 7/STJ (fl. 284).
Ocorre que a destinação do imóvel para atividades agrícolas é incontroversa. Transcrevo trecho da sentença (fl. 126):
Observa-se, a despeito dessa situação, não poder ser descartado o critério de utilização e destinação do imóvel, que no caso dos autos resta devidamente comprova no sentido de utilização para o cultivo de hortaliças e eucalipto, portanto de natureza rural, a despeito de inserido em zona qualificada como urbana pelo Município.
Essa realidade não foi impugnada na Apelação do Município (fls. 129-139), razão pela qual não foi reexaminada pelo Tribunal de Justiça.
A análise do Recurso Especial, portanto, parte de premissa fática incontroversa (destinação rural do imóvel), o que afasta o disposto na Súmula 7/STJ.
No mérito, a discussão a respeito da incidência do IPTU ou do ITR é caso clássico de conflito de competência a ser dirimido pela legislação complementar, nos termos do art. 146, I, da CF.
O art. 32, § 1º, do CTN adota o critério da localização do imóvel e considera urbana a área definida na lei municipal, desde que observadas pelo menos duas das melhorias listadas em seus incisos. Ademais, considera-se também nessa situação o imóvel localizado em área de expansão urbana, constante de loteamento aprovado, nos termos do § 2º, do mesmo dispositivo.
Ocorre que o critério espacial do art. 32 do CTN não é o único a ser considerado. O DL 57/1966, recepcionado pela atual Constituição como lei complementar (assim como o próprio CTN), acrescentou o critério da destinação do imóvel, para delimitação das competências municipal (IPTU) e federal (ITR):
Art 15. O disposto no art. 32 da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966, não abrange o imóvel de que, comprovadamente, seja utilizado em exploração extrativa vegetal, agrícola, pecuária ou agro-industrial, incidindo assim, sôbre o mesmo, o ITR e demais tributos com o mesmo cobrados.
Destaco que o STF reconhece a vigência do dispositivo legal no sistema tributário contemporâneo:
EMENTA: – DIREITO CONSTITUCIONAL, TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. IMPOSTO PREDIAL E TERRITORIAL URBANO (I.P.T.U.). IMPOSTO TERRITORIAL RURAL (I.T.R.). TAXA DE CONSERVAÇÃO DE VIAS. RECURSO EXTRAORDINÁRIO.
(…)
2. R.E. conhecido, pela letra “b”, mas improvido, mantida a declaração de inconstitucionalidade do art. 12 da Lei federal n 5.868, de 12.12.1972, no ponto em que revogou o art. 15 do Decreto- lei n 57, de 18.11.1966.
3. Plenário. Votação unânime.
(RE 140773/SP, Relator: Min. SYDNEY SANCHES, Tribunal Pleno, julgado em 08/10/1998, DJ 04-06-1999 PP-00017 EMENT VOL-01953-01 PP-00127)
Nesse sentido, a jurisprudência do STJ é pacífica ao reconhecer a aplicabilidade do art. 15 do DL 57/1966 como critério delimitador da incidência tributária sobre imóveis:
TRIBUTÁRIO. IPTU. ITR. IMÓVEL. EXPLORAÇÃO EXTRATIVA VEGETAL. ART. 32 DO CTN, 15 DO DECRETO-LEI Nº 57/66.
1. O artigo 15 do Decreto-Lei nº 57/66 exclui da incidência do IPTU os imóveis cuja destinação seja, comprovadamente a de exploração agrícola, pecuária ou industrial, sobre os quais incide o Imposto Territorial Rural-ITR, de competência da União.
2. Tratando-se de imóvel cuja finalidade é a exploração extrativa vegetal, ilegítima é a cobrança, pelo Município, do IPTU, cujo fato gerador se dá em razão da localização do imóvel e não da destinação econômica. Precedente.
