sexta-feira , 19 abril 2024
Início / Julgados / Não cabe usucapião a particulares sobre terras pertencentes à União e declaradas como indígenas
Direito Agrário

Não cabe usucapião a particulares sobre terras pertencentes à União e declaradas como indígenas

“A 11ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) negou usucapião a particulares sobre terras pertencentes à União e declaradas como indígenas. Os interessados entraram com uma ação para declaração de domínio pleno de imóvel rural denominado Sítio Fidêncio, localizado no bairro dos Prados, município de Peruíbe (SP), alegando que detinham a posse do imóvel há mais de 60 anos.

O juiz federal julgou improcedente a ação em primeira instância. Para ele, o imóvel integrar parte da área de interesse da União (terrenos de marinha) impede o usucapião. Além disso, ele destacou que, à éopca,  o imóvel foi identificado e delimitado como Terra Indígena Piaçaguera pelo Grupo de Trabalho da Fundação Nacional do Índio (FUNAI).

Em seu recurso, os apelantes alegavam que há décadas não existia indígenas na área. Disseram também que, embora a FUNAI tenha feito medições na região, a fundação não ouviu nenhum dos moradores, que sequer foram notificados. Afirmaram ainda que ocupam a área há um século, sem oposição de ninguém, e que, por isso, têm direito à sua pretensão de domínio.

Após distribuído o recurso no TRF3, a FUNAI comunicou o término dos trabalhos de identificação e demarcação, concluindo definitivamente ‘pela tradicionalidade da Terra Indígena de Piaçaguera’.

Ao analisar o caso, a 11ª Turma assinala que a Constituição Federal dispõe que os imóveis públicos não serão adquiridos por usucapião. O imóvel disputado pertence à União, havendo apenas o seu domínio útil por parte dos autores da ação. Todavia, após o ajuizamento da ação, a FUNAI deu início ao processo de demarcação da Terra Indígena Piaçaguera, sendo este outro fator impeditivo da pretensão dos autores.

Esse processo de demarcação foi concluído quando a ação de usucapião já estava no TRF3, tendo a Terra Indígena Piaçaguera sido declarada, pelo Ministério da Justiça, por meio da Portaria 500/2011, como área tradicionalmente ocupada.

No tocante à alegação de que a FUNAI teria procedido à demarcação sem ouvir os moradores, o colegiado julgador observou que a entidade reabriu o prazo para que o Estado e o município em que se localiza a terra sob demarcação e os demais interessados manifestarem-se para o fim de pleitear indenização ou demonstrar vícios, totais ou parciais, do relatório resumido e publicado no Diário Oficial da União. Para a 11ª Turma, isto supriu qualquer defeito no procedimento”.

Fonte: Assessoria de Comunicação Social do TRF3.


 

Confira a íntegra da decisão:

 

APELAÇÃO CÍVEL Nº 0203935-81.1991.4.03.6104/SP
2007.03.99.039554-0/SP
RELATOR : Juiz Federal Convocado LEONEL FERREIRA
APELANTE : JOANNA JACQUES DA SILVA e outros(as)
ADVOGADO : SP066110 JARBAS DE SOUZA
CODINOME : JOANNA JACQUES
APELANTE : RAYMUNDO FIDENCIO espolio
ADVOGADO : SP066110 JARBAS DE SOUZA e outro(a)
REPRESENTANTE : AGRIMAR DA SILVA FIDENCIO
APELANTE : ANA DA SILVA FIDENCIO
: EDMIR JAQUES DA SILVA
: MARIA DA SILVA espolio
ADVOGADO : SP066110 JARBAS DE SOUZA e outro(a)
APELADO(A) : Uniao Federal
ADVOGADO : SP000019 TÉRCIO ISSAMI TOKANO
APELADO(A) : Rede Ferroviaria Federal S/A – RFFSA
ADVOGADO : SP156372 CAMILA PEREIRA RODRIGUES MOREIRA MARQUES
APELADO(A) : Fundacao Nacional do Indio FUNAI
ADVOGADO : CLAUDIA MARIA SILVEIRA DESMET
APELADO(A) : Departamento de Estradas de Rodagem do Estado de Sao Paulo DER/SP
: LEAO BENEDITO DE ARAUJO NOVAES espolio
ADVOGADO : SP012461 EDUARDO MONTEIRO DA SILVA e outro(a)
REPRESENTANTE : ANNA PAOLA NOVAES STINCHI
No. ORIG. : 91.02.03935-4 4 Vr SANTOS/SP

