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Direito Agrário

Apenas famílias contempladas em sorteio podem ocupar terras da reforma agrária

“Os lotes oferecidos no programa de reforma agrária só podem ser ocupados pelos agricultores contemplados em sorteio. Com esse entendimento, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) determinou, na última semana, que uma família desocupe um terreno localizado em assentamento no município gaúcho de Hulha Negra, no sul do estado. A decisão é liminar.

Em fevereiro, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) ingressou com a ação de reintegração de posse na Justiça Federal. Segundo o órgão, a família instalou-se no local de forma irregular, depois que a beneficiária legal das terras foi remanejada para outro local em novembro de 2014.

A 1ª Vara Federal de Bagé (RS) negou a concessão de antecipação de tutela sob o argumento de que a via adequada para o pleito seria uma ação ordinária, já que se passou mais de um ano da ocupação. O Incra recorreu ao tribunal.

Na 3ª Turma, o recurso foi aceito. A desembargadora federal Marga Inge Barth Tessler, relatora do caso, entendeu que ‘é temerária a persistência de tal situação de ilegalidade, principalmente pelo fato de que existem centenas de famílias cadastradas há muito tempo, aptas a concorrer ao lote em questão, além trazer evidente desprestígio ao programa de assentamento e reforma agrária’. A magistrada foi seguida por unanimidade”.

Fonte: TRF4, 24/05/2016.

Direito Agrário

Veja também:

– Artigo: Políticas públicas, crise política e a “Reforma Agrária Jovem”, por Pedro Puttini Mendes (Portal DireitoAgrário.com)

Confira a íntegra da decisão:

AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 5017472-18.2016.4.04.0000/RS
RELATORA
:
Des. Federal MARGA INGE BARTH TESSLER
AGRAVANTE
:
INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRÁRIA – INCRA
AGRAVADO
:
DONATO BERNARDINO BELLES DE OLIVEIRA
MPF
:
MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
RELATÓRIO
Trata-se de agravo de instrumento contra decisão que indeferiu a liminar em ação de reintegração de posse de lote ocupado irregularmente, em projeto de assentamento do INCRA.

Alega o INCRA, em síntese, que está demonstrado o evidente esbulho do invasor, e a necessidade da imediata desocupação do lote. Diz que se trata de mera retenção, não havendo que se falar em posse velha. Conclui dizendo que a decisão causa prejuízo a outras famílias que aguardam áreas rurais para assentamento.

É o relatório.

VOTO
É pacífico o entendimento nesta Corte de que em se tratando de imóvel localizado em assentamento realizado para fins de reforma agrária, consoante dispõe os arts. 18, 21 e 22 da Lei 8.629/93, que trata da distribuição e utilização das terras desapropriadas para Reforma Agrária, a cedência do lote a terceiro, à qualquer título, sem anuência do INCRA, enseja a imediata reintegração do INCRA na posse do lote, ante a ausência de justo título que assegure o atual ocupante continuar utilizando a área.

E ainda, comprovado que houve a notificação ao réu da irregularidade da ocupação do lote, não há falar em boa-fé e, por conseguinte, em direito à retenção ou indenização de benfeitorias.

Nesse sentido:

ADMINISTRATIVO. REINTEGRAÇÃO DE POSSE. INCRA. IMÓVEL OBJETO DE PROJETO DE REFORMA AGRÁRIA. IRREGULARIDADE DA OCUPAÇÃO. ESBULHO. MÁ-FÉ CARACTERIZADA. AUSÊNCIA DE CIÊNCIA POR PARTE DA AUTARQUIA. AUSÊNCIA DE INDENIZAÇÃO DE BENFEITORIAS. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. 1. Nos termos da legislação específica, é vedada a venda ou qualquer outra forma de alienação de área de assentamento para a reforma agrária para terceiros. A posse não é concedida nem mesmo aos assentados, sendo outorgada a estes apenas permissão de uso, a qual tem caráter eminentemente precário, possibilitando a retomada a qualquer tempo, por conveniência administrativa. 2. Os elementos de convicção coligidos aos autos demonstram que os requeridos estão indevidamente na posse de parte do lote rural nº 89, projeto de assentamento localizado no Município de Viamão, sendo que os réus, sem qualquer vínculo idôneo com a autarquia federal, esbulharam a posse indireta desta última, legitimando o pedido de reintegração de posse. 3. Estando os esbulhadores de má-fé, já que conhecedores do obstáculo legal à aquisição de propriedade (art. 1201 do CC), a perda das construções e das benfeitorias realizadas no imóvel é uma das sanções legais decorrentes do vício que acoima a posse dos requeridos. 4. Apelação improvida. (TRF4, AC 5023071-17.2012.404.7100, Terceira Turma, Relator p/ Acórdão Fernando Quadros da Silva, juntado aos autos em 10/10/2014).