3. Recurso especial improvido.
(REsp 738.628/SP, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 12/05/2005, DJ 20/06/2005 p. 259)
TRIBUTÁRIO. IPTU. ITR. FATO GERADOR. IMÓVEL SITUADO NA ZONA URBANA. LOCALIZAÇÃO. DESTINAÇÃO. CTN, ART. 32. DECRETO-LEI N. 57/66. VIGÊNCIA.
1. Ao ser promulgado, o Código Tributário Nacional valeu-se do critério topográfico para delimitar o fato gerador do Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU) e o Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural (ITR): se o imóvel estivesse situado na zona urbana, incidiria o IPTU; se na zona rural, incidiria o ITR.
2. Antes mesmo da entrada em vigor do CTN, o Decreto-Lei nº 57/66 alterou esse critério, estabelecendo estarem sujeitos à incidência do ITR os imóveis situados na zona rural quando utilizados em exploração vegetal, agrícola, pecuária ou agroindustrial.
3. A jurisprudência reconheceu validade ao DL 57/66, o qual, assim como o CTN, passou a ter o status de lei complementar em face da superveniente Constituição de 1967. Assim, o critério topográfico previsto no art. 32 do CTN deve ser analisado em face do comando do art. 15 do DL 57/66, de modo que não incide o IPTU quando o imóvel situado na zona urbana receber quaisquer das destinações previstas nesse diploma legal.
4. Recurso especial provido.
(REsp 492.869/PR, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, PRIMEIRA TURMA, julgado em 15/02/2005, DJ 07/03/2005 p. 141)
Assim, não incide IPTU, mas sim o ITR, sobre imóvel localizado na área urbana do Município, desde que, comprovadamente, seja utilizado em exploração extrativa, vegetal, agrícola, pecuária ou agroindustrial.
Ao lado do critério espacial previsto no art. 32 do CTN, deve ser aferida a destinação do imóvel, nos termos do art. 15 do DL 57/1966.
Por fim, por se tratar de recurso submetido ao regime do art. 543-C do CPC, determino a adoção das providências relativas à Resolução 8/2008 do STJ.
Diante do exposto, dou provimento ao Recurso Especial.
É como voto.
RECURSO ESPECIAL Nº 1.112.646 – SP (2009/0051088-6)
RELATOR : MINISTRO HERMAN BENJAMIN
RECORRENTE : MÁRIO YOKOYA
ADVOGADO : FERNANDO DIAS JÚNIOR E OUTRO(S)
RECORRIDO : MUNICÍPIO DE SÃO BERNARDO DO CAMPO
PROCURADOR : ANDREA ALIONIS BANZATTO E OUTRO(S)
EMENTA
TRIBUTÁRIO. IMÓVEL NA ÁREA URBANA. DESTINAÇÃO RURAL. IPTU. NÃO-INCIDÊNCIA. ART. 15 DO DL 57/1966. RECURSO REPETITIVO. ART. 543-C DO CPC.
1. Não incide IPTU, mas ITR, sobre imóvel localizado na área urbana do Município, desde que comprovadamente utilizado em exploração extrativa, vegetal, agrícola, pecuária ou agroindustrial (art. 15 do DL 57/1966).
2. Recurso Especial provido. Acórdão sujeito ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução 8/2008 do STJ.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça: “A Seção, por unanimidade, deu provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.” Os Srs. Ministros Mauro Campbell Marques, Benedito Gonçalves, Hamilton Carvalhido, Eliana Calmon, Luiz Fux, Castro Meira e Humberto Martins votaram com o Sr. Ministro Relator.
Ausente, justificadamente, a Sra. Ministra Denise Arruda.
Brasília, 26 de agosto de 2009(data do julgamento).
MINISTRO HERMAN BENJAMIN
Relator
Veja também:
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– Projeto do Senado propõe isenção de ITR para os proprietários rurais que manterem área preservada à margem do São Francisco (Portal DireitoAgrário.com, 29/01/2016)
– Moradores de áreas rurais quilombolas são isentos de imposto territorial (Revista Consultor Jurídico, 10/01/2015)