EMENTA

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. USUCAPIÃO. TERRA INDÍGENA PIAÇAGUERA. FUNAI. DEMARCAÇÃO.
1. A providência da FUNAI no sentido de reabrir o prazo para que o Estado e o município em que se localiza a terra sob demarcação e os demais interessados manifestarem-se para o fim de pleitear indenização ou demonstrar vícios, totais ou parciais, do relatório resumido e publicado no Diário Oficial da União supriu qualquer defeito no procedimento.
2. A Constituição Federal dispõe, em seu art. 183, § 3º, que os imóveis públicos não serão adquiridos por usucapião.
3. O imóvel pertence à União, havendo apenas o seu domínio útil. Isso impede a usucapião. Todavia, após o ajuizamento da ação (em 1991), a FUNAI deu início (em 2002) ao processo de demarcação da Terra Indígena Piaçaguera, sendo outro fator impeditivo da pretensão dos autores (CF, arts. 20, XI, e 231, §§ 1º e 4º).
4. Esse processo demarcatório foi concluído quando o feito já estava neste Tribunal, tendo a Terra Indígena Piaçaguera sido declarada, pelo Ministério da Justiça, como área tradicionalmente ocupada.
5. O Espólio-réu tentou opor-se à demarcação, porém não é possível estabelecer-se lide incidental neste processo de usucapião. Se o Espólio tem demanda a deduzir em face da União em razão da demarcação da Terra Indígena Piaçaguera, haverá de fazê-lo em ação própria. Aqui, a lide limita-se à pretensão de usucapião deduzida pelos autores, relativamente à área descrita na petição inicial.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

 

São Paulo, 06 de outubro de 2015.
LEONEL FERREIRA
Juiz Federal Convocado

 

APELAÇÃO CÍVEL Nº 0203935-81.1991.4.03.6104/SP
2007.03.99.039554-0/SP
RELATOR : Desembargador Federal NINO TOLDO
APELANTE : JOANNA JACQUES DA SILVA e outros(as)
ADVOGADO : SP066110 JARBAS DE SOUZA
CODINOME : JOANNA JACQUES
APELANTE : RAYMUNDO FIDENCIO espolio
ADVOGADO : SP066110 JARBAS DE SOUZA e outro(a)
REPRESENTANTE : AGRIMAR DA SILVA FIDENCIO
APELANTE : ANA DA SILVA FIDENCIO
: EDMIR JAQUES DA SILVA
: MARIA DA SILVA espolio
ADVOGADO : SP066110 JARBAS DE SOUZA e outro(a)
APELADO(A) : Uniao Federal
ADVOGADO : SP000019 TÉRCIO ISSAMI TOKANO
APELADO(A) : Rede Ferroviaria Federal S/A – RFFSA
ADVOGADO : SP156372 CAMILA PEREIRA RODRIGUES MOREIRA MARQUES
APELADO(A) : Fundacao Nacional do Indio FUNAI
ADVOGADO : CLAUDIA MARIA SILVEIRA DESMET
APELADO(A) : Departamento de Estradas de Rodagem do Estado de Sao Paulo DER/SP
: LEAO BENEDITO DE ARAUJO NOVAES espolio
ADVOGADO : SP012461 EDUARDO MONTEIRO DA SILVA e outro(a)
REPRESENTANTE : ANNA PAOLA NOVAES STINCHI
No. ORIG. : 91.02.03935-4 4 Vr SANTOS/SP

RELATÓRIO

O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NINO TOLDO (Relator): Trata-se de apelação interposta por JOANNA JACQUES DA SILVA, RAYMUNDO FIDENCIO (espólio), ANA DA SILVA FIDENCIO, EDMIR JACQUES DA SILVA e MARIA DA SILVA (espólio) em face da sentença da 4ª Vara Federal da Subseção Judiciária de Santos/SP que julgou improcedente a ação por meio da qual pretendiam a declaração de domínio pleno do imóvel rural descrito na petição inicial, denominado Sítio Fidêncio, localizado no bairro dos Prados, município de Peruíbe/SP, para o que alegaram que detinham a posse mansa e pacífica do imóvel há mais de 60 (sessenta) anos.