‘ADMINISTRATIVO. REFORMA AGRÁRIA. DESVIO DE FINALIDADE. REINTEGRAÇÃO DE POSSE. RESSARCIMENTO DE BENFEITORIAS NECESSÁRIAS. INVIABILIDADE. 1. Em se tratando de assentamento realizado para fins de reforma agrária, o beneficiário deve observar a destinação dos bens que recebeu. O desvirtuamento na utilização das áreas recebidas dá ensejo à rescisão do contrato havido entre o assentado e INCRA, justificando a retomada do lote por este. 2. Se o lote foi cedido a terceiro, sem anuência do INCRA, não se encontrando o assentado originário no lote, é inafastavel a reintegração da autarquia na posse da área, porquanto não mais existe título justo que assegure o atual ocupante continuar utilizando a área. 3. Sendo de má-fé a posse do réu, não lhe é assegurado direito à retenção do imóvel pelas benfeitorias (arts. 1219 e 1220 do Código Civil). Inexistindo prova da existência de benfeitorias necessárias ou de plantações pendentes de colheita à época da desocupação, também não faz jus a indenização (art. 1220 do Código Civil). (TRF4, AC 5036834-22.2011.404.7100, Quarta Turma, Relatora p/ Acórdão Vivian Josete Pantaleão Caminha, juntado aos autos em 26/06/2014)

Os elementos dos autos expõem com clareza, a ocupação clandestina do lote do INCRA, caracterizando-se o esbulho possessório pelo Registro de Irregularidade da ocupação do imóvel e a notificação dos réus (Evento 1, PROCADM2, Páginas 2-4), razão pela qual deve ser acolhida a pretensão da autarquia.

Nesse contexto, é temerária a persistência de tal situação de ilegalidade, principalmente pelo fato de que existem centenas de famílias cadastradas há muito tempo, aptas a concorrer ao lote em questão, além trazer evidente desprestígio ao programa de assentamento e reforma agrária.

Assim, caracterizada a verossimilhança do direito e o perigo de dano, é de ser acolhida a pretensão do INCRA para antecipar a tutela requerida, determinando a imediata retirada dos ocupantes irregulares.

Nesse sentido, é o pacífico entendimento do STJ:

AGRAVO REGIMENTAL – AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE – TUTELA ANTECIPADA REJEITADA NA CORTE LOCAL – DECISÃO MONOCRÁTICA QUE CONHECE E NEGA PROVIMENTO A AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL.
INSURGÊNCIA DO DEMANDADO.
1. O Superior Tribunal de Justiça tem entendimento pacífico no sentido de que é possível a concessão de tutela antecipada em ação de reintegração de posse, ainda que se trate de posse velha, desde que preenchidos os requisitos do art. 273 do CPC.
2. A análise do preenchimento dos requisitos autorizadores da antecipação dos efeitos da tutela jurisdicional (artigo 273 do CPC) reclama o reenfrentamento do contexto fático-probatório dos autos, providência inviável em recurso especial, ante o óbice da Súmula 7/STJ.
3. Agravo regimental não provido.
(AgRg no Ag 1232023/PR, Rel. Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, julgado em 27/11/2012, DJe 17/12/2012)
Ante o exposto, voto por dar provimento ao agravo de instrumento.
Desª. Federal MARGA INGE BARTH TESSLER
Relatora
AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 5017472-18.2016.4.04.0000/RS
RELATORA
:
Des. Federal MARGA INGE BARTH TESSLER
AGRAVANTE
:
INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRÁRIA – INCRA
AGRAVADO
:
DONATO BERNARDINO BELLES DE OLIVEIRA
MPF
:
MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
EMENTA
AGRAVO DE INSTRUMENTO. ADMINISTRATIVO. REINTEGRAÇÃO DE POSSE. IMÓVEL DO INCRA. ASSENTAMENTO. REFORMA AGRÁRIA. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA.
1. É pacífico o entendimento nesta Corte de que em se tratando de imóvel localizado em assentamento realizado para fins de reforma agrária, consoante dispõe os arts. 18, 21 e 22 da Lei 8.629/93 que trata da distribuição e utilização das terras desapropriadas para tal fim, a cedência do lote a terceiro, à qualquer título, sem anuência do INCRA, enseja a imediata reintegração do INCRA na posse do lote, ante a ausência de justo título que assegure o terceiro ocupante irregular de continuar utilizando a área.
2. É temerária a persistência de tal situação de ilegalidade, principalmente pelo fato de que existem centenas de famílias cadastradas há muito tempo, aptas a concorrer ao lote em questão, além trazer evidente desprestígio ao programa de assentamento e reforma agrária.
3. Caracterizada a verossimilhança do direito e o perigo de dano, é de ser acolhida a pretensão do INCRA para antecipar a tutela requerida, determinando a imediata retirada dos ocupantes irregulares.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 3a. Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar provimento ao agravo de instrumento, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 17 de maio de 2016.
Desª. Federal MARGA INGE BARTH TESSLER
Relatora

Documento eletrônico assinado por Desª. Federal MARGA INGE BARTH TESSLER, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8265668v5e, se solicitado, do código CRC AC18908D.
Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): Marga Inge Barth Tessler
Data e Hora: 18/05/2016 18:12

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