Após afastar as questões preliminares suscitadas, o Juízo a quo rejeitou o pedido ao fundamento de que o imóvel a ser usucapido integrava parte da área de interesse da União (terrenos de marinha) cujo domínio útil fora adquirido por Leão Benedito de Araújo Novaes e que sobre essa mesma área existia ação de usucapião proposta por João Antônio Blaia em face do Espólio de Leão Benedito de Araújo Novaes, a qual foi julgada improcedente, declarando-se a validade do domínio do espólio.

Além disso, o Juízo a quo considerou a existência de identificação e delimitação da Terra Indígena Piaçaguera, efetuada por Grupo de Trabalho da Fundação Nacional do Índio – FUNAI, fato esse superveniente ao ajuizamento da ação e às decisões trazidas pelo Espólio-réu.

Os autores foram condenados nos ônus da sucumbência (custas e honorários, fixados estes em 10% sobre o valor da causa), cuja execução ficaria suspensa, nos termos do art. 12 da Lei nº 1.060/50, por serem beneficiários da assistência judiciária. A sentença encontra-se a fls. 1.141/1.153.

Alegam os apelantes, em síntese (fls. 1.160/1.164), que há décadas não existem indígenas na área objeto da usucapião e que, de fato, a FUNAI fez medições na região, sem, contudo, ouvir nenhum dos moradores, que sequer foram notificados. Aduzem que ocupam a área há um século, sem oposição de ninguém, e que, por isso, têm direito à sua pretensão de domínio.

Houve contrarrazões da União (fls. 1.168/1.174), do Espólio de Leão Benedito de Novaes (fls. 1.189/1.193), da Rede Ferroviária Federal S.A. – em liquidação (fls. 1.194/1.203) e da Fundação Nacional do Índio – FUNAI (fls. 1.214/1.216).

Distribuídos os autos neste Tribunal, a FUNAI comunicou o término dos trabalhos de identificação e demarcação, concluindo definitivamente “pela tradicionalidade da Terra Indígena de Piaçaguera” (fls. 1.220/1.224 e 1.225/1.334).

Houve manifestação do Espólio de Leão Benedito de Novaes (fls. 1.351/1.358), acompanhada de documentos (fls. 1.359/1.582), por meio da qual impugna a conclusão da FUNAI.

A FUNAI informou que a área objeto desta ação foi declarada área tradicionalmente ocupada, pela Portaria 500/2011 do Ministério da Justiça.

O Ministério Público Federal, em parecer subscrito pelo Procurador Regional da República Paulo Thadeu Gomes da Silva (fls. 1.588/1.591v), opinou pela rejeição da alegação de ilegalidade suscitada pelo Espólio de Leão Benedito de Novaes e pelo conhecimento e desprovimento da apelação dos autores.

É relatório.

À revisão.

NINO TOLDO
Desembargador Federal Relator
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0203935-81.1991.4.03.6104/SP
2007.03.99.039554-0/SP
RELATOR : Juiz Federal Convocado LEONEL FERREIRA
APELANTE : JOANNA JACQUES DA SILVA e outros(as)
ADVOGADO : SP066110 JARBAS DE SOUZA
CODINOME : JOANNA JACQUES
APELANTE : RAYMUNDO FIDENCIO espolio
ADVOGADO : SP066110 JARBAS DE SOUZA e outro(a)
REPRESENTANTE : AGRIMAR DA SILVA FIDENCIO
APELANTE : ANA DA SILVA FIDENCIO
: EDMIR JAQUES DA SILVA
: MARIA DA SILVA espolio
ADVOGADO : SP066110 JARBAS DE SOUZA e outro(a)
APELADO(A) : Uniao Federal
ADVOGADO : SP000019 TÉRCIO ISSAMI TOKANO
APELADO(A) : Rede Ferroviaria Federal S/A – RFFSA
ADVOGADO : SP156372 CAMILA PEREIRA RODRIGUES MOREIRA MARQUES
APELADO(A) : Fundacao Nacional do Indio FUNAI
ADVOGADO : CLAUDIA MARIA SILVEIRA DESMET
APELADO(A) : Departamento de Estradas de Rodagem do Estado de Sao Paulo DER/SP
: LEAO BENEDITO DE ARAUJO NOVAES espolio
ADVOGADO : SP012461 EDUARDO MONTEIRO DA SILVA e outro(a)
REPRESENTANTE : ANNA PAOLA NOVAES STINCHI
No. ORIG. : 91.02.03935-4 4 Vr SANTOS/SP

VOTO

O SENHOR JUIZ FEDERAL CONVOCADO LEONEL FERREIRA (Relator): Observo, inicialmente, que, não procede a insurgência do Espólio de Leão Benedito de Araújo Novaes quanto ao procedimento da FUNAI. Conforme destacou o Ministério Público Federal:

“O processo de demarcação da Terra Indígena Piaçaguera teve início no ano de 2002, por meio do Processo Administrativo n. 08620.3025/2002, tendo como objetivo a identificação da mencionada área localizada no Município de Peruíbe-SP. Regularmente transcorrido o feito e concluídos os estudos no âmbito da FUNAI, os autos foram remetidos ao Ministério da Justiça para apreciação acerca da homologação da referida terra indígena.

Ocorre que, embora a Consultoria Jurídica do Ministério da Justiça tenha entendido que a proposta de declaração da Terra Indígena Piaçaguera estava apta a ser encaminhada para a chancela ministerial, o Deputado Federal Nelson Marquezelli apresentou solicitação de revisão do memorial descritivo de delimitação da Terra Indígena em questão (fls. 1326-1343). Não obstante a referida consultoria jurídica tenha afastado os argumentos do parlamentar, a Secretaria Executiva do Ministério da Justiça encaminhou o processo à FUNAI, questionando acerca da possibilidade de nova apreciação do Relatório de Identificação da mencionada Terra Indígena.
Em consequência disso, a FUNAI recomendou a produção de estudos complementares, findos os quais se concluiu no sentido da ocupação tradicional da Terra Indígena Piaçaguera, conclusões estas acolhidas pela Diretoria de Assuntos Fundiários e encaminhadas ao Ministério da Justiça.
Questionando a falta de publicação do relatório decorrente de tais estudos complementares, o espólio de Leão Benedito de Araújo Novaes impetrou o Mandado de Segurança n. 2008.34.00.036024-0, em razão do que o Presidente da Fundação Nacional do Índio, em 27 de abril de 2009 (documento anexo), proferiu despacho nos seguintes termos:
[…]
Desse modo, afigura-se que tal providência supre a deficiência alegada pelo espólio de Leão Benedito de Araújo Novaes, pelo que deve ser afastada a ilegalidade apontada.”

De fato, a providência da FUNAI no sentido de reabrir o prazo para que o Estado e o município em que se localiza a terra sob demarcação e os demais interessados manifestarem-se para o fim de pleitear indenização ou demonstrar vícios, totais ou parciais, do relatório resumido e publicado no Diário Oficial da União supriu qualquer defeito no procedimento, não ocorrendo a ilegalidade arguida.

De outro lado, eventuais questionamentos acerca dessa demarcação não podem ser deduzidos neste processo de usucapião, mas em outra demanda.

Rejeito, portanto, essa questão deduzida incidentalmente pelo Espólio de Leão Benedito de Araújo Novaes.

Quanto ao mérito do recurso, o pedido não procede e a sentença deve ser confirmada.

Com efeito, a Constituição Federal dispõe, em seu art. 183, § 3º, que os imóveis públicos não serão adquiridos por usucapião.

No caso, ressaltou o Juízo a quo:

“De fato, depreende-se da transcrição nº 9.633 que o Sr. Leão Benedito de Araújo Novaes adquiriu da Mitra Diocesana de Santos o domínio útil de um imóvel rural denominado Aldeia de São João de Peruíbe, o qual abrange terrenos de marinha, fazendo frente para a praia de Peruíbe (fl. 107).

A ensejar a conclusão acerca da existência de posseiros no sobredito imóvel, a prova documental demonstra terem sido excluídos, quando da sua aquisição, trinta alqueires reservados à Mitra Diocesana de Santos, a fim de acolher as pessoas que residiam na terras vendidas, bem como uma área de 100 metros de cada lado, sobre a qual construiu-se uma capela. Comprometeu-se o adquirente a indenizar as benfeitorias dos então moradores, aos quais seria concedido prazo razoável para se mudarem, sem que a tolerância induzisse posse em benefício deles.
Posteriormente, por meio das transcrições nº 11.407 (30.05.68), 11.670 (02.07.68), 24.375 (27.04.73), 29.184 (22.05.74), 29.185 (22.05.74), o Sr. Leão Benedito de Araújo Novaes e sua esposa transmitiram diversas faixas de terras descritas na certidão de fls. 357/364, respectivamente, a: Mitra Diocesana de Santos, Pontifício Instituto das Missões, Companhia Parque Paulistano S/A, Pia Sociedade de São Paulo, Missionárias de Jesus Bom Pastor (‘Pastorinhas’). Registraram, ainda, plantas dos loteamentos denominados ‘Estância Balneária Belmira Novaes’, ‘Estância Antonio Novaes’ e ‘Estância Convento Velho’.
Referida transcrição tem origem na Escritura de Compra e Venda acostada às fls. 584/588, na qual expressamente consta que a Mitra Diocesana de Santos, no processo nº 1.302/45 do Serviço de Patrimônio da União – Delegacia de São Paulo obteve licença para transferir os direitos que detinha sobre os terrenos de marinha, sendo-lhe concedido em 10 de dezembro de 1945, o alvará nº 128/45, após o pagamento do respectivo laudêmio.
Não há dúvidas, portanto, de que a pretensão dos autores recai sobre parte da área de interesse da União (terrenos de marinha), cujo domínio útil foi adquirido por Leão Benedito de Araújo Novaes.
De outro lado, embora possa parecer que influa diretamente na solução do litígio, impende ressaltar a existência de ação de usucapião proposta do João Antônio Blaia em face do Espólio-réu, cuja discussão envolve as mesmas terras objeto do presente feito. Após percorrer todas as instâncias, desacolhida a oposição da União Federal, foi julgada improcedente a pretensão com a declaração de validade do domínio do Espólio de Leão Benedito de Araújo Novaes sobre a área objeto da transcrição nº 9.363 da 3ª Circunscrição Imobiliária de Santos.”

Da leitura desse trecho da sentença, da lavra da Juíza Federal Alessandra Nuyens Aguiar Aranha, que analisou minuciosamente os fatos, nota-se que o imóvel não pode ser objeto de usucapião porque pertence à União, tendo o Espólio de Leão Benedito de Araújo Novaes apenas o seu domínio útil.

Isso, por si só, impede a usucapião. Todavia, após o ajuizamento da ação (em 1991), a FUNAI deu início (em 2002) ao processo de demarcação da Terra Indígena Piaçaguera. A isso fez menção o Juízo, destacando que haveria aí outro fator impeditivo da pretensão dos autores. Referiu-se aos arts. 20, XI, e 231, §§ 1º e 4º, da Constituição Federal.

Esse processo demarcatório foi concluído quando o feito já estava neste Tribunal, conforme se verifica na petição da FUNAI (fls. 1.220/1.224). A Terra Indígena Piaçaguera foi declarada como área tradicionalmente ocupada, pelo Ministério da Justiça, conforme também noticiou a FUNAI (fls. 1.583).

O Espólio-réu tentou opor-se à demarcação, porém não é possível estabelecer-se lide incidental neste processo de usucapião. Se o Espólio de Leão Benedito de Araújo Novaes tem demanda a deduzir em face da União em razão da demarcação da Terra Indígena Piaçaguera, haverá de fazê-lo em ação própria; não neste caso. Aqui, a lide limita-se à pretensão de usucapião deduzida pelos autores, relativamente à área descrita na petição inicial.

Portanto, se antes já não era possível a usucapião porque se tratava de terreno de marinha (bem da União); com mais razão não é possível porque a área pretendida integra a terra tradicionalmente ocupada por indígenas.

Posto isso, NEGO PROVIMENTO À APELAÇÃO.

É o voto.

 

LEONEL FERREIRA
Juiz Federal Convocado

 


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira – ICP-Brasil, por:
Signatário (a): JOSE EDUARDO DE ALMEIDA LEONEL FERREIRA:10210
Nº de Série do Certificado: 38B1D26CCE79CFA1
Data e Hora: 06/10/2015 16:39:32

 

Leia também

DECRETO Nº 11.995/2024: MAIS UM PASSO NA DIREÇÃO DA INSEGURANÇA JURÍDICA E DA RELATIVIZAÇÃO DO DIREITO DE PROPRIEDADE

por Nestor Hein e Frederico Buss.   Na data de 16.04.2024 foi publicado o Decreto …